FRAQUÍSSIMA PROCURA DA VACINA CONTRA A COVID-19 NOS ADULTOS COM MENOS DE 50 ANOS

Num universo de 4 milhões de pessoas, só cinco mil tiveram pressa em tomar dose de reforço

silhouette of road signage during golden hour

por Pedro Almeida Vieira // Janeiro 29, 2023


Categoria: Exame

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A Direcção-Geral da Saúde não recomenda nem desaconselha, e perante esta repentina atitude de lavagem de mãos à Pilatos – após quase dois anos de incentivo e coerção –, a procura de doses de reforço da vacina contra a covid-19 caiu para níveis irrelevantes. Desde dia 13 deste mês, a modalidade Casa Aberta ficou disponível para os adultos entre os 18 e os 49 anos, mas num universo de 4 milhões de pessoas, nos primeiros 10 dias somente cerca de 5.000 se apressaram a tomar o booster. Com a fraca procura, mais de cinco milhões de doses arriscam perder a validade, juntando-se assim às três milhões de doses já destruídas. Um gasto inglório de mais de 120 milhões de euros de dinheiros públicos, que entraram nos cofres das farmacêuticas.


Apenas cerca de cinco mil portugueses entre os 18 e os 50 anos terão aderido à modalidade Casa Aberta para a toma da dose de reforço sazonal da vacina contra a covid-19, desde o dia 13 de Janeiro. Numa população que engloba 4,1 milhões de pessoas, estes números confirmam um massivo desinteresse dos adultos em idade activa, num período em que aumentam as desconfianças sobre os efeitos adversos das vacinas perante o secretismo das autoridades dos diversos Governos, incluindo o português, em explicar o inopinado excesso de mortalidade total.

Embora não sejam disponibilizados números exactos por grupo etário, mas apenas gráficos de barra, o último relatório da Resposta Sazonal em Saúde, publicado anteontem pela Direcção-Geral da Saúde (DGS), mostra que no período entre 16 e 23 de Janeiro (semana 3 de 2023) foram apenas vacinadas 20.244 pessoas (uma média de apenas 2.892 por dia em todo o país). Destas, somente 25% têm idades entre os 18 e os 50 anos. A estes terão de acrescentar as cerca de 100 mil pessoas com menos de 50 anos (incluindo menores de idade) com comorbilidades de risco que foram vacinados com dose de reforço entre Setembro e Novembro do ano passado.

person holding white plastic bottle

Na primeira quinzena de Janeiro, a procura também já fora pequena: 21.006 e 19.531 doses, respectivamente, nas semanas 1 e 2 deste ano. Nos dias da semana 2 em que já poderiam vacinar-se adultos sem comorbilidades graves até aos 49 anos, a adesão terá sido residual, porque este grande grupo etário (cerca de 40% da população nacional) nem surge com representatividade no gráfico apresentado no segundo relatório de 2023 da DGS.

A fraquíssima adesão dos menores de 50 anos já seria expectável, mas não de uma forma tão marcante, face à forte quebra na procura pela dose de reforço sazonal registada no grupo dos 50 aos 59 anos, cuja campanha de vacinação (neste caso recomendada pela DGS) começou em 10 de Novembro do ano passado.

Apesar da DGS indicar que toda a população com mais de 18 anos tinha completado o esquema vacinal inicial – duas doses, ou uma no caso da Janssen, ao longo de 2021 e início de 2022 –, para o reforço dito sazonal apenas 43% do grupo etário entre os 50 e 59 anos responderam até agora favoravelmente à “chamada”. Mesmo no grupo dos 60 aos 69 anos se observa um grau de renitência significativo: mais de um terço das pessoas (36%) não quis dose de reforço sazonal. Nas faixas etárias mais avançadas mostra-se evidente que se esgotou o interesse: no grupo dos 70 aos 79 anos, no último mês, a percentagem de vacinados apenas subiu de 77% para 78%, enquanto nos maiores de 80 anos aumentou somente dos 81% para 82%.

Até anteontem, de acordo com dados oficiais, 177 pessoas morreram este mês por covid-19, uma média um pouco superior a seis por dia. Antes da pandemia, no período de 2014 a 2019, a média diária de mortes no mês de Janeiro causadas por pneumonias e gripe, segundo dados da Plataforma da Mortalidade, situava-se em 25, ou seja, quase quatro vezes superior aos valores actuais da doença provocada pelo SARS-CoV-2.

A fraca procura da vacina contra a covid-19 colocará, por outro lado, uma questão bastante relevante. O Estado português já terá comprado cerca de 45 milhões de vacinas, e em Outubro passado o Ministério da Saúde revelou ao PÁGINA UM que tinham sido doadas 7,8 milhões de doses, sobretudo aos PALOP, e revendidas 2,6 milhões de doses. Tendo em conta que foram já administradas cerca de 26,5 milhões de doses desde finais de 2021 e outras 3 milhões foram entretanto inutilizadas, haverá mais 5 milhões de doses que podem estar em risco de serem inutilizadas por falta de uso. Significa assim que até 8 milhões de doses compradas às farmacêuticas, num valor que se estima superior a 120 milhões de euros, podem ter sido desperdiçadas, ou melhor dizendo, entrado nos cofres das farmacêuticas sem qualquer utilidade.

Recorde-se que o PÁGINA UM entrou com uma intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa no último dia do ano passado para obrigar o ministro da Saúde, Manuel Pizarro, a disponibilizar a “consulta presencial e obtenção de cópia, em qualquer formato disponível, de todos os contratos integrais (incluindo anexos e cadernos de encargos) assinados entre a Direcção-Geral da Saúde (ou outras entidades tuteladas pelo Ministério da Saúde) e as farmacêuticas que comercializam vacinas contra a covid-19, desde 2020 até à data, incluindo documentos de entrega (guias de transporte), bem como toda a documentação (troca de correspondência) entre as entidades adjudicantes e adjudicatárias ao longo desde período.”

Manuel Pizarro, ministro da Saúde, recusa mostrar contratos das vacinas contra a covid-19. Direcção-Geral da Saúde diz estar a fazer auditoria às compras e gestão, mas não adianta os motivos nem mostra qualquer comprovativo da veracidade dessa diligência.

Apesar da obrigatoriedade legal de colocar todos os contratos públicos no Portal Base, o Governo, através da DGS – que terá sido a única entidade pública a efectuar as aquisições –, está intencionalmente a omitir a inclusão de qualquer contrato relacionado com as vacinas contra a covid-19 desde Março de 2021. Ignoram-se assim, de forma inequívoca, quantos lotes foram adquiridos a cada farmacêutica, os preços unitários e as condições de venda, incluindo as relacionadas com responsabilização.

A DGS veio dizer, entretanto, estar a realizar uma auditoria à compra e gestão das vacinas contra a covid-19, apresentando esse facto como um dos motivos para recusar o acesso aos contratos com as farmacêuticas, não tendo apresentado, contudo, qualquer documento comprovativo dessa diligência, nem justificado os motivos. A veracidade dessa informação será, certamente, verificada pelo Tribunal Administrativo de Lisboa, onde decorre o processo de intimação.

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