A jornalista do Público, Bárbara Reis, levantou a suspeita de que não sou um jornalista independente porque tive participação na vida política. Vamos lá então ver isso. Ouça também esta crónica no P1 PODCAST.
A mensagem chegou-me como uma provocação. Os meus amigos gostam de me provocar e este dizia assim: “Então afinal é contigo que a Bárbara Reis se mete hoje”? E lá vinha uma cópia do texto da newsletter de 19 de Julho da jornalista do Público, com o título “Tal&Qual e accionistas na política”.
A newsletter, que se chama genericamente “Livre de Estilo” e versa “sobre o outro lado do jornalismo e dos media”, resolveu ir ver o nome dos accionistas do semanário “Tal&Qual” e fez uma relação entre eles e a vida política. Estou lá, como proprietário de 2,5%, mas também como tendo sido candidato, filiado e dirigente de partidos como PPM e MPT.
Devido a isso, fui comparado a ilustres figuras que têm o mesmo percurso de vida, como os magnatas Francisco Pinto Balsemão e Silvio Berlusconi, tendo sido lançada a suspeita de que, tal como eles, também tenho a minha independência jornalística comprometida pelo facto de ter assumido uma posição pública que vai para lá do compromisso profissional como jornalista.
Tive de sorrir quando reparei como é que a Bárbara fez a sua investigação jornalística aprofundada para descobrir esse segredo sobre a minha pessoa: bastou-lhe googlar o meu nome completo (Frederico Duarte Cavacas Teixeira de Carvalho) para ficar a saber que, por exemplo, fui candidato do PPM à Câmara de Lisboa nas eleições autárquicas de 2007.
Já nem me lembrava disso. Mas que nostalgia me trouxe essa referência da jornalista do Público. Lembram-se da eleição intercalar para a presidência da câmara de Lisboa, quando Carmona Rodrigues foi afastado e o PSD apresentou Fernando Negrão como candidato, mas quem ganhou foi António Costa, o actual primeiro-ministro, que assim aproveitou para se afastar do governo do José Sócrates?
A Bárbara acrescenta, entre parentesis, que fui candidato suplente, mas não diz que era o último suplente da lista e ela, como jornalista, poderia ainda ter acrescentado aos seus leitores que o PPM foi o partido menos votado (era só ler). Lembro-me de brincar então com os companheiros no PPM que o meu futuro político estava garantido, pois nas eleições intercalares para a câmara de Lisboa de 2007, o nome mais votado (com 56.751 votos) era o de António Costa, enquanto o último nome da lista do último partido (com 726 votos) era o meu! E, como sabem, os extremos, tocam-se!
Bárbara descobriu ainda que fui o cabeça-de-lista do PPM ao Parlamento Europeu, dois anos mais tarde, em 2009. Mas isso era apenas o que o Google lhe disse através dos resultados que mostravam a lista do meu nome completo. Um nome que, no início da minha vida profissional, em 1992, como estagiário de “O Primeiro de Janeiro”, no Porto, tive de analisar em detalhe quando me disseram que não podia assinar apenas Frederico Carvalho, pois havia um outro jornalista com a mesma assinatura profissional (no Expresso).
Pensei num curto e eficaz Frederico Cavacas, em homenagem ao nome materno e ao meu avô, o senhor Cavacas, barbeiro da Rua António Enes. Considerei o Teixeira de Carvalho, da família do meu pai, mas ficaria demasiado comprido na assinatura dos textos. Acabei por usar os nomes próprios, escolhidos pela minha mãe e pelo meu pai, acrescentado pelo Carvalho da família. E as iniciais seriam FDC – ditas com a pronúncia do Norte.
Se a Bárbara tivesse feito uma pesquisa dentro do arquivo do seu próprio jornal, encontraria uma notícia do Público de 4 de Junho de 2009, onde, na sequência da visita que fiz à Mesquita de Lisboa, como candidato do PPM ao Parlamento Europeu, ficaram registadas coisas politicamente irresponsáveis como: “Ser português é respeitar e integrar as diferentes culturas religiosas” e “o desconhecimento é que leva ao medo”. Devo dizer que isto não é propriamente meu, mas vem no livro “A Utopia”, de Thomas Moore.
A candidatura do PPM, por mim encabeçada, obteve 14.414 votos, o que correspondeu a 0,40 por cento. O partido perdeu votos, pois alcançara 15.466 em 2004, correspondendo a 0,46 por cento. O actual cronista do diário onde Bárbara trabalha, Miguel Esteves Cardoso, quando também foi candidato ao Parlamento Europeu pelo mesmo PPM, conseguiu muitos mais votos – 155.990, em 1987 (2,77 %) e 84.272 (2,03%) em 1989.
Está visto que a minha carreira política em partidos como PPM e MPT não seria de sucesso – já agora, Bárbara, não conseguiste descobrir que, em 2013, fui um dos fundadores do Livre, juntamente com o ex-cronista do Público, Rui Tavares? Isso até provocou depois uma polémica interna no partido e há uma notícia sobre o caso no arquivo do teu jornal, quando tive de deixar de ser livre por ter “assumido posições anti-imigração” no tempo do PPM. Sim, quando a minha posição sempre fora por uma imigração com qualidade e direitos. É um texto assinado pela Rita Brandão Guerra, pessoa que nunca falou comigo para fazer aquele artigo, mas que, mais tarde, saiu do Público e foi trabalhar como assessora da ministra da Cultura.
Enfim, sou eu este perigoso jornalista, que vende a sua independência à porca da política. Na realidade, quem me conhece, sabe que eu já era jornalista e político antes de o ser. A leitura das aventuras do Tintin foram a minha escola cívica. Decidi entrar na política activa por saber que havia demasiada política encapotada no jornalismo e pouca missão jornalística na política.
Não fui longe, mas sei que continuo a fazer jornalismo e, como cidadão, política. Aliás, já agora, Bárbara, tu que estiveste nos EUA, fazias bem em ler uma crónica sobre Camarate que há uns tempos publiquei no teu Público. É um exemplo de como estou na vida.
P.S. A Bárbara não sabe (porque não falou comigo), mas o documento que consultou sobre os accionistas do “Tal&Qual” está algo desactualizado: deixei de ter os 2,5 por cento do “Tal&Qual” desde Outubro do ano passado. Actualmente, não sou proprietário de nada e não estou filiado em qualquer partido. Fora isso, continuo a ser o que sempre fui: jornalista e cidadão.
Frederico Duarte Carvalho é jornalista e escritor
N.D. Como habitualmente, os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das minhas análises, pensamentos e avaliações. Em todo o caso, e longe de pretender defender o nosso colaborador Frederico Duarte Carvalho (não desejo nem devo) e muito menos o (estilo do) Tal & Qual, e até concordando em algumas linhas com um primeiro texto de Bárbara Reis (excepto na parte sobre a reduzida ficha técnica, porque nem todos os jornais têm sócios-mecenas que injectam para aí uns dois milhões de euros por ano para aparar contínuos prejuízos, como faz a Sonae no Público), estou particularmente interessados em ler, em próxima oportunidade, a sua opinião sobre um certo jornal em que o director editorial é casado com uma deputada socialista e onde os contratos comerciais envolvendo jornalista são o pão-nosso-de-cada-dia. PAV