Por recusar publicar um direito de resposta da Igreja Universal do Reino de Deus em 2017, por um conjunto de investigações jornalísticas de rigor questionável, a TVI vai ter de abrir os cordões à bolsa. É a primeira vez que um tribunal judicial aplica este tipo de sanção a um órgão de comunicação social de âmbito nacional..
A TVI e o seu antigo director de informação, Sérgio Figueiredo, foram condenados a indemnizar a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) em quase 70 mil euros, numa decisão inédita nos tribunais portugueses. O desfecho resulta de um longo processo que teve início há mais de quatro anos, após a estação televisiva do Grupo Media Capital – também detentora da CNN Portugal – ter recusado transmitir o direito de resposta da IURD sobre uma série de 17 reportagens intitulada O segredo dos deuses, transmitida entre Dezembro de 2017 e Junho de 2018.
A investigação jornalística de Alexandra Borges e Judite França, denunciava uma suposta rede internacional de adopções ilegais e rapto de crianças alegadamente montada por aquela instituição religiosa. Num dos referidos episódios, o então director Sérgio Figueiredo chegou mesmo a apelidar a IURD como uma “associação de malfeitores e criminosos”.
Por danos não patrimoniais, os réus foram condenados pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste ao pagamento de 50 mil euros, satisfazendo o pedido da IURD, tendo o juiz Miguel Raposo determinado ainda uma indemnização de 18.500 euros a título de danos patrimoniais. Inicialmente, a lesada requerera um total de 99.105 euros, tendo esse valor sido depois ampliado para 125.673. Respeitante a danos patrimoniais, foram alegadas despesas com assessoria jurídica e também os custos do texto de resposta (pagando) em outros meios de informação.
Recorde-se que o impacte da transmissão destas reportagens foi então muito significativo, tendo mesmo suscitado intervenções do Ministério Público e até petições para o encerramento das actividade da IURD em Portugal. Fundada em 1977 no Brasil, a IURD chegou a Portugal em 1989.
A sentença do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, datada de 12 de Julho passada, destaca que a TVI nunca quis reconhecer o direito de resposta, argumentando “falta de legitimidade para o exercício do direito, intempestividade e ausência de relação directa e útil entre as referências feitas nas reportagens e grande parte do afirmado nos textos de resposta”.
Curiosamente, apesar de ter sempre refutado as acusações e caracterizado a reportagem como “manifestamente falsa”, à IURD foi inicialmente negado o direito de resposta pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) em 2018. Mas, em Fevereiro de 2020, após uma intimação favorável à queixosa, o regulador foi obrigado a alterar a sua deliberação inicial. Porém, a estação televisiva só acatou a decisão em Julho daquele ano, um “capricho” que lhe custou uma sanção pecuniária no valor de 500 euros por cada dia de atraso, conforme o previsto nos Estatutos da ERC para crimes de desobediência.
Embora a TVI e Sérgio Figueiredo possam ainda recorrer da sentença, esta terá sido a primeira vez que um Tribunal condena um órgão de comunicação social a pagar uma indemnização no seguimento da recusa da emissão do direito de resposta.