Há dias, em mais um Conselho de Ministros que faz anúncios recebidos acriticamente pela imprensa mainstream, foi-nos dado a conhecer o anteprojecto de Lei de Protecção em Emergência de Saúde Pública. Disseram-nos que tal documento resultou “de um aprofundado estudo por uma Comissão da mais elevada competência técnica, nas áreas jurídica e de saúde pública”. Protérvia não falta ao Governo.
E pensávamos que já tínhamos “visto” tudo, e de tudo.
Referimo-nos, naturalmente, àquilo que sucedeu desde Março de 2020: o maior e mais impensável ataque ao Estado de Direito Democrático e à Constituição da República Portuguesa, perpetrado precisamente pelos titulares dos órgãos que a juraram defender; a saber, Presidente da República, Primeiro Ministro e governo, com o beneplácito régio da Assembleia da República.
Já aqui se escreveu sobre este assunto.
Por conseguinte, não satisfeitos, estamos agora na iminência de tornar a distopia global, nascida a partir de uma “pandemia”, numa verdadeira “bomba atómica” contra o Estado de Direito Democrático, o que representará as exéquias sem glória nem pudor da Constituição da República Portuguesa (CRP).
Dizem-nos que o malfadado – e quase arriscaríamos a acrescentar já malparido – anteprojecto contou com a participação dos egrégios, excelsos e ilustres juiz conselheiro jubilado António Henriques Gaspar, procurador-geral-adjunto João Possante, e doutor Ravi Afonso Pereira, em representação da Provedoria de Justiça. Assim lança o regime uns “ases” em forma de “duques” para nos fazer cenas tristes: uma berrante e aberrante esquiço de lei que nem digna seria numa certa república popular encravada entre a China e a Coreia do Sul.
Na nota justificativa desta “pérola” legislativa, temos este “penedo”: “procurou-se ainda dotar as disposições legais de uma adequada densidade, pois em caso algum pode a declaração de uma emergência de saúde pública, mesmo na sua fase crítica, traduzir-se numa carte blanche para o poder executivo adoptar quaisquer outras medidas que na lei não estejam expressamente previstas ou, pelo menos, nela não tenham fundamento.”
Nem queremos imaginar o que seria se estas sumidades não se apercebessem do risco de conceder uma carte blanche ao Governo…
Falemos a sério: efectivamente, o que o anteprojecto manifestamente mostra é ser mesmo uma carta em branco, que pode ser usada da mesma forma nas mãos de um democrata ou de um tirano. Com a única diferença de que se um tirano a usar continuará a ser um tirano, e se um democrata a usar se tornará um tirano. Mas só na primeira, porque quererá usá-la sucessivas vezes.
Outra nota relevante que consta do documento é de que as medidas usadas durante a covid-19 eram necessárias. Continuamos sem questionar ou aquilatar os seus resultados; assim, surge esta outra “peça de filigrana”: “Desde cedo, logo em Março de 2020, que se iniciou um debate sobre a adequação do quadro jurídico perante uma tão grave crise de saúde pública, designadamente questionando-se até que ponto algumas das medidas tidas por necessárias para um eficaz combate à pandemia teriam ou não cobertura ao abrigo da legislação em vigor.”
Andámos, certamente, distraídos. Não vimos debate, apenas améns, e resoluções de Conselho de Ministros umas atrás das outras, todos assobiando como se tivessem respaldo constitucional.
Na verdade, importa dizer que estas “medidas tidas por necessárias” não só não foram eficazes como também nem eram necessárias, como também se revelaram catastróficas; basta comparar com o país que, por exemplo, nunca as implementou: a Suécia.
Note-se isso no confronto da mortalidade total – porque, surpresa talvez para os defensores das “medidas tidas por necessárias”, morre-se de muitas outras doenças – entre diversos países latinos e escandinavos durante os anos de 2020 e 2021. Por exemplo, no país que implementou as “medidas tidas por necessárias” – leia-se, Portugal – teve na faixa etária entre os 20 e 65 anos um rácio de mortalidade 70% superior à de certo país que não quis, malvado, implementar as “medidas tidas por necessárias” – leia-se, Suécia.
Similar constatação observamos no grupo etário com idade igual ou superior a 65 anos. Neste caso, o país que tomou todas as “medidas tidas por necessárias” – leia-se, restrições de visitas a lares, “fraldas faciais”, isolamentos e lockdowns, etc., etc., etc. – teve 16% mais mortes de idosos do que certo país onde um rei se lamentou com um “falhámos; temos um grande número de mortos e isso é terrível”, porque, enfim, não foram implementadas as “medidas tidas por necessárias”. É certo que o nosso presidente da República não disse “acertámos”, mas andou lá perto em elogios à eficácia das nossas “medidas tidas por necessárias”.
Outro facto que nos deixa perplexos é a mudança de paradigma; desde sempre, as epidemias, tal como outras catástrofes, eram tidas por eventos fortuitos, imprevisíveis e naturais. Mas agora tudo mudou: para além do senhor Gates – que até já anunciou a próxima pandemia, mas já está a receber royalties por nos ajudar a prevenir a “coisa”–, agora, arriscamo-nos a ver o infame anteprojecto tornar-se lei, podemos vir a viver em permanentes emergências sanitárias.
Basta tão só que o Governo de ocasião as decrete se e quando assim o entender. Uma simples gripe, uma anunciada onda de calor, uma previsível vaga de frio, uma suposta carta de um bioterrorista, tudo poderá ser uma justificação bastante para uma tirania para o bem da nossa saúde, para que seja possível que o Governo possa implementar, aí está, as “medidas tidas por necessárias”. Assim reza, para mal dos nossos pecados, o artigo 2º do malfadado anteprojecto.
Eis-nos, por conseguinte, ao “estado a que chegámos”: um Governo de uma república dita democrática – mas em que a capital não se chama Kinshasa – passa a ser nosso dono e senhor. Pode declarar uma emergência, sem mais, apenas por que lhe apetece; não por haver meia dúzia de critérios pré-definidos e objectivos – vá lá, um! –, seja quantitativo ou qualitativo, emitido por uma entidade verdadeiramente independente.
Ora, o anteprojecto não estabelece qualquer critério e depois sustenta-se numa comissão científica ad hoc, criada à posteriori, escolhida directamente pelo poder político, sendo que a maioria (seis em nove membros) é nomeada pela voz e caneta do primeiro-ministro! E define as sinecuras.
Mas vamos a detalhes do infame documento, e sobre os direitos que tem ganas de atropelar.
Direito à liberdade
Segundo o artigo 9º, alínea 1, “A autoridade de saúde pode determinar o isolamento no domicílio, em local adequado de alojamento, estabelecimento de saúde ou estrutura de acolhimento e apoio por um período que não ultrapasse 14 dias, com a finalidade de afastar o risco para a saúde pública, de pessoa afectada por doença que fundamenta a declaração da emergência de saúde pública”.
Ficamos a saber que, em lugar de um juiz, basta um mero esbirro, na solidão de um gabinete (ou, de pantufas em teletrabalho), para decretar a prisão domiciliária de um qualquer servo da gleba, não só no seu domicílio, mas também em campos de concentração, eufemisticamente denominados por “estrutura de acolhimento e apoio”, e que serão, por certo, destinados aos impenitentes e relapsos.
Sejamos claros: o artigo 27º, alínea 2, da CRP – se é que ainda não foi revogada sem nos darmos conta – não permite a privação da liberdade sem controlo judicial: “Ninguém pode ser total ou parcialmente privado da liberdade, a não ser em consequência de sentença judicial condenatória pela prática de acto punido por lei com pena de prisão ou de aplicação judicial de medida de segurança.” Mesmo as excepções que constam da alínea 3 do mesmo artigo não permitem que um funcionário administrativo possa privar alguém da sua liberdade.
E atenção: a “prisão” decretada pelo tal “senhor das pantufas” poderá não ficar pelos 14 dias. Segundo o nº 2 do artigo 30º, caso estejamos na fase crítica da emergência, “o isolamento pode ser sucessivamente renovado por períodos até 10 dias enquanto persistirem as condições de risco para a saúde pública.”, ou seja, a privação de liberdade é pelo tempo que as autoridades de saúde entendam. Se as autoridades considerarem que as “medidas tidas por necessárias” são mesmo necessárias por, vá lá, a vida toda, enfim, “azarito”. Podemos imaginar de que forma este instrumento poderá ser usado para calar vozes incómodas ou até abafar escândalos políticos.
A arbitrariedade não se fica por aqui: os critérios para determinar se a pessoa está afectada (ou infectada) pela doença ou outras maleitas ficam inteiramente nas mãos das autoridades de saúde. Até porque a emergência pode ser decretada pela simples iminência – ou seja, de algo que ainda não existe, que pode nunca vir a existir, mas que, como pode existir (porque o pode admite a possibilidade do “não pode”), para segurança de todos decreta-se a tal emergência e implementam-se as “medidas tidas por necessárias”, que obviamente incluirá ao enclausuramento domiciliário.
Recordemo-nos que, na recente crise sanitária, decretaram-se milhares e milhares de prisões domiciliárias, completamente anticonstitucionais, suportadas em teste de duvidosa fiabilidade, que, além de mais, nem sequer garantiam que a pessoa estava doente e que transmitia a infecção.
Sobre esta matéria, o Tribunal da Relação de Lisboa, no seu acórdão de 11 de Novembro de 2020, afirmou taxativamente: “Por essa fiabilidade depender do número de ciclos que compõem o teste; Por essa fiabilidade depender da quantidade de carga viral presente… O que decorre destes estudos é simples – a eventual fiabilidade dos testes PCR realizados depende, desde logo, do limiar de ciclos de amplificação que os mesmos comportam, de tal modo que, até ao limite de 25 ciclos, a fiabilidade do teste será de cerca de 70%; se forem realizados 30 ciclos, o grau de fiabilidade desce para 20%; se se alcançarem os 35 ciclos, o grau de fiabilidade será de 3%.”.
Confrontemo-nos também com o comunicado do Centers for Disease Control and Prevention (CDC) que, em Julho de 2021, desaconselhou o teste PCR, considerando-o incapaz de distinguir na perfeição o SARS-Cov 2 do vírus influenza (gripe comum).
Recordemo-nos também de um pedido de informações de um grupo de cidadãos ao Ministério da Saúde para que fosse disponibilizada a “publicação científica, revista por pares, relativamente ao teste RT-PCR como ferramenta de diagnóstico fiável para identificar a infecção por vírus SARS-CoV 2 em humanos”, que justificasse a adopção destes testes. A resposta foi simples: “ não possuía nenhum documento administrativo” a respeito.
Estes são os critérios científicos que esta gente utiliza para nos mandar para o cárcere: podemos ficar descansados!
Direito à integridade pessoal
Segundo a CRP, no seu artigo 25º, alínea 1, “A integridade moral e física das pessoas é inviolável”. O diagnóstico de uma doença não é uma ofensa à integridade física caso seja praticado por um médico ou por outra pessoa legalmente autorizada, conforme o artigo 150º do Código Penal português (CPP): “As intervenções e os tratamentos que, segundo o estado dos conhecimentos e da experiência da medicina, se mostrarem indicados e forem levados a cabo, de acordo com as leges artis, por um médico ou por outra pessoa legalmente autorizada, com intenção de prevenir, diagnosticar, debelar ou minorar doença, sofrimento, lesão ou fadiga corporal, ou perturbação mental, não se consideram ofensa à integridade física.”; no entanto, carecem de consentimento, caso contrário, não podem ser realizadas, tal como nos indica o artigo 156ª do CPP, alínea 1: “As pessoas indicadas no artigo 150.º que, em vista das finalidades nele apontadas, realizarem intervenções ou tratamentos sem consentimento do paciente são punidas com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa.”
Aquilo que propõe o documento aberrante, no seu artigo 11º, é isto: “A autoridade de saúde pode determinar a sujeição a controlo laboratorial ou a outros meios não invasivos de diagnóstico que permitam a identificação das pessoas afectadas pela doença ou das cadeias de transmissão de agente infeccioso.” Nem é necessário o consentimento da pessoa, é simplesmente compulsivo e arbitrariamente decidido pelas autoridades!
Estes são os exactos métodos utilizados pela tirania chinesa, passando inclusive por cima dos tratados internacionais subscritos pelo Estado português, como o artigo 6º da Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos, no seu nº 1, que convém saber, e ler em voz altissonante: “Qualquer intervenção médica de carácter preventivo, diagnóstico ou terapêutico só deve ser realizada com o consentimento prévio, livre e esclarecido da pessoa em causa, com base em informação adequada. Quando apropriado, o consentimento deve ser expresso e a pessoa em causa pode retirá-lo a qualquer momento e por qualquer razão, sem que daí resulte para ela qualquer desvantagem ou prejuízo”. Recordemo-nos que o artigo 8º da CRP diz-nos que os tratados internacionais subscritos pelo estado português vigoram no direito interno português.
Direito à identidade pessoal
Sabemos a ladainha do nº 1 do artigo 26º da CRP: “A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal…”. Porém, no artigo 12º do infame documento consta esta “prata de lei”: “O Governo pode determinar a obrigatoriedade do uso de equipamentos de protecção individual ou colectiva, que se revelem necessários como meio de contenção da doença, para o acesso, circulação ou permanência em determinados locais, inclusivamente em espaços públicos ou nas vias públicas.”
Enfim, querem obrigar-nos a usar fraldas faciais, uma e outras vezes mais, visando assim eliminar a nossa personalidade e criando uma atmosfera de terror e medo. Isto apesar de não existir qualquer evidência científica que as justifique, tal como indicado no documento da OMS de 1 de Dezembro de 2020, na sua página 10: “Actualmente são limitadas e variáveis as evidências científicas que corroboram a eficácia do uso de máscaras por pessoas saudáveis na comunidade com o intuito de prevenir a infecção por vírus respiratórios, incluindo o SARS-CoV-2.” É impressionante a permanente pressão para nos transformar numa autêntica manada sem individualidade.
Também podemos mencionar os 150 estudos científicos que provam a ineficácia das máscaras e do prejuízo que podem causar à saúde das pessoas. É insultuoso para a nossa inteligência denominá-las “equipamentos de protecção individual” como este documento o faz.
Direito a circular livremente
A possibilidade de circular livremente está inscrita nos Declaração Universal dos Direitos do Homem, no seu artigo 13º. Tem dois pontos, ditemos: “1. Toda a pessoa tem o direito de livremente circular e escolher a sua residência no interior de um Estado; 2. Toda a pessoa tem o direito de abandonar o país em que se encontra, incluindo o seu, e o direito de regressar ao seu país.”
A nossa CRP confirma este direito no artigo 44º. Convém citar, porventura: “1. A todos os cidadãos é garantido o direito de se deslocarem e fixarem livremente em qualquer parte do território nacional; 2. A todos é garantido o direito de emigrar ou de sair do território nacional e o direito de regressar.”
Ora, e o que propõe o infame anteprojecto? No nº 1 do seu artigo 31º, dispara: “O Governo pode, por modo adequado e indispensável à prevenção, à redução e eliminação dos riscos de disseminação ou ao controlo da doença que determinou a declaração da emergência de saúde pública, estabelecer: a) Limitações ou interdição de circulação de pessoas ou de veículos; b) Interdição de deslocações ou viagens; c) Proibição de permanência na via pública sempre que não se verifiquem motivos justificados; d) Fixação de cercas sanitárias; e) Evacuação de pessoas que se encontrem em local de elevado risco iminente ou efectivo para a vida ou saúde.”
Ao abrigo de restrições à circulação, no mesmo artigo 13º, também nos podem colocar uma vez mais em prisão domiciliária – retirar-nos a liberdade é uma obsessão dos autores do documento –, conforme se observa no nº 2: “O Governo pode determinar a obrigação de permanência na habitação, salvo se existirem motivos que justifiquem a ausência, nomeadamente por razões de saúde, imperiosos motivos de natureza familiar, exigências de trabalho, para aquisição de bens essenciais, ou por outro motivo relevante”.
O tempo de prisão domiciliária é também mais uma vez estabelecido de acordo com os caprichos dos tiranos no poder, ou dos seus lacaios de pantufas, mas seguindo o nº 3 do mesmo artigo 13º -ou seja, aplica-se a tal carta branca a favor do Executivo, a tal que a nota justificativa dizia querer evitar a todo o custo!
Direito de reunião e manifestação
Também podemos ainda recordar, porque a CRP ainda existe, outros direitos que nos assistem, nomeadamente os estabelecidos nos nº 1 e 2 do artigo 45º: “1. Os cidadãos têm o direito de se reunir, pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer autorização; 2. A todos os cidadãos é reconhecido o direito de manifestação”.
E então, o que propõe o infame documento? No seu nº 1 do artigo 13º, suspende-se este direito, assim desta simples forma: “De modo adequado e indispensável à redução e à eliminação do risco de disseminação de doença, o Governo pode estabelecer limitações de ajuntamentos de pessoas na via pública ou em lugar aberto ao público”.
Já estamos a ver o perigo que manifestações de “negacionistas” poderão constituir para a saúde pública; ou de sindicalistas, ou da oposição. Não há critério algum, apenas a total arbitrariedade, o poder infinito de eliminar as manifestações que se entendam “por desagradáveis”.
Direito a não ser discriminado
Sobre esta matéria, o nº 1 do artigo 26º da CRP acena-nos com direitos inalienáveis. Diz que qualquer cidadão tem “…protecção legal contra quaisquer formas de discriminação”. Mas isso é a CRP, um “papelucho” certamente sem importância perante um infame documento que nos quer salvar a vida, privando-nos de viver. No nº 1 do artigo 22º está prometido que “o Governo pode determinar, após parecer emitido pela Comissão Nacional de Protecção de Dados, a exigência de exibição de certificado ou teste, relativos a doença, agente infecioso ou a outro fenómeno que tenha fundamentado a declaração da emergência de saúde pública, para acesso a estabelecimentos, locais ou eventos, definindo as pessoas, as modalidades de habilitação e os serviços autorizados a verificar esses documentos”.
Todos sabemos que o certificado digital Covid nada certifica! Quem tomou vacina pode infectar e ser infectado; não protege ninguém a não ser, na melhor das hipóteses, a si próprio. Nem sequer é um certificado absoluto contra a morte, até porque os poros do papel em que é impresso são ainda maiores do que os das fraldas faciais. Os tratamentos genéticos experimentais contra a covid-19 nunca imunizaram as pessoas.
Recordemo-nos que jamais as pessoas foram discriminadas por tomarem ou não uma vacina contra a gripe, que, aliás, e muito bem, é recomendada pela DGS – sem qualquer coerção – a pessoas e grupos de risco.
Agora, ao arrepio da CRP, quer-se discriminar pessoas apenas por se recusarem a ser inoculadas com substâncias sobre as quais ainda não existem provas sólidas sobre os seus efeitos secundários a médio e longo prazo.
E mesmo que houvesse 100% de eficácia e 100% de segurança, por hipótese académica, nem a CRP nem o Código Penal português permitem que se discrimine qualquer pessoa, por qualquer motivo, de tomar uma decisão que não contrarie a sua vontade e autonomia sobre o seu corpo.
O corpo de qualquer pessoa não é pertença do Estado nem da sociedade – parece que muita gente se esqueceu destes sagrados direitos tão arduamente conquistados pelos nossos antepassados.
Mas o regime comunica todos os dias com crescente protérvia, menosprezando sistematicamente a inteligência das pessoas; o primeiro-ministro até nos diz para discutirmos este infame documento com serenidade! Ainda bem que o diz, porque a vontade é metê-lo já na trituradora.
Por outro lado, o nosso presidente – perito há mais de 40 anos em mexericos, tricas e conspirações – informa-nos que, por ele, o documento, pronto, “está bem”, mas, vá lá, faz-nos a vontade de comprar um selo, lamber a cola do sobrescrito e mandar o estafeta ao Palácio Ratton – leia-se, Tribunal Constitucional –, não haja por aí uns “chatos” – leia-se, cidadãos indignados por acharem que estavam numa democracia – que aborreçam o regime com processos judiciais. Enfim, bom, bom, para todos, incluindo o Professor Marcelo, era toda a gente comer e calar, sem liberdade.
O mais grave, é que este projecto-lei, a ser aprovado, será regulamentado em concreto por resoluções do conselho de ministros, que já são bem nossas conhecidas e pelas piores razões, ou seja, será o primeiro-ministro a decidir quem vai preso, por quanto tempo e para onde!?
Será o primeiro-ministro a decidir quais os estabelecimentos comerciais que encerrarão ao público e por quanto tempo!?
Será o primeiro-ministro quem decidirá quando cessa a emergência de saúde pública!?
Será o primeiro-ministro quem decidirá quantas pessoas poderão estar num restaurante, num centro comercial ou em qualquer outro lugar aberto ou mesmo… na via pública!?
Será o primeiro-ministro quem decidirá qual o cidadão que terá de exibir certificado ou teste para acesso a estabelecimentos, locais ou eventos, ou seja, decidirá quem poderá frequentar um cinema, um restaurante, um estádio de futebol, um ginásio ou talvez, quem sabe, frequentar uma praia!?
“Reflexão final”
A Lei nº 34/87, respeitante aos crimes da responsabilidade de titulares de cargos políticos, diz no seu artigo 9º que “o titular de cargo político que, com flagrante desvio ou abuso das suas funções ou com grave violação dos inerentes deveres, ainda que por meio não violento nem de ameaça de violência, tentar destruir, alterar ou subverter o Estado de direito constitucionalmente estabelecido, nomeadamente os direitos, liberdades e garantias estabelecidos na Constituição da República, na Declaração Universal dos Direitos do Homem e na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, será punido com prisão de dois a oito anos, ou de um a quatro anos, se o efeito se não tiver seguido.”
A tentativa de crime, como sabemos, costuma ser punida, mesmo se em menor grau.
Sendo assim, temos uma pergunta final: no decurso deste anteprojecto de lei e da sua “libertação” pelo Conselho de Ministros, estará já a PGR a instruir um processo-crime por tentativa de golpe de Estado?
Luís Gomes é gestor (Faculdade de Economia de Coimbra) e empresário
João Pedro César Machado é advogado
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