Recensão Eleitoral

As letras pequenas no contrato com a Iniciativa Liberal

two black cats looking outside a glass window

por Tiago Franco // Janeiro 23, 2022


Categoria: Opinião

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Com os dois maiores partidos em empate técnico, o grande destaque desta semana no que a sondagens diz respeito é a Iniciativa Liberal (IL). O crescimento nas sondagens deixa a IL com um grupo parlamentar constituído por 4 a 6 deputados.

Esta subida assinalável tem, na minha opinião, duas razões primordiais. Desde logo as prestações de João Cotrim Figueiredo nos debates. Depois, a magnífica capacidade da retórica liberal que transforma um prato de feijão com arroz numa experiência gourmet de hidratos.

O objectivo é só um: desviar dinheiro público para bolsos privados, chamando-lhe outra coisa qualquer. Ou como diria um liberal, um rebranding no Orçamento de Estado.

A parte difícil é convencer uma população, ou parte dela, que isto lhes trará algo de bom. Cotrim tem feito um bom trabalho nesse campo, admito. Até na gestão das incongruências vejo mérito. As sondagens assim o provam.

Andou anos a pedir menos Estado, mas, durante a pandemia, pediu intervenção urgente do Governo nos apoios às empresas.

Falou em cada debate sobre o dinheiro gasto na TAP, mas, que me lembre, nem uma palavra sobre a banca, em especial o BPP, de cuja holding foi presidente.

Vende todos os dias as maravilhas do imposto único sem explicar que isso beneficia verdadeiramente uma minoria, não os 75% que levam menos de 900 euros para casa.

Consegue dizer, sem se rir, que desviar dinheiro da escola pública para o ensino privado (é disto que se trata, por mais nomes que lhe possam dar) é dar mais liberdade de escolha às pessoas. Nunca o ouvi explicar que, na verdade, são as escolas privadas, pagas por todos, que teriam a liberdade de escolha, uma vez que fazem a selecção dos alunos.

Num país onde os privados fugiram do combate à pandemia ou exigiram ao governo uma fortuna por cada paciente, Cotrim quer dizer-nos que liberdade na saúde é um bom seguro da Medicare.

Quando lhe perguntam se o exemplo a seguir é a selva americana, ele diz que não. A IL segue o modelo nórdico e de outros países europeus de “sucesso económico”. E é aqui que fico baralhado. A Suécia, tão utilizada nos cartazes, tem 30% da força de trabalho assente na Função Pública. Ora, Cotrim está farto de dizer que temos funcionários públicos a mais.

O Governo sueco (de esquerda), governa com o apoio dos centristas, comunistas e ambientalistas. O partido liberal é a sétima força no parlamento sueco. Isto está para um “país liberal” como o Brasil de Bolsonaro estava para o mapa de partidos socialistas, com que a IL decorou os cartazes da Segunda Circular.

A ideia liberal tem óptimos conceitos. E não estou a ser irónico. Pena é que não se apliquem a pessoas que dependem de um sistema público de Saúde, aos que necessitam de uma escola pública decente num bairro de subúrbio ou para quem tem salários, digamos, inferiores a 4.000 ou 5.000 euros. Mas para todos os outros funciona às mil maravilhas, isso é garantido. Resta saber quantos portugueses se encaixam nesta última categoria.

Por isso, olhando para as intenções de voto na IL, fico na dúvida se a classe média portuguesa aumentou, e estão a tratar da vida, o que compreendo, ou se o pessoal que depende da rede pública de serviços, e está naquela média salarial que nos mata, ainda não percebeu as letras pequenas do contrato que João Cotrim Figueiredo nos tenta vender.

Engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)


Oitavo episódio da Recensão Eleitoral (23/01/2022) – As letras pequenas no contrato com a Iniciativa Liberal


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