Num mundo de mentiras diárias, o passado dia 1 de Abril trouxe uma verdade à tona: a actual presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, está cada vez mais próxima de vir a ser secretária-geral da NATO. Ouça também esta crónica no P1 PODCAST.
A notícia chegou-me no dia 1 de Abril via mensagem de uma pessoa amiga: “Von der Leyen está na corrida para secretária-geral da NATO”. Essa era uma hipótese que apresentei na crónica de 14 de Março – Perguntei à minha bola de cristal. Nessa altura, escrevi que o nosso primeiro-ministro, António Costa, era um bom nome para ser o próximo secretário-geral da NATO ou, caso não fosse possível, o cargo também poderia ser entregue à actual presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.
Perguntei então à pessoa que me mandara a mensagem se não seria uma brincadeira de 1 de Abril, ao qual ela acrescentou que não: era uma notícia do dia anterior e vinha no jornal britânico The Sun. Isso já era outra coisa. O The Sun é aquele jornal que nós aprendemos na escola de jornalismo a classificar de tablóide, um jornal popular, famoso pela rapariga da página três. E se isto era um assunto que eles queriam abordar, então a questão era mesmo séria.
As fontes do The Sun vinham do meio diplomático e, ao ler o artigo, percebi o motivo da notícia surgir num jornal popular de Londres: o governo britânico não estava de acordo com a escolha e iria vetar o nome da ex-ministra da Defesa da Alemanha, dizendo que a sua folha de serviço no tempo do governo do seu país tinha sido fraca. Só que isso é típico dos britânicos: suspeitar dos alemães.
Explicava ainda o The Sun que o fim do mandato de Von der Leyen à frente da Comissão Europeia só termina em 2024, para o ano. As eleições europeias deverão ser em Maio, pelo que Von der Leyen teria de cumprir o seu mandato até essa altura e, quem sabe, ser reeleita quando houvesse uma nova composição do Parlamento Europeu. No entanto, segundo o jornal britânico, vários países membros da NATO tinham já “sugerido” que ela aceitasse assumir o cargo em Outubro deste ano, altura em que o actual secretário-geral, o norueguês Jens Stoltenberg, deverá sair.
Muitos jogos de bastidores devem estar a ser combinados neste momento. E, sobretudo, longe do escrutínio público próprio da democracia, pois o cargo não é sujeito a uma eleição aberta: é combinado entre os líderes dos países membros. Aliás, o The Sun também explicou isso mesmo. Disse que os norte-americanos não costumam apresentar um candidato, pois garantem um general seu como o Comandante Supremo Aliado da Europa. O actual chama-se Cristopher G. Cavoli.
Para os britânicos, o futuro secretário-geral da NATO deveria ser o actual ministro da Defesa, Ben Wallace. Outros nomes avançados pelo jornal de Londres incluem a primeira-ministra da Estónia, Kaja Kallas, embora se diga que não está interessada no cargo devido ao facto de ser de um país com fronteiras com a Rússia. Também se fala na ministra das Finanças do Canadá, Chrystia Freeland, que tem sangue ucraniano nas veias. Só que as hipóteses de ser escolhida também são escassas por causa do fraco investimento do Canadá nas contas da aliança.
Acredito que o lugar esteja a ser preparado para Ursula. Ela vem de uma família ligada à política – o seu pai, Ernst Albrecht, era um antigo director-geral na União Europeia e foi primeiro-ministro do Estado alemão da Baixa Saxónia. Ela está suficientemente alinhada contra a Rússia de Putin e, embora ache difícil que Von der Leyen saia da Comissão Europeia antes do mandato terminar – pois iria criar uma situação difícil de gerir, com um sucessor para um período de apenas um ano –, não podemos deixar de dizer como os ingleses: the plot thickens, ou seja, a trama adensa-se.
Para resolver este imbróglio, convinha que Jens Stoltenberg ficasse mais uns meses no cargo, indo para além de Outubro, dando assim tempo a Von der Leyen de terminar o mandato e poder depois manter-se em Bruxelas, agora na cadeira da NATO.
Resta saber o que pensa António Costa destas mudanças. Não é segredo que deseja trocar Lisboa por Bruxelas. As recentes sondagens que dão o PS empatado com o PSD são já um prenúncio dessa situação e nota-se o cansaço e enfado em querer resolver os problemas nacionais. Também no dia 1 de Abril, não foi mentira nenhuma, houve a manifestação em Lisboa pelos direitos à habitação e sente-se que os problemas da população estão a ficar sem soluções viáveis.
Por isso, as próximas eleições europeias, em 2024, vão ser decisivas para avaliar o pulso à Nação. E caso o PS ganhe por “poucochinho”, será que que Costa vai querer continuar em Lisboa ou emigrar para Bruxelas? Será que Ursula arranja por lá um emprego para o amigo?
Não faço futurologia, pois não é essa a função de um jornalista. Mas não posso deixar de notar que há notícias de dia 1 de Abril que, sem o parecer, estão relacionadas.
Basta sabermos ler.
Frederico Duarte Carvalho é jornalista e escritor
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