Manuel Pizarro em silêncio sobre perda de validade de lotes

Vacinas contra a covid-19: Doses para o “lixo” valem 120 milhões de euros

silhouette of road signage during golden hour

minuto/s restantes

Ao longo de 2021 e 2022, os portugueses mostravam, orgulhosos, os comprovativos das vacinas contra a covid-19, cuja eficácia afinal se perdia em poucos meses. À suposta necessidade de “reforçar” a imunidade vacinal, os portugueses estão agora cada vez mais desconfiados, e a adesão aos boosters estão em queda livre. Mas o Governo português, tal como em outros países, tratou de comprar sem olhar a custos. Resultado: um país que ainda tem um milhão de cidadãos sem médico de família vai em breve contabilizar 8 milhões de doses destas vacinas deitadas literalmente ao lixo. O custo desta falta de gestão de dinheiros públicos em benefício da indústria farmacêutica: 120 milhões de euros. Para já…


O silêncio absoluto do Ministério da Saúde sobre as alternativas a dar a um stock de 8 milhões de doses de vacinas contra a covid-19 só encontra eco no vazio dos centros de vacinação em sistema de Casa Aberta, que nas últimas semanas – passe a analogia literária – terão tido mais moscas que gente.

De acordo com o mais recente relatório da resposta sazonal em saúde, da Direcção-Geral da Saúde (DGS), apenas hoje divulgado, na semana 7 deste ano – entre 13 e 19 de Fevereiro – apenas foram administradas 11.861 doses, um ritmo de administração de menos de 1.700 doses por dia. Metade destas terão sido dadas a pessoas com idade entre os 18 e os 50 anos, grupo para quem o reforço sazonal é recomendado a pessoas vulneráveis.

Porém, depois de dois anos de comunicação intensiva sobre os alegados benefícios dos reforços (boosters), a DGS passou a ter uma posição ambígua para a população saudável com menos de 50 anos: não recomenda nem desaconselha. E mais: nem revela – em “cooperação” com o Infarmed – os efeitos adversos dos reforços. O resultado desta situação tem sido desinteresse quase absoluto no reforço vacinal.

Embora a DGS não revele os números exactos das doses de reforço administradas, desde que a modalidade Casa Aberta foi disponibilizada para o grupo etário entre os 18 e os 50 anos – um universo de um pouco mais de 4 milhões de portugueses –, terão sido vacinadas menos de 40 mil pessoas desta faixa em mais de um mês. Ou seja, cerca de 1% do total.

A fraca procura da vacina contra a covid-19 colocará, assim, uma questão bastante relevante, e que se tem verificado em outros países europeus. Por exemplo, ainda este mês a Suécia anunciou que teria de descartar 8,5 milhões de doses por perda de validade. No Verão do ano passado, a Suíça revelou a perda de 10,3 milhões de doses.

Evolução da administração de doses de vacinas contra a covid-19 por semana por grupo etário. A linha negra representa o número acumulado desde a semana 35 do ano de 2022. Fonte: DGS.

No caso português é previsível que estejam a perder a validade cerca de 5 milhões de doses. Portugal terá comprado cerca de 45 milhões de vacinas, e em Outubro passado o Ministério da Saúde revelou ao PÁGINA UM que tinham sido doadas 7,8 milhões de doses, sobretudo aos PALOP, e revendidas 2,6 milhões de doses. Tendo em conta que foram já administradas cerca de 26,5 milhões de doses desde finais de 2021 e outras 3 milhões foram já entretanto inutilizadas até ao final de 2022, haverá assim um pouco mais 5 milhões de doses que podem estar em risco de serem inutilizadas por falta de uso.

Considerando que o preço médio unitário das vacinas ronda os 15 euros, a perda económica total, para as 8 milhões de doses, ascenderá aos 120 milhões de euros. Mas Portugal pode ainda ser “chamado” a entregar mais dinheiro às farmacêuticas, sobretudo à Pfizer, caso se tenha de concretizar solidariamente o acordo estabelecido pela Comissão von der Leyen. Pelas estimativas do PÁGINA UM, o Governo português poderá ter de comprar cerca de 500 milhões de euros em doses de vacinas para a covid-19, independentemente da adesão para novos reforços nos próximos anos.

person holding white plastic bottle

O PÁGINA UM pediu informações ao Ministério da Saúde para confirmar a quantidade de doses que perderão a validade dos próximos três meses e qual a perda potencial, tendo enviado mensagens a três dos assessores de imprensa de Manuel Pizarro, a saber: Pedro César, Romana Santos e Marta Reis. O e-mail foi remetido para os três assessores no dia 20 deste mês, ou seja, há uma semana. Não houve qualquer reacção.

Recorde-se que o PÁGINA UM tem em curso uma intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa para obrigar Manuel Pizarro a revelar todos os contratos e entregas de vacinas contra a covid-19, bem como as comunicações entre o Ministério da Saúde e as farmacêuticas que as vendem. Após a interposição deste processo, o Ministério da Saúde chegou mesmo a “apagar” quatro contratos que estavam já no Portal Base desde meados de 2021.

O jornalismo independente DEPENDE dos leitores

Gostou do artigo? 

Leia mais artigos em baixo.