Recensão: Cidade participada: Arquitectura e Democracia - Algarve

Um murro na mesa! E que não nos falhe a memória

por Mariana Santos Martins // Novembro 23, 2022


Categoria: Cultura

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Título

Cidade participada: Arquitectura e Democracia - Algarve

Autores

MIGUEL REIMÃO COSTA e ANA ALVES COSTA (coordenação)

Editora (Edição)

Tinta da China (Agosto de 2022)

Cotação

15/20

Recensão

Para o povo, sobre uma bem sucedida acção democrática, e decididamente a dedicatória merecida aos Índios da Meia Praia e a todos os algarvios, o quarto livro da colecção da editora Tinta da China sobre o Serviço de Apoio Ambulatório Local (SAAL) em Portugal dedica-se ao caso de estudo das operações na região do Algarve.

Imortalizada com amor na música de Zeca Afonso, para que sintamos o carinho que movia a revolução:

Eram mulheres e crianças, cada um com seu tijolo, isto aqui era uma orquestra, quem diz o contrário é tolo!

Este livro, como a sua colecção, deixa um valioso testemunho e levantamento, nesta edição compilando as intervenções para quatro bairros: o Bairro do 25 de Abril na Meia Praia, em Lagos, de José Veloso; o Bairro da Associação Progresso, em Silves (estes dois apresentados por Vítor Ribeiro); o Bairro 11 de Março, em Olhão, de José Maria Lopes da Costa (apresentado por Ana Alves Costa); e o Bairro 1.° de Maio, em Tavira, de João Moitinho (apresentado por Miguel Reimão Costa).

Está apresentado de uma forma bela e leve, para leitores fora das disciplinas da Arquitectura e Urbanismo, com as notas de rodapé relegadas para o final do livro, para facilitar a leitura e depoimentos essenciais de José Baptista Alves (capitão da Força Aérea e director nacional do SAAL de 1975 a 1976), José Veloso (arquitecto e coordenador de 16 bairros), José Maria Lopes da Costa (arquitecto do Bairro 11 de Março), João Luís Correia (operário, sócio e director de obra da associação desse mesmo bairro), Manuel Dias (coordenador da equipa em Albufeira, Loulé e Olhão), António da Cunha Telles (realizador), e as palavras de José Afonso (quem mais poderia ser?) sobre a sua prestação lírica para o filme "Continuar a viver ou os Índios da Meia Praia" e com "(...) uma denúncia ao actual processo capitalista que se está a viver e ao crime que foi a extinção do SAAL (...)".

Paulo Varela Gomes apresenta-nos esta "Revolução com um grão de SAAL", texto original do livro História da Arte Portuguesa (terceiro volume) com "Arquitectura nos últimos vinte e cinco anos" de Paulo Pereira, onde nos é dado logo de início um contexto essencial a esta curadoria centrada regionalmente mas com seu escopo nas intervenções doutras regiões de Portugal, sendo o caso algarvio o de maior sucesso.

Com registo fotográfico e documental dos cartazes e ilustrações da época, artigos de jornal e boletins das associações de moradores, até às fichas de inscrição e inquérito às condições de alojamento dos mesmos e livros de registo de serviços prestados e, claro, o espólio documental de desenhos, maquetes, plantas, cortes e alçados dos diferentes bairros.

Tudo a acompanhar reflexões importantes a que não falta a participação também de Alexandre Alves Costa.

Para destaque, devo fazer menção a um subcapítulo final de Manuel Dias, intitulado "Quando a democracia representativa impôs o recolher obrigatório à democracia participativa". É um murro na mesa, que nos relembra a todos o que foi aquela realidade, como ficou ela enterrada em papéis e política, como foi afogada e morreu na praia por ideologias.

Pois nada apaga a nobreza dos índios da Meia-Praia.

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