Quando se defende que o jornalismo deve ser isento – e, talvez, me tenham já lido a usar este adjectivo nesse contexto –, deveria esclarecer que a isenção significa uma demonstração de imparcialidade, ser justo, ser neutro. Ora, a neutralidade, a justiça e a imparcialidade são excelentes características de um jornalismo credível, mas não representa indiferença aos factos, à sua eventual manipulação, à verdade e à mentira.
O jornalista deve partir, para qualquer notícia, imbuído de um espírito de isenção – ou seja, sem ideias pré-concebidas, sem intenção de criar enviesamentos, sem predisposição de orientar os leitores para uma linha previamente definida.
A partir do conhecimento que for adquirindo, daquilo que for observando e analisando, então deverá partir para a fase seguinte: tomar uma posição isenta, mas já não na exclusiva acepção de neutro, sem tomar uma posição. Pelo contrário.
Deve ser a isenção interpretada como sendo independência de carácter. Ou seja, depois da sua análise, um jornalista se quiser então ser justo, não pode ser completamente neutro; não pode ser imparcial, tem de tomar partido.
Um jornalista é, na verdade, um árbitro dos acontecimentos. Espera-se que um árbitro seja neutro, mas também justo e imparcial; porém, se ele, analisando um lance, vir que um jogador da casa dá uma canelada no adversário quando este se dirigia isolado em boa posição para o golo, e não marcar falta nem expulsar o caceteiro, estará então a cometer uma injustiça, uma batotice. Mesmo se receber os elogios do clube da casa pela sua “prestação”.
Ora, foi como antigo jornalista – assistente pasmado dos maiores atropelos à isenção, no sentido de independência de carácter, durante a pandemia – que decidi, depois de uma profunda análise, recuperar a carteira profissional e enveredar pelo projecto do PÁGINA UM.
Também foi por observar a realidade do Freedom Convoy – analisando dezenas de notícias, vendo vídeos, alguns ao vivo, e pesquisando pelas redes sociais –, que me foi possível fazer uma cobertura isenta sobre este movimento popular,praticamente ignorado pela nossa imprensa mainstream, a mesma que ignora qualquer outra manifestação em se conteste a gestão da pandemia.
E, nesta cobertura, não pode ninguém acusar-me de falta de isenção, porquanto coloquei sempre a opinião de todas as partes, mesmo quando me pareciam absurdas. A acusação feita pelo primeiro-ministro canadiano contra os manifestantes e os organizadores do GoFundMe, à luz de todos os acontecimentos que se podem visualizar – e agora é possível ver tudo – , são completamente inverosímeis e absurdas.
Trudeau até de transfobia os acusou; até de “roubarem comida a sem-abrigos”. Entrámos no mundo do surreal. O governo canadiano, com tantos meios, nunca conseguiu mais do que simples palavras acusatórias. Nem uma foto, nem um vídeo, nada. Apenas palavras acusatórias e vexatórias.
Não apenas palavras. Também actos. Assustados ou não com a mobilização por força de apoios financeiros de monta através da plataforma do GoFundMed, as autoridades políticas canadianas trataram de diabolizar ainda mais os manifestantes, acusando-os por receberem financiamentos de obscuros interesses estrangeiros e de serem promotores de extremismo. O objectivo era simples: fechar a “torneira” da angariação de fundos através do GoFundMe. Impedir uma manifestação de ter poder, de não vacilar.
Justin Trudeau ganhou este round. Durante esta madrugada, o GoFundMe veio suspender em definitivo a campanha do Freedom Convoy, e já não distribuirá nove dos 10 milhões de dólares canadianos (6,3 dos 7,0 milhões de euros) ao organizadores do GoFundMe, alegando que as “autoridades” lhes demonstraram que a campanha visava a “promoção da violência e do assédio”, o que viola os termos do serviço.
O GoFundMe concedeu assim um presente ao Governo canadiano – não apenas secando a fonte de financiamento do Freedom Convoy como dando-lhes um estatuto de promotores de violência e assédio, que o Governo de Trudeau não desaproveitará ao longo dos próximos dias – e, em simultâneo, deu uma terrível facada na democracia, na liberdade de manifestação e de intervenção, que são sagradas numa democracia, independentemente de serem desejadas ou convenientes para as autoridades.
O GoFundMe cedeu à pressão de um Governo,
O GoFundMe cedeu à manipulação de informação.
E isso é intolerável.
Como se sabe, o PÁGINA UM recorreu a várias formas de financiamento, para garantir o seu arranque inicial, o seu crescimento e a sua sustentabilidade financeira. O PÁGINA UM sabia que, pela sua postura e filosofia, traria inimizades e críticas, porventura muitas dos círculos do poder.
Mas nunca o PÁGINA UM colocou a hipótese de que, um dia, pudessem seguir queixas para este tipo de plataformas, como a do GoFundMe, e ver-se envolvido numa eventual acusação de promoção de violência e de assédio, de estar a receber dinheiro de fontes anónimas e eventualmente associadas a extremismos. Note-se que os apoios são apenas permitidos por cartão de crédito, e a possibilidade de anonimato do doador é apenas para terceiros; não para os angariadores.
Por esse motivo, pelo comportamento do GoFundMe, o PÁGINA UM não poderia continuar a manter nesta plataforma uma campanha de angariação de fundos.
Não terá essa decisão qualquer efeito para o GoFundMe. É uma decisão simbólica, de protesto, porque a democracia não é assim que se constrói. O montante angariado pelo PÁGINA UM na plataforma do GoFundMe foi apenas de 13.884 euros, através de 356 donativos. O GoFundMe, e entidades associadas, ficaram com cerca de 10% em comissões e encargos de transacção.
Assim, a partir de hoje, se desejar financiar pontualmente o PÁGINA UM, então pedia que optassem pela campanha agora em curso no Mightycause, AQUI.
Obrigado, Espero que compreendam esta decisão.