Título
A História secreta dos alimentos
Autor
MATT SIEGEL
Editora (Edição)
Casa das Letras (Fevereiro de 2023)
Cotação
17/20
Recensão
Com o subtítulo, Histórias estranhas, mas verdadeiras, sobre as origens de tudo o que comemos, o escritor gastronómico norte-americano Matt Siegel conduz-nos numa viagem pelo tempo, desde que o Homem começou a usar o fogo para confeccionar os alimentos, revelando-nos curiosidades e factos pouco conhecidos sobre muito daquilo que comemos.
Cada capítulo é dedicado a um alimento, mas a informação disponibilizada não se esgota nele ou se resume apenas a esse alimento. O autor, com mestria e um conhecimento enciclopédico, entrecruza inúmeras histórias e dados científicos, que dão corpo ao tema principal, guiando-nos através de vários campos do conhecimento e saciando o nosso apetite por estas curiosidades gastronómicas, numa visão por vezes bastante radical ou irreverente. Um olhar fresco e salutar sobre aquilo que pensávamos saber sobre os alimentos que nos chegam à mesa, num rosário de pequenas histórias que fizeram a História.
O mel, por exemplo, serviu como arma de guerra ao longo dos séculos, tendo sido utilizado para infligir danos aos inimigos em vez de flechas, numa prática que remonta à Idade da Pedra: “Os homens das cavernas cobriam-nas com lama e atiravam-nas para cavernas inimigas; os exércitos romanos carregavam as catapultas com elas; os ingleses medievais atiravam-nas sobre as muralhas do castelo”. Curiosamente, a palavra bombardear vem do grego bombos, que significa “abelha”.
Antes dos primeiros colonos chegarem ao continente norte-americano, a bordo do Mayflower, apenas setenta variedades de maçãs eram conhecidas e encontravam-se catalogadas em Inglaterra. Dessas, trinta e seis já haviam sido descritas e mencionadas no século I, na Roma antiga, por Plínio, o Velho. Contudo, no Novo Mundo, as maçãs não existiam, com excepção de algumas maçãs de jardim não comestíveis, pelo que os colonos plantaram as suas sementes trazidas de Inglaterra por volta de 1620. Numa geração, aquelas primeiras macieiras provocaram uma revolução na história da maçã e prestes “deram origem a cerca de dezassete mil novas variedades, não incluindo as inúmeras experiências que não eram particularmente atrativas ou que não valia a pena catalogar.”
As malaguetas “são agora as especiarias mais utilizadas no mundo, sendo cultivadas em todos os continentes”, inclusivamente na Antártida, onde foram plantadas numa estufa, “concebida para testar tecnologias de cultivo de plantas desenvolvidas para exploração espacial”. Diariamente, cerca um terço da população mundial consome malaguetas, um dos ingredientes essenciais na cozinha mexicana, norte-africana, coreana, tailandesa, indonésia, entre tantas outras.
Por entre as grandes histórias surgem também as pequenas histórias ou curiosidades, que o autor vai desvelando com esmero e graça, como aquela das mulheres atenienses que coziam o pão “em forma de pénis e utilizavam azeite como lubrificante para fazerem brinquedos sexuais económicos, chamados olisbokollix (“dildo de pão”)”. Séculos mais tarde, na Inglaterra de Setecentos, as mulheres preferiram cozer “pães com a forma dos seus próprios órgãos sexuais (literalmente pressionando a massa contra a sua pele como um molde), devido a uma crença mágica de que os homens que os comessem se apaixonariam por elas.”
Todo o livro transborda de gula e curiosidade, mas o único pecado que se poderá apontar talvez seja o facto dele ser um tanto ou quanto etnocêntrico, alicerçado numa influência norte-americana, bem como nos seus hábitos consumistas. É certo que as invenções culinárias dos “americanos” conquistaram e transformaram o mundo, mas ainda há mais mundo gastronómico com os seus segredos por desvendar. Não nos falte o engenho e o apetite.