Tal como no jogo da meia-final, contra a Croácia, a Argentina começou o jogo da final com um penalti. O quinto da competicão, o segundo seguido a desbloquear a fase inicial de um jogo onde a Argentina foi superior durante 80 minutos.
A França, abalada pelo inexplicável penalti sobre Di Maria, nunca se encontrou e esteve longe da equipa que se superiorizou em todos os jogos até hoje. Messi conduziu os colegas magistralmente e, a espaços, a França ficou reduzida a uma equipa banal, que se limitou a andar atrás da bola. Di Maria foi um desequilíbrio constante, na asa esquerda, e a bola rodava sempre por Messi, que, com poucos toques, procurou constantemente o ex-benfiquista.
Com a França a tentar aproximar-se da baliza argentina, o segundo golo acabou por aparecer de forma natural, tal como com a Croácia, num contra-ataque exemplar concluido por Di Maria, que, aos 33 anos, ainda faz sprints de um lado ao outro do campo.
A aula argentina terminou a 10 minutos do fim, quando Mbappé marcou dois golos de rajada. O primeiro num penalti também bastante duvidoso e o segundo num gesto técnico de difícil execução. O jogo mudou a partir desse momento, e os franceses voltaram a acreditar, encostando os argentinos às cordas nos instantes finais.
No prolongamento, a Argentina voltou a mostrar coração e ficou novamente por cima da contenda. Messi puxou dos galões e decidiu que este seria, definitivamente, o seu Mundial.
Nesta fase, os franceses insistiam essencialmente nas jogadas individuais e deixaram de atacar como equipa. Os cruzamentos para a área desapareceram e a troca de Thuram por Giroud, um perigo no jogo aéreo, revelou-se pouco acertada por parte de Deschamps.
Os 10 minutos finais do prolongamento foram de nervos e de imprevisibilidade, com a França a atacar e a Argentina a controlar a posse como podia. Di Maria passou 15 minutos a chorar. Ora porque marcava Messi, ora porque marcava Mbappé. Não consigo imaginar o que sente um profissional num momento destes.
O empate aos 117 minutos de jogo, conseguido pelo hat-trick de Mbappé, garantiu a montanha-russa de emoções. Nos dois minutos finais, a Argentina ainda teve uma oportunidade na cabeça de Lautaro, mal concluída, e Kolo Muani, completamente isolado em frente a Emiliano Martinez, falhou quase na última jogada do encontro o golpe de teatro que daria o 4-3.
Depois de um jogo absolutamente épico, seguiu-se a lotaria dos penalties. Aliás, lotaria não. Ganha quem não treme, e a Argentina não tremeu. Martinez voltou a provar que é um especialista na matéria e os jogadores franceses não tiveram a frieza para seguir os passos de Mbappé que, por três vezes, facturou da linha da grande penalidade.
Assim, 36 anos depois, a Argentina consegue colocar Messi ao nível de Maradona, e, provavelmente, terá garantido a oitava Bola de Ouro com uma despedida de sonho.
O Mundial do Qatar termina com um vencedor que não tinha a melhor equipa, mas possuía mais alma e, como se percebeu, o ainda melhor jogador do Mundo.
A última dança de Messi foi, por isso, perfeita. Parabéns ao génio e aos fãs argentinos que, como se percebe pela paixão, também são de outro planeta.
Até 2026!
Tiago Franco é engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)
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