Recensão: Não Obedeças Mais

Da obediência à (pretensa) liberdade

por Ana Luísa Pereira // Junho 21, 2023


Categoria: Cultura

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Título

Não obedeças mais

Autor

GUSTAVO SANTOS

Editora (Edição)

Alma dos Livros (Outubro de 2022)

Cotação

9/20

Recensão

Nascido em Lisboa, em 1977, Gustavo Santos é o autor de vários livros de desenvolvimento pessoal, nomeadamente, Agarra o agora (2013, Esfera dos Livros), A força das palavras (2015, Esfera dos Livros) e O caminho (2015, Pergaminho), entre outros.

Antes de se dedicar à escrita e ao coaching, esteve ligado ao entretenimento: foi bailarino e pertenceu a uma boys band, a Hexa Plus, participou no reality show, “Big Brother Famosos” (2002) e apresentou o programa “Querido, mudei a casa!” (entre 2010 e 2020, primeiro na SIC, depois na TVI). Como actor, entrou em várias telenovelas e outros programas de entretenimento, como por exemplo, “Floribella” e “Espírito Indomável”.

“O livro-sensação do ano” – lê-se na capa –, Não obedeças mais, e que tem como mote "a tua verdade é a tua liberdade”, publicado pela Alma do Livros, resulta de um conjunto de 100 textos, que, nas palavras do autor, são “sem censura”, “sobre liberdade” e “pela liberdade”.

À semelhança de outros livros de desenvolvimento pessoal, a escrita desenvolve-se num tom intimista, tratando o leitor por tu, como alguém próximo, como quem desenvolve uma conversa frente a frente. O discurso também pode ser entendido como aquele preparado para uma plateia a participar num curso de desenvolvimento pessoal ou de coaching, tão em voga, nos últimos tempos.

É disso que se trata, de uma palestra escrita, um monólogo, em que o autor discorre sobre o que entende ser a liberdade. Para si, algo que resulta da capacidade de pensar, dizer e fazer o que bem entende, sem que os outros tenham alguma coisa que ver com o assunto.

Os outros que, como dizia Jean Paul-Sartre, são o inferno, mas que em Gustavo são o S.I.S.T.E.M.A. – “grupo restrito de gente autora de uma Agenda perigosa que visa o fim da Liberdade do povo em prol de mais poder, mais controlo e maiores receitas” (p. 11), mais concretamente, “Soberania Idiota, Sinistra e Tirana de Egos Mercenários e Assombrados” (título do capítulo dois, p. 18).

Para o autor, este S.I.S.T.E.M.A. é aquele a quem devemos desobedecer se queremos lutar pela liberdade. Para tal, em cada capítulo, Gustavo Santos apresenta um conjunto de ideias com o objetivo de motivar as pessoas a despertarem e a não se deixarem manipular, dado que esse é o propósito do método “C.H.O.N.É. (conversão em série de humanos em ovelhas de nádegas escancaradas)” – título do capítulo quinze (p. 56).

De página em página, Gustavo Santos mostra-se corajoso e um homem forte, recorrendo a Jesus, Gandhi, Mandela ou Luther King, para mostrar que, como eles, ele também faz. Ele, Gustavo, também tem impacto e, provavelmente, ficará na História. Com efeito, as palavras escritas de Gustavo podem ter algum impacto, mas como ele próprio reclama, também ele se quer impor sem mostrar factos:

Não me peçam factos, por favor.

Não sou uma mosca para estar em reuniões secretas nem agente infiltrado de coisa nenhuma. Sou homem de coração agitado, livre por natureza, e isso basta” (p. 105).

Só que não. Se Gustavo Santos reclama pela verdade e luta pela liberdade e quer combater a seita, então talvez seja melhor ir além do que sente e pressente e procurar, e pelo menos tentar, apresentar factos que demonstrem a sua verdade.

Os jogos de palavras são uma constante. Além dos já mencionados, destaquem-se os títulos “Comuni«coação» social” e  “Edu«coação» escolar”, que sendo profícuos, são, em nosso entender, mal aproveitados. Tão-só pela vacuidade. Os temas da propaganda ou da liberdade poderiam ser aprofundados, mas ficam limitados à conversa de café. Pouco mais que uma série de lugares-comuns, pese embora o autor se outorgue como o salvador da pátria.

Deixamos alguns finais de capítulo como exemplos de um discurso, na nossa opinião, estéril:

“Não obedecer é ser diferente” (p. 55).

“Não obedecer é marimbares-te para o que te dão à condição e trocar tudo isso, que é quase nada, por algo conquistado por ti” (p. 81).

“Não obedecer é acreditar no bem, e contra isso não há quem” (p. 156).

“Não obedecer é deixar de ser um brinquedo” (p. 173).

“Não obedecer é cagar no filtro e dar o litro” (p. 198).

O jornalismo independente DEPENDE dos leitores

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