ENTIDADE REGULADORA PARA A COMUNICAÇÃO SOCIAL ABRE PROCESSO

Lei do Tabaco: publicidade encapotada já “queima” o jornal Público

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A publicação de um conteúdo comercial da Tabaqueira, elogiando o tabaco aquecido, e que coincidiu com o lançamento de um novo sistema daquela empresa, levou a Entidade Reguladora para a Comunicação Social a instaurar hoje um “procedimento” contra o Público. A multa pode atingir os 250 mil euros.


A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) decidiu instaurar um “procedimento” contra o Público por violação da Lei do Tabaco que pode resultar na aplicação de uma coima até 250 mil euros. A informação foi confirmada esta tarde ao PÁGINA UM – que revelara essa ilegalidade na quarta-feira passada – pelo Departamento de Supervisão do regulador, que informa também que “a publicação periódica Público foi notificada, nesta data [hoje], para pronúncia sobre os factos descritos”.

Em causa está a publicação no diário da Sonae, na sexta-feira da semana passada, de um conteúdo comercial da Tabaqueira que promove o consumo de tabaco aquecido e elogia este produto, citando várias vezes o director-geral da empresa, Marcelo Nico, que chegou a destacar o lançamento da “última tecnologia” que começou a ser vendida a partir do dia 4 deste mês.

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A publicidade aos produtos de tabaco em toda a imprensa, de forma directa ou indirecta, está proibida desde 2005, embora nas televisões e rádios remonte a 1980. Outras restrições em termos de divulgação de marcas, incluindo em provas desportivas, foram sendo implementadas a partir daquele ano.

O conteúdo não-jornalístico – que antes se denominava publireportagem – pago pela Tabaqueira ao Público termina mesmo com uma foto claramente de carácter publicitário, apresentando o novo sistema de tabaco aquecido por indução IQOS Iluma, a aposta da Philip Morris neste sector, e que começou a ser comercializado no dia 4 deste mês.

O texto do conteúdo pago aceite pelo Público começa por anunciar que “o tabaco de combustão deverá ter os dias contados”, mas que “são cada vez mais as alternativas que surgem no mercado e que têm como objectivo diminuir o seu consumo, substituindo-o por opções menos nocivas e com a sua eficácia comprovada cientificamente”, adiantando ainda que causa “alguma estranheza” que seja a Tabaqueira a fazer “este esforço”.

Na semana em que lançou o seu novo sistema de tabaco aquecido, a Tabaqueira conseguiu publicar um conteúdo comercial no Público a elogiar a nova tecnologia por si desenvolvida.

O director-geral da Tabaqueira, o argentino Marcelo Nico, surge também sempre a transmitir uma atitude de autoridade em matéria científica, de que é exemplo a seguinte afirmação: “É uma tecnologia [referindo-se implicitamente ao IQOS Iluma] com menos cheiro, que não necessita de limpeza, que é mais intuitiva, e que resolve alguns dos problemas encontrados pelos utilizadores de tabaco aquecido. Podemos afirmar que a nossa empresa, hoje, é caracterizada pela ciência, pela tecnologia e pela inovação. E a tecnologia é, sem dúvida, o que distingue esta nova geração”.

Saliente-se que a lei define “publicidade ao tabaco” como “qualquer forma de comunicação feita por entidades de natureza pública ou privada, no âmbito de uma actividade comercial, industrial, artesanal ou liberal, com o objetivo directo ou indirecto de promover um produto do tabaco ou o seu consumo”.

Além da questão da publicidade proibida, as alegadas vantagens do tabaco aquecido não estão provadas. Por exemplo, em 2 de Abril de 2019, uma dúzia de sociedades científicas – incluindo as Sociedades Portuguesas de Pneumologia, de Cardiologia, de Oncologia, de Pediatria, de Estomatologia e Medicina Dentária, de Medicina Interna, de Medicina do Trabalho e de Angiologia e Cirurgia Vascular – emitiu uma posição extremamente crítica sobre os produtos de tabaco aquecido, relembrando que contêm à mesma “nicotina, substância altamente aditiva que existe no tabaco, causando dependência nos seus utilizadores, para além de estarem presentes outros produtos adicionados que não existem no tabaco e que são frequentemente aromatizados”

A ERC vem agora dizer que, “em virtude da análise prévia do referido artigo [conteúdo pago da Tabaqueira], considera-se que os factos alegados poderão constituir violação” da denominada Lei do Tabaco. A coima está compreendida entre um mínimo de 30 mil e um máximo de 250 mil euros, além de eventuais sanções acessórias. O valor pode vir a ser aplicado tanto ao Público como à Tabaqueira.

O PÁGINA UM tentou obter um comentário do director do Público, mas não obteve resposta.

Também contactada a Tabaqueira, não houve sequer interesse em passar o telefonema para o gabinete de comunicação desta empresa. A comunicação electrónica, entretanto enviada pelo PÁGINA UM para o endereço geral da Tabaqueira, questionando se a empresa iria suspender este tipo de publicidade, ainda não teve qualquer reacção.

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