FALTA DE LINGUAGEM GESTUAL EM DEBATES POLÍTICOS

Onze “puxões de orelhas” e seis coimas depois, a ERC ainda faz “descontos” à SIC por infracções reiteradas

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por Pedro Almeida Vieira // Fevereiro 4, 2023


Categoria: Imprensa

Temas: Imprensa

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A Entidade Reguladora para a Comunicação Social demorou mais de 44 meses para decidir aplicar uma coima à SIC por não colocar intérpretes gestuais nos debates televisivos para as eleições europeias em 2019, após uma queixa do então deputado André Silva, porta-voz do PAN. O Grupo Impresa tem sido reincidente em infracções (17, no total, desde 2011), mas até agora só apanhou admoestações e seis coimas, das quais quatro já transitaram em condenações nos tribunais.


Tudo começou em Maio de 2019. E termina agora, quase quatro anos depois, com uma coima de 45 mil euros à Impresa, mas com um estranho e apreciável desconto da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) à dona da SIC e SIC Notícias.

Em 9 de Maio de 2019, o então porta-voz do PAN, André Silva, insurgiu-se por a SIC, no debate para as eleições do Parlamento Europeu, não ter contado com intérprete de língua gestual. Queixa à ERC, e o regulador haveria de confirmar o desrespeito pelas regras das emissões televisivas que estipulavam que os “debates entre candidatos aos diversos atos eleitorais que ocorram durante os períodos de pré-campanha e campanha deverão ser integralmente objeto de interpretação por meio de língua gestual”.

Debate de André Silva (PAN) e de António Costa (PS), em 11 de Maio de 2019, já contou com intérprete de linguagem gestual. Dois dias antes, o dirigente político queixara-se à ERC de falhas que levaram agora à aplicação de uma coima de 45 mil euros.

A decisão de abrir um processo de contra-ordenação foi extremamente rápida para os padrões da ERC: entre a queixa, em 9 de Maio, e a deliberação a confirmar a ilegalidade passaram apenas 32 dias, uma vez que a deliberação foi tomada em 10 de Junho daquele ano. No total foram detectadas quatro infracções à Lei da Televisão, considerada, cada uma, “contraordenação grave punível com coima mínima de 20.000 euros e máxima de 150 000 euros”.

Porém, depois disto, como habitualmente o Conselho Regulador da ERC presidido pelo juiz conselheiro Sebastião Póvoas, andou a marinar o processo de contra-ordenação, que somente foi agora concluído no passado dia 4 de Janeiro, embora divulgado apenas esta semana. Confirmando todos os factos, a ERC aplicou quatro coimas de 30 mil euros, que assim totalizariam 120 mil euros. No limite, se aplicado o limite máximo, a Impresa sujeitava-se a uma coima de 600 mil euros.

Mas a ERC acabou por ser ainda mais benevolente com a dona da SIC, aplicando-lhe o regime de cúmulo jurídico, que acabou assim numa coima única de 45 mil euros, ou seja, um “desconto” de 62,5% pela prática de quatro infracções reiteradas em dias distintos por ocasião de quatro debates políticos.

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Embora o cúmulo jurídico seja uma norma bastante usual em processos contra-ordenacionais – e também até em processos penais –, na avaliação da “multa” a pagar é também ponderado se as infracções cometidas são pontuais ou não. Ora, no caso concreto dos canais da Impresa, a ERC até acaba por elencar todas as admoestações e infracções cometidas anteriormente por falhas e lacunas deste género.

E, por isso, acaba por ser algo surpreendente que, após 11 admoestações por infracções à Lei da Televisão (quatro em 2011, duas em 2012, três em 2013 e duas em 2015), mais duas coimas (no valor total de 23.750 euros) e mais quatro condenações em tribunal com trânsito em julgado (com pagamento de mais de 67 mil euros, no total), o Grupo Impresa ainda beneficie de um desconto por reiteradas infracções. Ainda por cima nas “barbas de políticos”, porquanto a falta de intérprete de linguagem gestual ocorreu em debates políticos.

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