ENQUANTO ELON MUSK SE MOSTRA "INSPIRADO" COM O NOVO AMOR DA IMPRENSA MAINSTREAM PELA LIBERDADE DE EXPRESSÃO

#TwitterFiles: FBI tinha na rede social uma “subsidiária” para censurar contas

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por Maria Afonso Peixoto // Dezembro 17, 2022


Categoria: Imprensa

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São cada vez mais preocupantes, num mundo que se quer democrático, e com liberdade de expressão, as revelações de mais um episódio dos #TwitterFiles, que mostram, em concreto, as interferências de organismos governamentais norte-americanos com política própria de censura. Na sexta série de documentos sobre as práticas da anterior administração desta rede social, ficou-se a saber que o FBI punha e dispunha do Twitter, como se fosse uma sua “subsidiária” para suspender contas por delitos de opinião, mesmo se fossem sátiras. Paradoxalmente, enquanto a imprensa mainstream quase ignora esta revelações, Elon Musk está a enfrentar um coro de críticas por suspender contas de jornalistas que insistiram em fazer doxxing, ou seja, revelar a localização exacta do avião do novo dono do Twitter.


Enquanto a imprensa mainstream vocifera contra Elon Musk por ter suspendido temporariamente contas de jornalistas norte-americanos que revelaram a localização online do seu avião, continuam as revelações bombásticas sobre os procedimentos da anterior administração do Twitter. Ontem mesmo o novo dono da rede social já tinha feito um tweet comentando a divulgação da sexta série dos #Twitter Files, novamente a cargo do jornalista independente Matt Taibbi, com um “KABOOM”, seguido de ícones de cinco explosões.

E, de facto, não é caso para menos. As revelações são mesmo bombásticas – ou seria, num período normal de imprensa livre e comprometida apenas com a verdade: segundo os documentos agora revelados, após as eleições presidenciais norte-americanas de 2016, o FBI e o Twitter desenvolveram uma estreita “parceria”, que aparentava mais do que uma colaboração, abarcando frequentes pedidos daquela agência governamental para que a gigante tecnológica tomasse providências em relação a contas que alegadamente partilhavam “desinformação” em períodos eleitorais. Porém, mais na linha dos democratas do que na dos republicanos.

Elon Musk, novo dono do Twitter, tem estado a divulgar documentos internos da rede social que provam as antigas práticas de censura da empresa. Vozes do lado político mais conservador eram visadas pela censura, tal como cientistas de topo que se mostraram contra as medidas de alegado combate à covid-19.

E nem mesmo os posts e contas de sátira e humor, independentemente de terem muitos ou poucos seguidores escapavam à censura na rede social para satisfação do FBI.

Matt Taibbi afirma, nos tweets que começou a revelar ontem à noite, que estes contactos eram feitos de um modo tão “constante e generalizado” que o Twitter se comportava como uma “subsidiária” do FBI.

Exemplifica: “Entre Janeiro de 2020 e Novembro de 2022, houve mais de 150 e-mails entre o FBI e o ex-chefe de Confiança e Segurança do Twitter, Yoel Roth”, acrescentando que uma grande parte destas comunicações eram advertências sobre alegadas violações das regras da rede social por parte dos utilizadores devido à difusão de desinformação eleitoral.

Para além do FBI, a antiga administração do Twitter recebia ainda relatórios de outras agências governamentais que alertavam para conteúdos que constituíam alegada “desinformação”, incluindo uma chancela criada pelo denominado Centro para a Segurança na Internet, uma organização que actuava em parceria com o Departamento de Segurança Interna (DHS, na sigla em inglês).

No caso do FBI, Matt Taibbi explicou que a agência governamental começara por criar uma pequena task-force direcionada para as redes sociais – designada por FTIF – após as eleições presidenciais de 2016, quando Donald Trump derrotou a democrata Hillary Clinton. Essa “equipa”, porém, evoluiu para 80 agentes, que passaram a manter contacto com o Twitter, de modo a “identificar alegadas influências externas e quaisquer formas de interferência nas eleições”. E a actuar, claro.

Logo em 5 de Novembro daquele ano, através de um e-mail, o Departamento de Comando de Eleições Nacionais (NECP na sigla em inglês) do FBI enviou ao Twitter uma longa lista de contas que, supostamente espalhavam desinformação sobre as eleições intercalares, e que, segundo sugeria, poderiam justificar “acções adicionais” por parte da rede social. Desta lista constava, por exemplo, a conta do actor Billy Baldwin, irmão de Alec Baldwin. A rede social respondeu prontamente, informando o FBI das providências tomadas. Hoje mesmo este actor norte-americano veio ironizar sobre a acção do FBI em silenciar a sua liberdade de expressão. “Isso é o trabalho de Elon Musk”, atirou.

Matt Taibbi também diz não ter dúvidas, com base nos documentos disponibilizados por Elon Musk – que tem optado por ostracizar e mesmo criticar a imprensa mainstream –, de que a alegada interferência russa nas eleições presidenciais de 2016 – e que teria contribuído para a vitória de Trump, suspeita que se revelaria falsa – serviu de pretexto para a criação de uma “máquina de censura” nas redes sociais. Um processo que este jornalista independente considera “análogo” ao incremento do “estado securitário” após o ataque do 11 de Setembro.

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Em resposta a esta sexta parte dos “Arquivos do Twitter”, o FBI emitiu ontem um comunicado, salientando que “contacta regularmente com entidades do sector privado para fornecer informações específicas para as actividades subversivas, não declaradas, encobertas ou criminosas de actores malignos estrangeiros identificados”, adiantando que essas entidades é que “decidem de forma independente sobre qual a acção, se alguma, tomam nas suas plataformas e para com os seus clientes. Estas declarações do FBI foram classificadas por Matt Taibbi, na sua página de Twitter, como “desonestas em múltiplas frentes”, acusando a agência governamental de estar a fazer “controlo de opinião”, mesmo em utilizadores de redes sociais com poucos seguidores.

O jornalista diz mesmo que aquilo que muitos começam a ver, nestas revelações, é como a existência de um “deep state” [“Estado paralelo”] é na verdade uma colaboração entre agências governamentais, empresas privadas e organizações não-governamentais (por vezes financiadas pelo Estado)”.

Elon Musk tem ironizado com a polémica levantada pela imprensa mainstream sobre a suspensão de contas de jornalistas que fizeram doxxing.

Desde que permitiu a divulgação de documento internos da anterior administração, nos já denominados “Twitter Files”, Elon Musk tem sido alvo de muitas críticas e de doxxing, uma forma de assédio em que é revelada na Internet a localização, em tempo real, da pessoa visada. Foi, aliás, invocando sérios riscos para a sua segurança e da sua família, que Musk alertou, no início da semana passada, que as contas que incorressem nessa prática seriam suspensas.

No entanto, o multimilionário acabou por optar, após uma chuva de críticas das mais altas instâncias – incluindo Nações Unidas e Comissão Europeia –  pela realização de uma sondagem online, no Twitter para os seus seguidores – que já são mais de 120 milhões –, pelo que levantou a suspensão das contas. Mas não deixou de ironizar num tweet a postura da comunicação social mainstream: “Tão inspirador ver o recém-descoberto amor da imprensa pela liberdade de expressão”, escreveu Musk ontem à noite.

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