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Reescrever o 25 de Abril

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O golpe militar do 25 de Abril faz hoje 49 anos. O próximo ano vai ser decisivo para a reescrita da sua história, por isso é importante assinalar alguns factos históricos que não podem ser esquecidos. Ouça também esta crónica no P1 PODCAST.


A maior tentação dos vencedores é a de reescrever a História. Bem, nem sequer é uma tentação, pois podemos mesmo dizer que é uma inevitabilidade. Os vencedores têm todo o direito a reescrever a História, pois eles são isso mesmo: os vencedores.

E a História dirá que aquela era a madrugada pela qual muitos esperavam, o tal “dia inicial inteiro e limpo” do poema da Sophia de Mello Breyner, “onde emergimos da noite e do silêncio/ E livres habitamos a substância do tempo”. Isso é muito bonito.

Sim, o 25 de Abril terminou com uma Ditadura e deu-nos uma Democracia. Acabou com uma guerra colonial e permitiu que outros países se tornassem independentes. E Portugal tornou-se num País europeu onde, apesar das dificuldades económicas destes últimos tempos, ainda assim estamos muito melhor do que no tempo em tínhamos uma ditadura.

O problema é que esta narrativa dos vencedores não nos deixa ver certos factos históricos que, agora, à distância de meio século, deveriam ter sido tidos em consideração para saber o que podemos fazer nos próximos 50 anos. Sobretudo hoje, quando temos uma guerra na Europa e não parecemos perceber porquê.

Há alguns factos, breves e básicos, que deveremos ter sempre em consideração quando falarmos do que aconteceu a 25 de Abril de 1974. Primeiro de todos, temos de ver que se tratou de um golpe militar num País que era membro da NATO. Mais ainda: era membro fundador da NATO.

Essa nobre instituição que pugna pela defesa da Democracia, afinal, em 1949, teve uma ditadura fascista como membro fundador. Ou será que Portugal não era uma ditadura fascista? Os Estados Unidos e os outros países na NATO andavam todos enganados?

Um ano antes do nosso 25 de Abril, a 11 de Setembro de 1973, os militares no Chile fizeram aquilo que os militares normalmente fazem: um golpe militar para instaurar uma ditadura. Em Portugal, foi diferente porque a NATO é diferente.

No Chile, dizem que os Estados Unidos estiveram por detrás do golpe, mas em Portugal, garantem que não houve qualquer influência de Washington. Aliás, para que isso ficasse bem claro, o próprio embaixador dos Estados Unidos em Lisboa até estava convenientemente ausente no dia do golpe.

É ainda muito importante dizer aos jovens que o 25 de Abril não “derrubou Salazar”.

O ditador António de Oliveira Salazar, que ocupou o cargo entre 1932 e 1968, só deixou de ser ditador porque teve um acidente doméstico e ficou incapacitado fisicamente. E morreu pacificamente, na sua cama, em 1970.

Portanto, isto aconteceu quatro anos antes da revolta dos militares.

O 25 de Abril derrubou um outro ditador, que se chamava Marcello Caetano. E esse nunca foi julgado por qualquer crime, pois, faz hoje 49 anos, saiu do Quartel do Carmo dentro de um carro militar blindado e foi levado directamente para o aeroporto. Morreria no Brasil, seis anos mais tarde, em Outubro de 1980.

Isto foi dois meses antes do primeiro-ministro Francisco Sá Carneiro ter sido assassinado com uma bomba a bordo do avião que se despenhou em Camarate.

Esclarece-se ainda que a descolonização foi feita num período de apenas um ano. Se virmos que 500 anos são apenas umas horas na História do mundo, a nossa saída de África teve lugar há apenas uns segundos.

A última colónia a ter a independência foi Angola, em Novembro de 1975, apenas uns dias antes do golpe do 25 de Novembro, aquele que, hoje, é apontado por certos sectores políticos como o verdadeiro início da Democracia e não o 25 de Abril.

A História livre e independente sobre o 25 de Abril ainda está por ser feita. O próximo ano irá servir para esconder muita coisa e criar muitos mitos, mas lembremo-nos que à conta de tanto reescrever a História, corremos não o risco de a repetir, mas sim o de a imitar de forma caricata, mas com efeitos ainda mais trágicos.         

Frederico Duarte Carvalho é jornalista e escritor


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