TRANSPARÊNCIA & DEMOCRACIA

Base de dados dos internados-covid: DGS não quer dar; Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos diz que tem de dar

person wearing white long sleeve shirt and white gloves

por Pedro Almeida Vieira // Abril 23, 2022


Categoria: Exame

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A Direcção-Geral da Saúde garantiu, em Fevereiro passado, que cerca de 75% dos internados-covid tinham sido internados por consequência directa da infeção pelo SARS-CoV-2, mas quando o PÁGINA UM quis ver a base de dados com esses elementos, mais uma vez obteve o silêncio e o obscurantismo como resposta. A Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos diz agora, em parecer, que a DGS deve disponibilizar a base de dados. Se a DGS persistir nesta postura, o PÁGINA UM accionará o seu FUNDO JURÍDICO para (mais) um processo de intimação junto do Tribunal Administrativo.


A Direcção-Geral da Saúde (DGS) deverá formalmente disponibilizar ao PÁGINA UM a base de dados dos doentes-covid desde o início da pandemia até à data, considera a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) em parecer emitido por unanimidade em reunião na quarta-feira passada.

A deliberação da CADA, ontem enviada ao PÁGINA UM, resulta de mais uma recusa da DGS em divulgar documentos administrativos, desta feita a base de dados que a entidade liderada por Graça Freitas referiu existir quando, em comunicado de 4 de Fevereiro passado, divulgou que “no período entre 02/03/2020 e 10/12/2021, verifica-se que, das pessoas internadas com uma infeção por SARS-CoV-2, cerca de 75% estavam internadas por consequência direta dessa infeção.”

white and black hospital bed

Nesse comunicado, a DGS confessava que “diariamente, as Administrações Regionais de Saúde recolhem manualmente de forma agregada junto dos hospitais o número total de camas ocupadas por pessoas com infeção por SARS-CoV-2/ COVID-19 em enfermaria e em Unidades de Cuidados Intensivos (UCI)”, acrescentando que “estes dados são comunicados à Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), que os processa e valida, partilhando-os posteriormente com a Direção-Geral da Saúde para divulgação.”

A existência da base de dados era, obviamente, conhecida pelo PÁGINA UM, tanto assim que tivera já acesso confidencial a uma cópia com registos individuais anonimizados entre Março de 2020 e meados de Maio, e que permitiu divulgar uma dezena de artigos de investigação inédita na comunicação social portuguesa durante a pandemia (Dossier P1 – Covid).

Nesta base de dados não existe qualquer informação pessoal que possibilite a identificação dos doentes, uma vez que todos os registos se encontram anonimizados, constando somente registos individualizados identificados com caracteres alfanuméricos, com indicação da idade, sexo, período e hospital de internamento, output (óbito ou alta), incluindo se esteve em unidade de cuidados intensivos, e comorbilidades e referências à evolução do estado clínico.

Aliás, no pedido do PÁGINA UM à DGS tinha sido salientado que os dados a disponibilizar deveriam ser anonimizados, para preservação da identidade e da esfera pessoal de cada doente. Cumprindo, aliás, não apenas o previsto no Regulamento Geral de Protecção de Dados como também o código deontológico dos jornalistas.

Com este pedido formulado pelo PÁGINA UM à DGS, em 21 de Fevereiro passado – que resultou, agora, no parecer da CADA –, pretendia-se sobretudo que esta entidade respeitasse o princípio de “arquivo aberto” da Administração Pública. Além disso, permitindo também uma actualização da informação – uma vez que o PÁGINA UM deixou de ter acesso à base de dados a partir de Maio do ano passado –, seria ainda possível confirmar, de forma independente, a veracidade e rigor das informações tornadas públicas pelo Governo e pela DGS.

A CADA, no seu parecer, destacando que “deverá ser cumprido o direito de acesso”, refere também que “se o volume ou complexidade da informação o justificarem, o prazo [de entrega dos documentos] (…) pode ser prorrogado até ao máximo de dois meses, devendo o requerente ser informado desse facto, com indicação dos respectivos fundamentos, no prazo de 10 dias”.

Saliente-se, contudo, que a base de dados consiste, num conjunto de elementos, que, apesar de numerosos, são susceptíveis de serem transpostos numa simples folha de cálculo (tipo Excel), de acesso imediato.

Caso não seja agora recebida finalmente uma cópia da base de dados dos internados-covid, este será mais um dos elementos a integrar num processo de intimação contra a DGS que o PÁGINA UM está já a preparar para entregar em breve no Tribunal Administrativo, recorrendo ao FUNDO JURÍDICO.

Saliente-se que este é um dos oito requerimentos à DGS já apresentados pelo PÁGINA UM ao longo dos últimos meses sobre a pandemia – e que mereceram outros tantos pareceres da CADA.

Além do pedido relacionado com a base de dados dos internados, o PÁGINA UM solicitou ainda o acesso à base de dados sobre surtos e óbitos em lares durante a pandemia; à base de dados do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (SINAVE); a documentos sobre a evolução (temporal) da incidência cumulativa (real ou estimada) e as taxas de letalidade em Portugal das diferentes variantes do SARS-CoV-2 classificadas pela OMS como de preocupação (VOC) ou de interesse (VOI); os registos de surtos e mortes por covid-19 (como infecção nosocomial) em unidades hospitalares do SNS; os registos detalhados do conjunto de testes de deteção de SARS-CoV-2 e o número de casos positivos por idade ou faixa etária; os documentos produzidos no âmbito da actividade da Comissão Técnica de Vacinação contra COVID-19 (CTVC); e a consulta presencial do Sistema de Informação dos Certificados de Óbito (SICO).

Apenas no caso dos documentos da CTVC, a DGS satisfez, entretanto, parcialmente o requerimento do PÁGINA UM (cedendo os pareceres), mas ainda não disponibilizou as actas que, por exemplo, permitam identificar os consultores que votaram contra a vacinação dos adolescentes no Verão do ano passado. De entre os oitos pareceres, somente no caso do acesso ao SICO a CADA considerou que esta base de dados se encontra regida por uma legislação especial – negando assim razão ao PÁGINA UM –, questão que virá a ser ainda dirimida nas instâncias judiciais.

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