𝑂𝑠 𝑗𝑜𝑟𝑛𝑎𝑖𝑠 𝑒 𝑎𝑠 𝑟𝑒𝑣𝑖𝑠𝑡𝑎𝑠 𝑐𝑜𝑛𝑡𝑖𝑛𝑢𝑎𝑚 𝑎 𝑑𝑒𝑠𝑎𝑝𝑎𝑟𝑒𝑐𝑒𝑟 𝑑𝑎𝑠 𝑏𝑎𝑛𝑐𝑎𝑠, 𝑒 𝑎𝑠 𝑎𝑠𝑠𝑖𝑛𝑎𝑡𝑢𝑟𝑎𝑠 𝑑𝑖𝑔𝑖𝑡𝑎𝑖𝑠 𝑛𝑎̃𝑜 𝑐𝑜𝑚𝑝𝑒𝑛𝑠𝑎𝑚 𝑎 𝑝𝑒𝑟𝑑𝑎 𝑑𝑒 𝑙𝑒𝑖𝑡𝑜𝑟𝑒𝑠. 𝐸𝑚 2001, 𝑎 𝑟𝑒𝑣𝑖𝑠𝑡𝑎 𝐵𝑎𝑡𝑎𝑡𝑜𝑜𝑛 𝑣𝑒𝑛𝑑𝑖𝑎 𝑚𝑎𝑖𝑠 𝑑𝑜 𝑞𝑢𝑒 ℎ𝑜𝑗𝑒 𝑜 𝐷𝑖𝑎́𝑟𝑖𝑜 𝑑𝑒 𝑁𝑜𝑡𝑖́𝑐𝑖𝑎𝑠 𝑒𝑚 𝑝𝑎𝑝𝑒𝑙 𝑒 𝑓𝑜𝑟𝑚𝑎𝑡𝑜 𝑑𝑖𝑔𝑖𝑡𝑎𝑙. 𝐶𝑜𝑛𝑓𝑖𝑟𝑎 𝑐𝑜𝑚𝑜 𝑒𝑣𝑜𝑙𝑢𝑖́𝑟𝑎𝑚 𝑎𝑠 𝑣𝑒𝑛𝑑𝑎𝑠 𝑑𝑜𝑠 𝑝𝑟𝑖𝑛𝑐𝑖𝑝𝑎𝑖𝑠 𝑝𝑒𝑟𝑖𝑜́𝑑𝑖𝑐𝑜𝑠 𝑝𝑜𝑟𝑡𝑢𝑔𝑢𝑒𝑠𝑒𝑠 𝑑𝑒𝑠𝑑𝑒 𝑜 𝑖𝑛𝑖́𝑐𝑖𝑜 𝑑𝑜 𝑠𝑒́𝑐𝑢𝑙𝑜. 𝐴 𝑐𝑢𝑙𝑝𝑎 𝑑𝑜 𝑒𝑣𝑖𝑑𝑒𝑛𝑡𝑒 𝑑𝑒𝑠𝑎𝑠𝑡𝑟𝑒 𝑠𝑒𝑟𝑎́ 𝑑𝑜𝑠 𝑙𝑒𝑖𝑡𝑜𝑟𝑒𝑠 𝑜𝑢 𝑑𝑜 𝑗𝑜𝑟𝑛𝑎𝑙𝑖𝑠𝑚𝑜?
Apesar do fluxo noticioso da pandemia, os principais títulos da imprensa generalista portuguesa mantêm-se num processo de declínio profundo, que nem as subscrições digitais conseguem mitigar.
De acordo com os dados da Associação Portuguesa para o Controlo de Tiragem e Circulação (APCT), de entre as publicações de âmbito nacional, todos os quatros diários – Correio da Manhã, Diário de Notícias, Jornal de Notícias e Público – e os três semanários – Expresso, Sábado e Visão – venderam menos exemplares impressos no terceiro trimestre deste ano em comparação com o período homólogo de 2019.
A maior queda registou-se no Diário de Notícias (-45%), seguindo-se a revista Sábado (-41%) e o Jornal de Notícias (-37%). A menor queda foi a do Expresso, com as vendas em banca a retraírem 11% nos últimos dois anos. Em termos absolutos, no conjunto destas publicações foram vendidos por edição menos 77.143 exemplares em papel. O jornal mais penalizado foi o Correio da Manhã (-22.310 exemplares vendidos em banca), embora continue a ser a publicação de informação generalista com maiores vendas por edição em papel.
A situação não é mais grave porque as assinaturas digitais têm amenizado a crise, não apenas por os leitores terem mudado de hábitos de compra em quiosques e papelarias, no decurso da pandemia, mas também pelas fortes campanhas de marketing com preços bastante reduzidos. Assim, somando as vendas em papel e as assinaturas digitais, o cenário torna-se um pouco menos sombrio, com o Público e o Expresso a recuperarem leitores em comparação com o período homólogo de há dois anos.
No primeiro caso, o diário da Sonae passou de uma circulação total (impressa e digital) de 34.280 exemplares por edição no terceiro trimestre de 2019 para 50.763 no último trimestre, sobretudo por ter mais do que duplicado as assinaturas digitais (crescimento líquido de 22.154).
No caso do semanário da Impresa, o crescimento foi mais modesto: no terceiro trimestre de 2019 teve uma circulação paga total de 85.292 exemplares por edição; no último trimestre foi de 97.150, muito por força do incremento líquido de mais de 18 mil assinaturas digitais. As outras publicações (Correio da Manhã, Diário de Notícias, Jornal de Notícias, Sábado e Visão) não conseguiram fazer compensar com as assinaturas digitais as perdas em banca. Com efeito, ao contrário do Expresso e do Público, a sua expressão no mundo digital ainda é pouco relevante.
Porém, estes números das principais publicações generalistas, e ainda mais comparando um período de tempo tão curto, não revelam toda a profunda crise da imprensa portuguesa, afectando todos os segmentos. Analisando todas as publicações auditadas pela APCT, no terceiro trimestre do presente ano já nenhuma ultrapassou uma circulação paga superior a 100 mil exemplares.
O Expresso esteve próximo dessa fasquia no mais recente trimestre, embora a tenha superado ligeiramente na primeira metade do ano de 2021. Por outro lado, somente mais quatro publicações pagas ultrapassaram os 50 mil exemplares vendidos por edição: Continente Magazine (62.660, sendo aquela com maior circulação paga impressa), Maria (59.595), Correio da Manhã (55.517) e Público (50.763). No total, de entre as publicações do top 20 encontram-se cinco com vendas totais inferiores a 20 mil exemplares por edição.
O contraste com o início do século é tremendo. Não apenas existiam muitas mais publicações – a APCT auditava então 145, enquanto agora rondam a meia centena – como as vendas, todas em banca, eram espantosamente maiores. Considerando o terceiro trimestre de 2001, havia 13 publicações com vendas superiores a 100 mil exemplares e mais 15 com vendas entre 50 mil e 100 mil.
A revista Maria estava no topo com vendas de 326.757 exemplares por edição. Embora agora esta popular revista do outrora pujante Grupo Impala ainda ocupe a terceira posição das publicações com maiores vendas, em termos relativos vende agora menos de um quinto (18%) do que vendia há 20 anos.
As revistas do segmento do lazer e televisão eram então rainhas e senhoras. No terceiro trimestre de 2001, as revistas Nova Gente, Tempo Livre, Selecções do Reader’s Digest, Telenovelas, TV 7 Dias, Caras e Ana vendiam, cada uma, mais de 100 mil exemplares por edição. Mas mesmo os jornais de informação generalista ou especializada não se portavam nada mal. O Expresso atingiu, nesse período, vendas da ordem dos 137 mil exemplares – mesmo assim já longe do seu máximo esplendor: no terceiro trimestre de 1995, o semanário fundado por Pinto Balsemão – e que teve Marcelo Rebelo de Sousa como director entre 1979 e 1981 – alcançou os 169.454 jornais vendidos por edição.
A revista Visão e os diários Jornal de Notícias e Correio da Manhã superavam também a barreira dos 100 mil exemplares vendidos. E mesmo os desportivos estavam num paraíso. Por exemplo, mesmo com concorrência acérrima, o Record chegou aos 118 exemplares vendidos por edição.
Além da extinção de títulos icónicos – como os diários 24 Horas, A Capital, o Comércio do Porto, os semanários Independente, Focus e Euronotícias, e a revista mensal Grande Reportagem –, as últimas duas décadas mostraram-se dramáticas para os periódicos ainda “sobreviventes”.
Dos principais periódicos generalistas, em 20 anos o Público foi aquele que menos perdeu em vendas (cerca de 10%), embora a queda seja brutal se se considerar somente as vendas em banca (-78%). A revista Visão e o Jornal de Notícias perderam ambos 72% do número total de vendas, o Correio da Manhã 46%, e o Expresso 30%. A actual versão da revista Sábado não era ainda publicada em 2001.
O símbolo máximo da crise da imprensa tradicional em Portugal acaba por ser o Diário de Notícias. No primeiro trimestre de 2001 vendeu 65.382 exemplares por edição, fechando o top 20 dos periódicos mais vendidos. No apuramento mais recente da APCT surge apenas com 2.969 exemplares vendidos em banca e mais 1.958 assinaturas, ocupando a 42ª posição, atrás mesmo do seu homónimo da Madeira.
Será que todo este cenário negro se deveu somente à mudança de hábitos e à introdução de novas tecnologias? Ou foi também o jornalismo – e a qualidade dos jornalistas?