Desde o início do conflito em Gaza, Netanyahu já pagou mais de um milhão de euros a empresas nacionais

Portugal já exporta mais armamento para Israel do que a Alemanha

Soldier Holding Rifle

por Pedro Almeida Vieira e Elisabete Tavares // Maio 10, 2024


Categoria: Exame

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Os habituais fornecedores de armamento para Israel – Estados Unidos (69%) e a Alemanha (30%) – estão a sofrer cada vez mais pressões para refrear os ímpetos belicistas de Benjamin Netanyahu sobre Gaza. O Governo alemão já só exportou este ano 32.449 euros em armamento para aquele país do Médio Oriente, mas em Portugal, onde aparentemente o negócio das armas se faz com a máxima discrição, os valores estão a subir em flecha. Este ano, até Março, já se exportou mais de meio milhão de euros para Israel, de acordo com uma investigação do PÁGINA UM, ou seja, 16 vezes mais do que a Alemanha. E desde o início do conflito, a partir de Outubro do ano passado, já se ultrapassou um milhão de euros. Embora Portugal seja um player residual no lucrativo ‘negócio da guerra’, o país que colocou literalmente Gaza a ferro e fogo desde Outubro do ano passado está já na terceira posição como destino final. Apesar de as vendas até 2020 de armas para Israel a partir de empresas portuguesas serem praticamente inexistentes, os últimos meses mostram que o negócio apresenta agora uma tendência bastante crescente para ‘prosperar’.


Sobem as pressões para os países ocidentais suspenderem as exportações de armamento para Israel, mas Portugal, através de empresas a operarem em território nacional, está a aumentar os negócios com o governo de Benjamin Netanyahu desde o início do conflito em Gaza.

Apesar de Portugal ser um player diminuto à escala mundial no negócio do armamento, sobretudo por já nem sequer ter produção própria, de acordo com dados de exportações consultados pelo PÁGINA UM, Israel já passou a ser o terceiro destino final de armas provenientes do nosso país. Entre Outubro do ano passado e Março deste ano, foi exportado para Israel material de guerra classificado como “bombas, granadas, torpedos, minas e outras munições e projécteis” no valor total de 1.076.734 euros, um acréscimo de 56% face aos seis meses anteriores (Abril a Setembro de 2023) e quase quatro vezes mais do que o período homólogo anterior (Outubro de 2022 a Março de 2023).

man waving flag

Saliente-se que o negócio de armamento em Portugal é bastante incipiente face aos colossos internacionais do Ocidente, tendo envolvido apenas 91,7 milhões de euros no ano passado, sendo que o destino final é sobretudo os Estados Unidos (69%) e a Bélgica (21%). Porém, mais do que montantes avultados que movimenta não milhões mas sim biliões à escala planetária, o simbolismo conta também. Entre 2010 e 2020, o envio de armamento de Portugal para Israel cifrou-se em insignificantes 7.702 euros – por uma exportação em Novembro de 2012 –, mas tem sido crescente a partir de 2021. Em todo esse ano atingiu 140.329 euros, subindo para 636.888 euros em 2022, ou seja, uma média mensal de cerca de 53 mil euros

No período de 2023 antes dos ataques do Hamas contra Israel – e da violenta contra-ofensiva em Gaza –, já se evidenciava a tendência de aumento. Entre Janeiro e Setembro do ano passado, as exportações nacionais para Israel ultrapassaram os 91 mil euros por mês, mas nos último trimestre de 2023 e no primeiro trimestre deste ano, o valor quase duplicou, com uma média mensal de quase 180 mil euros. Considerando estes valores, Israel ultrapassou Espanha como terceiro destino de armamento proveniente de Portugal. Saliente-se que não houve exportações directas, envolvendo transacções monetárias, de armamento nem para a Ucrânia nem para a Rússia nos últimos anos

Podendo parecer pequeno o valor das exportações para Israel, num contexto mundial e especificamente no conflito que grassa aquela região do Médio Oriente nos últimos seis meses, Portugal apresenta condições para, face ao nulo debate sobre o negócio das armas em território nacional, se tornar uma ‘charneira’ para mais exportações.

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Por exemplo, a Alemanha – que tradicionalmente tem sido o segundo maior fornecedor de armamento de Israel (30% do total entre 2019 e 2023), com negócios de 326,5 milhões de euros no ano passado –, refreou drasticamente os envios face às críticas externas e internas. No dia 10 de Abril, o Ministério da Economia alemão revelou que só foi vendido armamento para Israel no valor de 32.449 euros. Ora, Portugal, no período entre Janeiro e Março deste ano, exportou armamento para aquele país do Médio Oriente no valor de 532.395 euros, ou seja, 16 vezes mais.

Nos Estados Unidos – que, com quase 70% do total, é o maior fornecedor de armas a Israel –, as pressões para se cortar o ímpeto belicista de Benjamin Netanyahu estão ao rubro. Anteontem, em entrevista à CNN, Joe Biden ameaçou congelar o fornecimento de armas se as forças israelitas atacarem a cidade de Rafah, em Gaza. E já esta semana foi suspenso o envio de um carregamento de bombas pesadas e anti-bunker, armas que têm sido usadas pelas forças israelitas na sua ofensiva contra o Hamas, que já causou a morte a perto de 35.000 palestinianos na Faixa de Gaza.

Também a Itália – que é o terceiro maior fornecedor de armas a Israel, com um pouco menos de cerca de 1% – suspendeu novas autorizações de exportação de armamento para aquele país desde o início da guerra em Gaza.

Valores (em euros) das exportações por mês, desde 2020, de armamento de Portugal para Israel. Fonte: INE.

Também o Canadá e a Holanda – países exportadores de armamento para Israel em pequena escala, como Portugal – já suspenderam qualquer envio por se temer que pudessem ser usadas em Gaza, provocando vítimas civis.

Saliente-se que o negócio legal de armamento requer licenciamentos especiais e autorizações por parte dos Ministérios dos Negócios Estrangeiros e da Defesa.


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