Título
Consumidos pelo fogo
Autor
JAUME CABRÉ (tradução: Maria João Teixeira Moreno)
Editora (Edição)
Tinta da China (Setembro de 2022)
Cotação
15/20
Recensão
Autor do romance Eu confesso (2015), do livro de contos Quando a penumbra vem (2019) – também publicados pela Tinta-da-China – e de outros romances e guiões, Jaume Cabré é um dos escritores catalães mais conceituados e consagrados da atualidade. Terá sido com As vozes do rio Pamano (2004) que o autor terá ganhado maior visibilidade em Espanha e a nível internacional – já traduzido em 12 línguas.
Neste Consumidos pelo fogo, Jaume Caubré conta-nos a história de Ismael, um professor de literatura e línguas, cuja existência rotineira e monótona é resultado de uma escolha. O enredo surrealista, e até metafísico, começa quando Ismael é despedido pela directora da escola, tão-só por ter tomado a liberdade de dar um poema catalão aos seus alunos, em vez de se limitar a abordar a literatura espanhola.
O professor não se transforma na barata de Kafka, mas a sua condição é a de uma falena, borboleta nocturna, que paira numa existência absurda. A rotina, depois de quebrada, transforma-se numa viagem ziguezagueante entre o futuro ausente, um presente inverosímil e uma infância infeliz – o pai chegou a lançar-lhe gasolina.
O retorno à infância acontece por intermédio de um encontro com uma antiga vizinha, Leo. Foi numa retrosaria, onde entrou para comprar um botão de camisa. Voltou à loja dois dias depois e, no seguinte, Leo já estava em sua casa. A felicidade parecia quase alcançada.
Mas Ismael é como que sequestrado por um antigo aluno que lhe pede ajuda para uma tradução.
O professor de literatura nem tempo teve para sentir o que lhe parecia uma nova existência. Acorda num hospital sem memória, após um acidente de carro, no qual é dado como morto. “Chamem-me Ismael”, assim responde a uma das muitas questões nesse estranho hospital.
A história das peripécias de Ismael acontece, em paralelo, com as de uma família de javalis. A cria mais nova perde-se, como se perde Ismael, nos meandros dos sonhos e das memórias de infância. Caos, confusão, absurdo, são algumas das palavras-chave do enredo complexo que Jaume Cabré constrói, provocando o leitor, como que o “obrigando” ao exercício da reconstrução de uma narrativa fantástica, caracterizada pela velocidade dos acontecimentos.
Ao resgatar alguns clássicos, uns mais explícitos, outros de forma mais subtil, o autor consegue algo original e, ao mesmo tempo, desconcertante.