Correio Trivial

O que a TAP nos revelou

black and white abstract painting

por Vítor Ilharco // Abril 8, 2023


Categoria: Opinião

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Estive mais de oito horas sentado, frente ao televisor, para ouvir os depoimentos das ex-administradoras da TAP na Comissão de Inquérito da Assembleia da República.

Como a maioria dos portugueses, fiquei atónito com o desplante, a descontração, o sentido de impunidade, com que estas responderam às questões dos deputados.

Christine Ourmières-Widener.

Pela ex-CEO, Christine Jeanne Ourmières-Widener, uma francesa que ainda não compreendeu Portugal, ficámos a saber que o ex-secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Mendes, lhe pedira para adiar um voo, proveniente de Moçambique, que tinha como passageiro o Presidente da República, já que este, alegadamente, precisava de ficar mais dois dias em Maputo.

Em troca de mensagens, a ex-CEO da TAP terá dito que não achava correcta essa medida e isso a incomodava.

Ao que o ex-Secretário de Estado respondeu:

“Bom dia, sei que isto é um incómodo para ti, mas não podemos mesmo perder o apoio político do Presidente da República. Ele tem-nos apoiado no que diz respeito à TAP, mas se o humor dele mudar, tudo se perde. Uma frase dele contra a TAP ou o Governo e ele empurra o resto do país contra nós. Não estou a exagerar. Ele é o nosso principal aliado político, mas pode transformar-se no nosso pior pesadelo.”

A alteração não foi feita e Christine Jeanne Ourmières-Widener, mostrou-se satisfeita na Comissão de Inquérito:

airplane on sky during golden hour

“Não fiquei surpreendida deste pedido não ter origem na Presidência da República, mas talvez de alguém no processo que achou que era uma boa ideia. Este voo não foi alterado e o Presidente encontrou outra solução. Não fiquei surpreendida, o Presidente nunca nos pediria para alterarmos um voo. Neste caso teria impacto em mais de 200 passageiros.”

A maior desilusão, no fim de tudo isto, vem de percebermos a facilidade com que qualquer asno pode chegar a Secretário de Estado.

Basta mostrar toda a subserviência com os fortes, bajulando-os a toda a hora, para subir alguns patamares até conseguir chegar a um ponto em que será ele um dos bajulados.

Neste caso não resultou porque a vaidade em querer mostrar o seu poder foi ainda maior do que a sua imensa burrice ao dar aquelas instruções por escrito.

Vai ter que regressar à Juventude Socialista e ali estagiar mais uns anos, colando cartazes nos períodos eleitorais e carregando as pastas dos chefes.

white and red passenger plane on airport during daytime

Mas o maior escândalo divulgado nessas audiências veio da Deputada do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua, que deu conta de uma indemnização a um ex-CEO da TAP, um gestor brasileiro que todos criticam por negócios desastrosos e “estranhos” (digamos assim), com empresas do Brasil, e que terão prejudicado a transportadora portuguesa em milhares de milhões de euros.

Segundo a Senhora deputada, esse gestor terá recebido uma indemnização de mais de um milhão de euros, já depois de ter saído da empresa, e que, para tal pagamento, fora utilizada a conta bancária de uma firma criada dias antes, com esse propósito.

Todos os membros da Comissão ouviram.

Presumo que muitos elementos da Procuradoria-Geral da República também tenham escutado.

Não tornei a ouvir falar desse tema.

Estará a ser investigado?

person holding airplane control panel

Como é que uma empresa, que recebe milhares de milhões de euros de todos os contribuintes, pode distribuir prendas, de milhões de euros, a administradores e quadros superiores, usando subterfúgios para tentar esconder ilegalidades, sem que nenhuma autoridade investigue, puna os ilegalmente beneficiados e recupere essas verbas?

O que se espera?

Quem beneficia com esta inércia?

Não se poderá falar de desconhecimento porque a informação foi dada por uma Senhora Deputada, numa Comissão de Inquérito da Assembleia da República, com transmissão, em directo, em vários canais de televisão.

Com toda a certeza, alguém da Procuradoria-Geral da República terá ouvido.

Vão permitir que os responsáveis (???) por uma empresa subsidiada em milhares de milhões de euros, com o apoio dos impostos de todos os portugueses, continuem a distribuir fortunas entre si?

Este escândalo da TAP só veio tornar mais claro o dia-a-dia de empresas geridas pelo Estado.

Gerir o dinheiro dos outros é tão fácil…

E tão lucrativo…

E, em Portugal, isento de riscos!

Air Canada airline

Pelo menos que isto sirva de lição a candidatos a ladrões.

Querem assaltar empresas lucrativas, sem qualquer risco e com êxito garantido?

Nada mais fácil, basta conseguir um lugar nos conselhos de administração.

Vítor Ilharco é secretário-geral da APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso


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