OPINIÃO
Setembro, um mês à direita da direita
Em Setembro, a Europa democrática viu-se confrontada com duas eleições com resultados aparentemente inesperados.
Na Suécia, a coligação de centro e extrema-direita conseguiu 176 lugares no Parlamento, 73 destes preenchidos pelo SD (partido de extrema-direita) que convenceu 20% do eleitorado, tornando-se assim na segunda força política do país. É uma eleição histórica uma vez que nunca um Governo sueco foi composto por partidos desta natureza.

Em Itália as ideologias extremistas foram ainda mais longe, e o partido Irmãos de Itália (FDI) elegeu uma primeira-ministra, em coligação com Salvini e Berlusconi. Dos 50 milhões de votantes, esta “geringonça” obteve 43% dos votos, com cerca de 26% para Meloni e o restante dividido entre os dois outros partidos. Ainda assim a ascensão de Meloni é também o declínio de Salvini, o que indica que nem tudo são rosas no seio do eleitorado extremista. ↓
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Se os casos acima mencionados são os mais gritantes, por serem os que já chegaram ao poder, importa ainda lembrar a subida do partido de Le Pen, na França, que chegou à marca dos 41%, e até no caso português. Apesar de números ainda escassos, o Chega é já a terceira força política portuguesa com 7% do eleitorado.
Importa entender o motivo do avanço destas ideias dentro de um espaço comunitário, inclusivo, humanista e colaboracionista como a Europa pretende ser.
Em primeiro lugar, destaque-se que os programas eleitorais e os manifestos destes partidos são, grosso modo, bastante idênticos. Se, por um lado, apelam a elementos de coesão social como os valores de Deus, pátria, e família, fazem-no através dos pânicos morais exacerbados que surgem em forma de ameaça a um pretenso bem-estar. Estes medos, que na era das redes sociais ganham uma carga viral, contêm uma mensagem simples e com setas apontadas.

Para eles, a culpa é dos estrangeiros, dos homossexuais, dos políticos corruptos – e estes partidos vendem-se como diferentes. Apregoam frases e entoações cuja digestão é bem recebida e, como no caso de Donald Trump, conseguem manipular a opinião de algum público ao ponto de conseguirem fazer-se passar por homens e mulheres do povo contra as elites.
Mais perto, dentro da realidade portuguesa, essa dicotomia das elites versus o povo é um grito utilizado por André Ventura que ironicamente (ou não) é apoiado e financiado por, imagine-se… as elites.
Qual é então o falhanço dos valores europeus que têm vindo a dar lugar a plataformas radicais e populistas?
No caso da Suécia e Itália – e, por mais simples que possa parecer –, a subida do eleitorado extremista estará ligado à crise migratória de 2015. Estes dois países abriram as suas fronteiras a refugiados sem gestão da narrativa moderada e inclusiva.

Não é de estranhar o aproveitamento dos extremistas perante um vazio de mensagem humanista. E é fácil, razoável até, mais ainda no caso da Itália – cuja Economia é bastante mais fraca do que a sueca –, perguntar onde estava o apoio financeiro e logístico da Europa às constantes ondas de refugiados a entrar nos seus portos. A consequência disso leva inevitavelmente à pergunta mais simples e também perigosa, que é: e nós?
A proliferação do sentimento anti-europeu torna-se num comboio a alta velocidade e, perante a falha dos moderados e a demora de implementações práticas perdidas nas burocracias do Parlamento Europeu, cria-se o sentimento que nada é feito. Um básico, “Falam, falam, mas não fazem nada”.
É assim que se criam e recriam estes movimentos. Eles não são novos, mas adaptam-se aos tempos. Veja-se o caso das lideranças. Meloni, Le Pen e a alemã Alice Weidel são mulheres. Talvez a líder francesa seja menos surpreendente, porque vem de uma família política e tem já essa tradição.
No entanto, a futura primeira-ministra italiana e líder extremista alemã são já um apelo ao voto feminino que, normalmente, não vota em partidos vistos como patriarcais e conservadores.

Curiosamente, estas políticas de carreira são consequência das lutas progressistas de esquerda pela igualdade de acesso a posições de liderança, que agora são aproveitadas pela extrema-direita para se capitalizar e captar eleitorado.
O espaço das ideias extremistas está conquistado e não irá diminuir enquanto for subestimado ou insultado. Ele só pode ser derrotado em sede de ideias. A estas ideias tem de lhes ser emprestado um novo léxico, uma forma de desmascarar o extremismo pelo que ele é. A manipulação da carga emocional de pequenos e grandes grupos e o vazio de soluções.
E será (extremamente) necessário que esse combate seja feito com a apresentação de soluções humanistas, sustentáveis, mas de rápida aplicação.
Como diz Marcelo Rebelo de Sousa, o povo tem sempre razão.