Estátua da Liberdade

Globalismo: a nova tirania

Statue of Liberty in New York City under blue and white skies

por Luís Gomes // Agosto 21, 2022


Categoria: Opinião

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A revolução luterana de há 500 anos não trouxe apenas o Estado Absoluto, também demoliu a visão comum que mantinha a sociedade unida. Cada indivíduo era agora capaz de interpretar as Sagradas Escrituras, em lugar de um intermediário que passava anos a estudar, enquadrada por uma instituição milenar. Cada um tinha agora uma opinião sobre a sociedade: a ideologia.  

Eu não me adapto à realidade, onde existem fraquezas humanas, como o vício do jogo, a miséria moral ou a assimetria de informação – por exemplo, a relação entre um médico e um paciente, onde nem sempre o segundo questiona sobre os medicamentos receitados pelo primeiro –, a realidade é que tem de adaptar-se à minha visão sobre a sociedade.  

brown wooden cross on brown wooden wall

Tudo isto foi ajudado por uma revolução no pensamento. Tivemos Descartes que afirmou: “tudo que vemos, sentimos, tocamos, pode ser fruto de nossa imaginação, não existindo realmente. Apenas o pensamento tem força e prova de verdade”. Aquilo que está dentro da cabeça do homem é de alguma forma mais verdadeiro do que a sua percepção da realidade.  

Um século depois, Kant reforçou a revolução mental original de Descartes, afirmando que, embora não possamos ter certeza se temos dois braços, ou se é frio ou quente, escuro ou ensolarado fora de nossa mente, a Razão é universal; isto é, se as pessoas pensarem bastante em qualquer coisa, chegarão às mesmas conclusões. As ideias tornaram-se mais verdadeiras do que a vida real. A era das ideologias tinha começado.  

As ideologias são por natureza projectos universais. Todos os homens devem ter uma igual condição económica (Marx); Os melhores devem governar as massas (tecnocracia). Apenas há lugar na sociedade para determinadas raças (Nacional Socialismo); A sociedade deve abandonar os carros (Globalismo); Não há lugar na nossa sociedade para não vacinados (Covidismo). 

Todos os homens têm o seu lugar na sociedade e têm que chegar lá para que as coisas funcionem tal como prescrito pela realidade ideológica, mesmo que o “lugar apropriado” de algumas pessoas seja o Gulag, Auschwitz ou mesmo um campo de “concentração para não vacinados na Austrália”.  

Pode parecer que a revolução individualista foi desfeita pela chegada do pensamento ideológico universalizante; a visão de mundo comum que orientou a nossa civilização foi abalada pelo individualismo da primeira Modernidade, apenas para ser substituída por um novo universalismo ideológico.  

Para São Tomás de Aquino, a bondade é a verdade, e a verdade significa que o que está dentro das nossas cabeças (ideias, noções, percepções) coincide com o que está fora (a própria realidade). Para qualquer ideólogo é o contrário: a “bondade” é ter a própria realidade de acordo com o que está dentro da cabeça, a ideologia que ele adopta.  

Em lugar de testar sua percepção contra a realidade, os ideólogos julgam a realidade contra a sua ideologia, “mais verdadeira que a própria realidade”. Ao lidar com qualquer fenómeno social, partem sempre das premissas da sua ideologia.  

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Todas as ciências foram tocadas pela ideologia, até a Economia. Tivemos Keynes, um estatístico que inventou a macroeconomia, inaugurando a gestão de agregados – o consumo agregado, a despesa agregada, o investimento agregado – e retirando a acção humana individual da equação. Todas as mentiras e dissonâncias são possíveis, facilitando a propaganda de Estado e abrindo caminho a uma enorme burocracia encarregue de forçar a ideologia sobre a sociedade. 

Os bancos centrais emitem dinheiro para estimular a economia. Um indivíduo falsifica dinheiro. Os primeiros actuam em nome do bem, da ideologia. O segundo tem como destino o calabouço. 

Os bancos centrais compram obrigações soberanas para reduzir os encargos com juros dos governos, provocando a redução dos juros e a subida do preço dessas obrigações. Como tem informação privilegiada, um indivíduo compra acções da empresa XYZ, dado que tem conhecimento de uma iminente subida do seu preço em bolsa. Os primeiros estão a ajudar o governo a realizar um estímulo fiscal. O segundo está a manipular preços, devendo ser detido pela prática de “inside trading”. 

O Estado encerra um restaurante em nome do combate a uma pandemia com uma taxa de sobrevivência de 99%, está a evitar a “morte de milhões”. O segundo deverá ir à ruína e esperar em casa por uma esmola, se alguma vez chegar. 

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O principal problema do pensamento ideológico é que ele é literalmente a adoração de uma fantasia. As fantasias são coisas que não existem no mundo real, apenas existem dentro das nossas mentes; acreditar no que está dentro da cabeça ao invés de sentidos mentirosos é o ponto de partida do pensamento ideológico.  

O seu segundo problema é que as ideologias não permitem o elemento mais essencial na sociedade humana, a natureza humana. Se lermos uma história escrita há centenas ou milhares de anos, veremos os homens a agir tal como agem hoje, sofrendo pelas mesmas causas, buscando os mesmos prazeres, caindo nas mesmas tentações – o vício do jogo, por exemplo – e assim por diante. O homem não muda e, embora cada homem seja diferente de todos os outros, em certo nível todos os homens são iguais. 

Aos estarmos cegos para a natureza humana, os ideólogos sempre caem na mesma armadilha universalizante. Eles podem ser ideólogos de visão única, como neoliberais ou comunistas, ou podem acreditar que os não vacinados são seres inferiores, que merecem ser ostracizados pela sociedade; no final, todos eles tratam toda ou pelo menos grandes áreas da Humanidade como se todos os homens fossem clones do que eles vêem no espelho. 

Eles estão sempre optimistas sobre como as pessoas se vão comportar, eles sempre assumem que todos querem e valorizam exactamente as mesmas coisas que eles.  

woman in black and white tank top leaning on wall

Regra geral, estes “loucos” necessitam da violência de Estado para imporem a sua versão da realidade aos demais. Ou detêm poder efectivo sobre o Estado ou conseguem influenciar quem o detém.  

Estamos agora na etapa final da revolução protestante: uma ideologia global imposta sobre toda a humanidade, imposta através de instituições globais, como a OMS e os Bancos Centrais. Os “loucos” não se importam com a realidade, afinal apenas querem o nosso bem, até dizem: “Não terás nada e serás feliz!” 

Luís Gomes é gestor (Faculdade de Economia de Coimbra) e empresário


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