Agosto com recorde de óbitos (desde 2014)

Mortes de adolescentes e jovens adultos em forte tendência crescente desde Outubro

silhouette photo of six persons on top of mountain

por Pedro Almeida Vieira // Setembro 3, 2022


Categoria: Exame

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Agregando em Portugal cerca de um milhão de pessoas (10% da população), os adolescentes e jovens adultos da faixa dos 15 aos 24 anos estão na “flor da vida” e são raras aqueles que se deixam levar pela morte, socialmente bastante sentidas. A pandemia da covid-19 não teve qualquer impacte directo neste grupo etário, mas algo está a suceder para que se esteja com um desvio de 22% da mortalidade face à média (2017-2021). Além disso, os números da mortalidade estão em tendência crescente desde o Outono passado. Agosto foi o mês mais letal desde que há registos diários (a partir de 2014). O Governo sobre nada disto fala.


Agosto de 2022 foi o mês mais mortífero para os adolescentes e jovens adultos, da faixa etária dos 15 aos 24 anos, desde que o Sistema de Informação dos Certificados de Óbito (SICO) começou a carrear informação detalhada, em 2014.

De acordo com a análise do PÁGINA UM, no mês de Agosto, terminado na passada quarta-feira, contabilizaram-se 45 óbitos, tendo havido mesmo três dias (7, 10 e 22) em que se registaram quatro mortes neste grupo etário.

A taxa de mortalidade nestas idades – abrange cerca de um milhão de pessoas – é extremamente baixa, mas certo é que, desde 2014, somente outros dois meses (Janeiro de 2017 e Julho de 2020, ambos com 43 óbitos) tinham ultrapassado a trágica fasquia dos 40 óbitos.

silhouette of jumping people

Porém, mais do que esse recorde, que poderia ser fruto da conjugação de diversos infortúnios, o passado mês de Agosto enquadra-se numa tendência crescente de mortalidade nesta faixa etária que se iniciou em Outubro do ano passado, sem mostrar sinais de inversão.

Actualmente, considerando a evolução da média móvel da mortalidade anual – ou seja, o somatório dos óbitos nos últimos 12 meses anteriores –, Agosto de 2022 está num pico e sem dar sinais de abrandamento: 360 óbitos. Há um ano, em Agosto de 2021, encontrava-se nos 304.

Em Outubro do ano passado chegou aos 297, mas a partir daí tem estado sempre a subir, mostrando uma evolução preocupante. A mortalidade acumulada nos oito meses de 2022 está cerca de 22% acima da média de 2017-2021, conforme divulgou ontem o PÁGINA UM.

Evolução da mortalidade anual (12 meses) desde Dezembro de 2014 até Agosto de 2022 na faixa etária dos 15 aos 24 anos. Fonte: SICO. Análise: PÁGINA UM.

Embora não haja um padrão sazonal de mortalidade para esta faixa etária – como sucede com os mais idosos, onde as doenças de maior letalidade “atacam” mais no Inverno –, antes da pandemia a evolução da mortalidade anual manteve-se relativamente estável entre os 300 e os 355 óbitos.

Com a chegada do SARS-CoV-2, observou-se de imediato um acréscimo na evolução da taxa de mortalidade anual, que passou de 301 óbitos em Fevereiro de 2020 para 345 em Outubro daquele ano.

No entanto, jamais se pode argumentar que se deveu directamente à covid-19. Até Outubro de 2020 apenas tinha falecido uma pessoa com covid-19 na faixa etária dos 20 aos 29 anos. Na verdade, a hipótese mais provável será o efeito da fuga aos hospitais nos primeiros meses da pandemia ou o agravamento de determinadas doenças ou problemas que afectam mais esta faixa etária.

Mortalidade acumulada até Agosto nos anos de 2014 a 2022 na faixa etária dos 15 aos 24 anos. Fonte: SICO. Análise: PÁGINA UM.

Causas concretas ignoram-se, porque as causas de morte discriminadas para 2020 nesta faixa etária não se encontram disponibilizadas de forma inteligível pelo Instituto Nacional de Estatística, e o Eurostat somente tem dados detalhados da mortalidade sobre Portugal até ao ano de 2019.

Em todo o caso, a partir de Outubro de 2020, a mortalidade nos adolescente a partir dos 15 anos e jovens adultos até aos 24 anos teve uma evolução bastante favorável, a caminho de uma situação normal. Em Junho de 2021, a taxa de mortalidade anual encontrava-se num valor bastante baixo (294), mantendo-se num nível estável (e reduzido) até Outubro. A partir daí, não parou a mortalidade nesta faixa etária de subir.

Causas de morte (por grupo segundo o CDI da OMS) na faixa etária dos 15 aos 24 anos em Portugal nos anos de 2014 a 2019. Fonte: Eurostat. Análise: PÁGINA UM.

Todas as especulações sobre esta inusitada subida para níveis recorde são possíveis, porque, na verdade, o Ministério da Saúde mantém a recusa em disponibilizar os dados do SICO de 2020, 2021 e 2022 para conhecer quais foram as causas dos óbitos, o que permitiria, no caso do grupo etário dos 15 anos 24 anos, conhecer com rapidez quais os maiores desvios, através da comparação com anos anteriores.

Saliente-se que, de acordo com os dados do Eurostat, entre 2014 e 2019, os acidentes de transporte foram a primeira causa de morte na faixa etária dos 15 aos 24 anos, mas apesar de se considerar que tem um peso muito relevante, representam porém apenas 24,8% do total (465 óbitos em 1.877). Bastante relevantes são as neoplasias que, apesar de raras nestas idades, são a causa de morte em 16,1% dos óbitos totais, seguindo-se os suicídios com 11,2%

Acima dos 5%, estão as doenças do sistema nervoso (9,4% do total), do sistema circulatório (6,8%) e as quedas, afogamentos e outros acidentes (6,1%).


N.D. O PÁGINA UM considera fundamental que o Ministério da Saúde revele os dados das causas de morte registadas no SICO, uma vez que permitem, de forma rápida, identificar os desvios que estão a ocorrer tanto no grupo etário dos 15 aos 24 anos como nos idosos, sobretudo a partir dos 85 anos. A manutenção de um injustificável obscurantismo, além de constituir uma inaceitável postura antidemocrática, possibilita todo o tipo de especulações. É a falta de informação fidedigna do Governo que, infelizmente, tem promovido a desinformação. O PÁGINA UM tem processos de intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa no sentido de obrigar tanto o Ministério da Saúde como a ACSS a disponibilizar o SICO e a base de dados da morbilidade e mortalidade hospitalar.

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