Visto de Fora

Mais longe de um acordo de paz

person holding camera lens

por Tiago Franco // Março 26, 2022


Categoria: Opinião

minuto/s restantes


Conselho Europeu, G7 e NATO reuniram-se esta semana, e todos vimos, em direto, a chegada dos líderes, o carro que trazia Biden e a indumentária de Macron. Fez-me lembrar o acompanhamento do autocarro com a selecção de Scolari naquela fatídica noite de 2004.

Segundo alguns analistas, poucas decisões importantes saíram da cimeira, e espera-se por mais, apenas em Junho. Eu discordo. Acho que dali saíram várias informações, ainda que contraditórias.

A primeira é que Zelinsky continua a desafiar a NATO para que faça mais pela Ucrânia, e que, por exemplo, feche o espaço aéreo, que na prática seria uma entrada directa na guerra. Isto dias depois de ter dito que aceitava discutir o estatuto de neutralidade. Algo parece ter mudado no terreno, para lá de Mariupol, para Zelinsky se estar novamente a afastar da perspectiva de acordo.

desk globe on table

A NATO, em conferência de imprensa no fim dessa cimeira, disse que iria reforçar os batalhões nas fronteiras – agora da Roménia, Hungria e Eslováquia –, fazendo um total de 40.000 homens, incluindo aqueles já estacionados no Báltico e na Polónia. Acrescentaram ainda que vão enviar marinha de guerra para a costa ucraniana, para além de mais armamento pesado que continuaria a ser enviado.

Zelinsky pediu caças, tanques e anti-aéreas. Começa a ser difícil perceber onde está a linha a partir da qual podemos dizer que a NATO se envolveu activamente na guerra. Se enviam barcos de guerra para o teatro de operações, enfim, não sei bem se podemos continuar a dizer que estão apenas a assistir.

Quanto à União Europeia, declararam os seus líderes um aumento das sanções à Rússia, sem que esta posição seja unânime entre os países membros. A Alemanha, altamente dependente do fornecimento de energia vinda da Rússia, não quer sanções kamikaze, uma vez que seria o seu povo o primeiro a pagar a factura. E quando se trata da voz europeia, conta essencialmente o que os alemães deixam ou não. Os franceses habitualmente vão-se colocando em bicos dos pés naquela ilusão do eixo franco-alemão, mas quem realmente dá as ordens é Berlim.

O Kremlin vai pedindo o pagamento do gás em rublos – e admira-me que não tenham pedido em ouro – para se defender, e Boris, o party man de Downing Street, está em pulgas para enviar tropas nos contentores de armamento.

blue and white train

Uma coisa parece ser certa, a Europa segue o conflito a três velocidades: o Reino Unido vota por mais sangue; os países energeticamente dependentes querem mandar misseis para Kiev e rublos para Moscovo; e nós, com a restante maioria dos países europeus, queremos fazer o que a NATO mandar. Seja lá isso o que for.

Chegámos, no entanto, a um ponto do conflito onde a resistência ucraniana, o armamento enviado, a ajuda financeira e a legião de 20 mil voluntários, parecem estar a virar o sentido da guerra. É essa pelo menos a indicação da nossa comunicação social.

Ouvem-se também notícias de opositores de Putin e um possível golpe de estado. É impossível saber que percentagem de verdade existe no que nos vai chegando, mas espero, a bem da paz, que a queda de Putin esteja próxima.

Na semana passada escrevi que esta guerra era um beco sem saída para Putin, uma vez que ou ganharia uma guerrilha permanente (no caso de um governo fantoche) ou seria arrastado para fora da Ucrânia com a Europa a fechar as portas. Já há notícias da possível utilização de armamento químico e nuclear, em novas ameaças russas.

Seria interessante perceber, neste chorrilho de informações que nos vai chegando, qual é de facto a verdade absoluta sobre o cenário de guerra. Ou aproximada, vá.

Na semana passada ninguém colocava em questão o cerco feito pela Rússia. Hoje dizem que não tem tropas suficientes. Mariupol está numa situação desesperada, e todos os dias ouço falar no batalhão Azov em combate. No entanto, leio depois que são apenas cem soldados. Terão vindo de Sparta?

Uma coisa é certa, parecem ter algum repúdio por nazis portugueses. Portanto, mesmo em tempo de barbárie, ainda há um vislumbre de lucidez.

Entre o caminho de sentido único de Putin e o belicismo da NATO, só vejo a escalada do conflito quando, há uns dias, nos diziam que o acordo de 15 pontos estava perto de ser assinado.

A quem interessará a continuação desta guerra? É a pergunta do milhão de euros…

Terá ou não Putin o apoio da China se a derrota for o cenário mais provável?

Engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)


N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

O jornalismo independente DEPENDE dos leitores

Gostou do artigo? 

Leia mais artigos em baixo.