VISTO DE FORA

A claque dos generais

person holding camera lens

por Tiago Franco // Abril 14, 2022


Categoria: Opinião

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Não tendo passado por qualquer teatro de guerra, nem sequer como soldadinho de chumbo, tenho apreciado com algum vigor os comentários aos comentários no que ao desfilar de militares nas televisões nacionais diz respeito.

Aparentemente, também se está a formar uma claque de vila bajo e outra de vila arriba – publicidade dos anos 90, sinal primeiro de velhice – para puxar pelos nossos generais.

Pelo que percebo, se dizem aquilo que achamos ser a lógica da guerra no momento, são as vozes da razão. Já se escorrem opiniões disparatadas, são uns energúmenos ao serviço de alguém. Note-se que somos nós, que nem o serviço militar fizemos, que decidimos o que faz sentido ser dito sobre o teatro de guerra.

black megaphone pendant

Jornalistas conceituados como, por exemplo, Fernanda Câncio, insultam generais no Twitter ridicularizando as suas opiniões. Classificando-as como disparatadas.

Fernanda Câncio pode não detectar uma moscambilha, digamos, no próprio quarto ou no cofre de uma hipotética sogra, mas sobre invasões e reagrupamento de batalhões não pede meças a ninguém.

Acho extraordinária a arrogância com que arriscamos entrar em campos desconhecidos. É algo muito português esta coisa da convicção na opinião. Não primamos pela busca do conhecimento, mas defendemos, com unhas e dentes, uma opinião pouco fundamentada. Até ao limite. Mesmo que tenhamos de insultar homens que andaram em cenários de guerra como observadores internacionais.

Tudo porque, no decorrer de uma guerra, eles, os militares, não pensam como nós, que vimos todos os Rambos e até nos emocionámos com o Platoon.

E nesta coisa das claques definimos logo que uns militares defendem cegamente a causa russa, outros estão pela Ucrânia. A poucos parece passar pela cabeça que aqueles homens, sentados em frente a uma câmara, se limitam a correr o risco de emitir uma opinião para que possam ser mais tarde ridicularizados pelos verdadeiros especialistas de sofá.

Se afirmam que o exército russo é mais forte, são pró-Putin. Se observam na resistência ucraniana os novos barbudos da Sierra Maestra, logo são pró-Zelensky. Sofrem do delito de opinião e sujeitam-se ao julgamento da Câncio, do Milhazes ou do Rogeiro, que fala por interpostas pessoas com o Zelensky.

Durante a pandemia tínhamos doutorados em Geologia a dar lições de Saúde Pública, e todos faziam ámen. Agora temos militares a falar sobre guerra e… dizem que todos estão ao serviço de uma agenda qualquer. Tenho a impressão de que o excesso de informação nos retirou a capacidade de raciocínio. Ou, pior, nos deixou com a sensação que sabemos mais do que nos ensinaram.

white ceramic mug on table

Hoje ouvi um militar na CNN, cujo nome não decorei, a dizer que na preparação da grande batalha do Donbass, as tropas russas estavam com o moral em baixo. A razão? Muitos reservistas vinham de longe, lá dos confins da Sibéria, mal preparados, sem saber bem o que iam fazer para o centro da Europa. Já os ucranianos, com os civis em grande forma e os drones a terem um papel decisivo, estariam em melhor posição para a fase decisiva do conflito.

Com os afilhados de Putin a ganharem votos por toda a Europa civilizada – veja-se França, por exemplo –, a última coisa que precisamos é que a Rússia ganhe mais território em direcção ao Ocidente.

De modo que, como nem sequer passei da recruta, espero que o general de hoje tenha razão. Na dúvida, vou ver o que a Câncio diz. Só para ficar esclarecido.

Engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)


N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

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