4 MILHÕES DE EUROS: TRUST IN NEWS TAMBÉM ESTÁ A DAR CALOTE AO GRUPO DE PINTO BALSEMÃO

Novo Banco usado para pagar compra da Visão e outras revistas, mas “torneira” fechou

frozen bubble, soap bubble, frozen

por Pedro Almeida Vieira // Julho 26, 2023


Categoria: Imprensa

Temas: Economia, Media

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Além da dívida astronómica de 11,4 milhões ao Estado, a dona das revistas Visão, Exame, Caras e Jornal de Letras (entre outros títulos) tem sistematicamente falhado os acordos de pagamento do negócio de compra em 2018 ao Grupo Impresa. Anunciado por um valor de 10,2 milhões de euros, o montante devia ter sido pago em dois anos e meio. E começou a ser, sobretudo com empréstimo do Novo Banco, mas a torneira fechou a partir de 2020 face aos fracos resultados económicos. Agora, várias renegociações da dívida depois, a Impresa ainda está para ver a cor a mais de 4 milhões de euros, prevendo-se agora que o pagamento pela Trust in News se estenda até 2036. Mas se o prazo de pagamento for cumprido, e o ritmo de crescimento da dívida ao Estado se mantiver sem intervenção do Governo, em 2036 os contribuintes terão já a haver da Trust in News mais de 50 milhões de euros. O Ministério das Finanças continua sem dar explicações.

Nota: Por “alerta” de pessoa com legitimidade, e reconhecendo a eventualidade de o uso de fotografias divulgadas livremente nas redes sociais poder ser considerado uma violação dos direitos autorais, mesmo se de figuras públicas, o PÁGINA UM decidiu retirar algumas fotografias e substituí-las por uma imagem alusiva à transparência.


Foi anunciado, no início de Janeiro de 2018, como um dos grandes negócios de media em Portugal: o Grupo Impresa vendia um conjunto de 12 títulos – onde pontificavam as revistas Visão, Exame e Caras e o Jornal de Letras – à Trust in News, uma empresa unipessoal fundada meses antes pelo ex-jornalista Luís Delgado. O montante, divulgado em comunicado à CMVM, era chorudo: 10,2 milhões de euros, embora, na altura, a Impresa tenha declarado que “o impacte contabilístico ainda não está totalmente avaliado”.

Alguns anos depois – na verdade, cerca de cinco e meio –, e com meia dezena de exercícios fiscais em relatórios e contas, aquilo que resulta deste negócio é basicamente uma empresa, a Trust in News, com um gigantesco calote ao Estado e com a Impresa em vias de ter de assumir um prejuízo de pelo mais de 4 milhões nesta transacção. Sobretudo se o Estado intervir para recuperar ainda alguma parte dos 11,4 milhões de euros de dívidas acumuladas pela Trust in News sobretudo nos últimos quatro anos.

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A Visão fez 30 anos em Março deste ano e é um dos principais títulos da Trust in News.

Embora a empresa de Luís Delgado não tenha ainda dado qualquer resposta às perguntas do PÁGINA UM e a Impresa diga que “não se pronuncia sobre a situação económica e financeira de empresas exógenas”, o cruzamento de informação financeira permite concluir que só em 2018 a Trust in News terá pagado valores relevantes para saldar a compra das revistas.

Com efeito, no relatório e contas de 2018 do Grupo Impresa surge a informação de que o acordo com a Trust in News estipulava o pagamento dos 10,2 milhões de euros “em dois anos e meio”. Porém, no final de 2019, de acordo com o relatório e contas desse ano da Impresa, a dívida ainda estava nos 4,55 milhões, acrescentando-se que em 31 de Dezembro de 2018 o valor nominal da conta a receber da TIN [Trust in News] era de 6.300.000 Euros”. Mais se acrescentava que se renegociara o plano de reembolso, pelo que Luís Delgado teria de pagar 2,15 milhões de euros em 2020 e 2,4 milhões em 2021.

Não sendo claro se a renegociação implicou um abaixamento do valor do negócio, certo é que em quase dois anos – tendo em conta a realização do negócio em 2 de Janeiro de 2018 –, a Trust in News tinha pagado, no máximo, 5,65 milhões de euros à Impresa até finais de 2019. No acordo inicial – pagamento em dois anos e meio – teria de se pagar 8,16 milhões de euros até 2020 e o remanescente (2,04 milhões de euros) no primeiro semestre de 2021.

Luís Delgado (à esquerda) comprou em 2 de Janeiro de 2018 à Impresa um conjunto de títulos, entre as quais a revista Visão, num negócio oficialmente envolvendo o pagamento de 10,2 milhões de euros a ser concrtizado em dois anos e meio. Em finais de 2022 ainda faltava pagar cerca de 40% desse valor.

Mesmo assim, nesta fase, o pagamento da Trust in News não foi com verbas de Luís Delgado nem de qualquer investidor externo, porque a empresa é unipessoal (apenas detida por Luís Delgado), e tem um capital social diminuto (10.000 euros).

No balanço de 2018 da Trust in News nota-se, aliás, que foi “herdado” um passivo significativo (quase 19,3 milhões de euros) à “boleia” de um activo onde se destacava um valor atribuído às marcas (activos intangíveis) da ordem dos 10,8 milhões de euros. Entre este passivo da Trust in News destacavam-se, então, os 6,2 milhões de euros ainda por pagar à Impresa e mais 2,7 milhões de um empréstimo ao Novo Banco.

Em suma, mesmo intervencionado pelo Estado, o Novo Banco dispôs-se a emprestar a curto prazo pelo menos 2,7 milhões de euros a uma empresa com um capital social de 10 mil euros, a Trust in News, para saldar parte da compra das revistas à Impresa.

Em 2019, o Novo Banco ainda emprestaria mais dinheiro à Trust in News. No final desse ano, a empresa de Luís Delgado já devia 3,7 milhões de euros ao Novo Banco, ou seja, a dívida para esta instituição financeira aumentara cerca de um milhão de euros. No entanto, globalmente, os financiamentos bancários à Trust in News já ascendiam aos 4,5 milhões de euros.

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António Costa, primeiro-ministro, Mafalda Anjos, directora da Visão, e Luís Delgado, proprietário da Trust in News, num evento em Abril de 2018. Os contribuintes têm poucos motivos para rir: as dívidas ao Estado desta empresa já ultrapassam os 11,4 milhões de euros. E ninguém no Governo interveio.

Foi a partir de 2020 que a Trust in News praticamente deixou de pagar a compra das revistas à Impresa, altura em que também começou a não pagar ao Estado. No relatório e contas da Impresa de 2020 refere-se que o valor nominal da dívida era ainda de 4,43 milhões de euros. Ou seja, Luís Delgado apenas pagou 120 mil euros à empresa de Pinto Balsemão durante todo o ano de 2020, quando tinha prometido pagar-lhe, nesse período, 2,15 milhões de euros.

Resultado: a Impresa concordou em renegociar a dívida, remetendo o plano de reembolso para 2023, sendo que em 2021 Luís Delgado teria de pagar 300 mil euros, e depois 2,63 milhões em 2022 e 1,5 milhões em 2023.

Se a Impresa tinha esperanças ou não na palavra de Luís Delgado, não se sabe, porque “não se pronuncia sobre a situação económica e financeira de empresas exógenas”. Mas os dados são indesmentíveis. Nas contas de 2021, a Impresa declarou que o valor nominal da dívida da Trust in News situava-se nos 4.321.513 euros. Ou seja, se o compromisso do ano anterior era o de Luís Delgado pagar 300 mil euros em 2021 (de um total de 4,43 milhões), na verdade saldou apenas 110 mil euros. Mais: a Impresa já admitia vir receber apenas cerca de 3,55 milhões de euros, por ser esse o valor inscrito na rubrica “outras contas a receber”.

Antes da venda em 2018 do portfolio das revistas à Trust in News, a Impresa, fundada por Francisco Pinto Balsemão, teve de reconhecer imparidades (prejuízos de 22 milhões de euros). A venda por 10,2 milhões de euros, está afinal a ser difícil de finalizar.

Na iminência de ter de assumir perdas por imparidade ainda avultadas, da ordem dos 4 milhões de euros – com consequências imediatas danosas para os resultados líquidos – a Impresa acabou por concordar em negociar a dívida da Trust in News. No relatório de 2021 da Impresa salienta-se que houve nova revisão do “plano de pagamentos do montante em dívida, estendendo o mesmo até 2036, prevendo o pagamento de prestações mensais de 25.000 Euros, a ser realizado pela cessão de créditos futuros da TIN [Trust in News] relativo à exploração das suas propriedades digitais, que se encontra a ser gerido por um terceiro.”

Um pagamento mensal de 25 mil euros daria um total de 300 mil euros em 2022, mas mais uma vez Luís Delgado falhou. De acordo com o mais recente relatório e contas da Impresa, a dívida nominal da Trust in News situava-se, no final de 2022, em 4.094.295 euros. Ou seja, Luís Delgado pagou a Balsemão menos de 19 mil euros por mês.

Não se pode dizer que o Grupo Impresa está, para já, a “arder” muito. Só no ano passado, em cada mês, a Trust in News aumentou a dívida ao Estado em quase 270 mil euros por mês, o que deu 3,2 milhões a mais ao longo de todo o ano. Mesmo assim, “apenas” uma parte do total de 11,4 milhões de dívidas ao erário público da Trust in News, sobretudo à Autoridade Tributária e Aduaneira. Nada que aparentemente incomode Fernando Medina que continua sem esclarecer o PÁGINA UM sobre se vai tomar alguma medida face à situação da Trust in News.

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Mafalda Anjos, ao centro, é directora da Visão e foi publisher de todos os títulos da Trust in News até Dezembro do ano passado.

Em todo o caso, se houver intervenção estatal para ressarcir a dívida da Trust in News, não é só a sobrevivência desta empresa de media que estará em causa, porque tal afectará, de forma indelével, a Impresa e também bancos. Por exemplo, nas contas de 2022, a dona da Visão diz ter também uma dívida de médio e longo prazo de quase 3,5 milhões de euros ao Novo Banco e uma de curto prazo de 752 mil euros ao Millennium BCP, além de um contrato de factoring com a mesma instituição bancária de quase 1,2 milhões de euros.

Aliás, no actual cenário, até os trabalhadores poderiam sair bastante prejudicados, uma vez que o Estado, em caso de insolvência, detém primazia na alienação dos activos até ser saldada a dívida de 11,4 milhões de euros.


N.D. Pelas 02:22 horas de 27 de Julho foi corrigida a referência à situação de Mafalda Anjos como publisher das revistas da Trust in News. Essa função foi desempenhada entre Janeiro de 2018 e Dezembro de 2022. Mafalda Anjos mantém-se agora apenas com directora das revistas Visão, Visão Saúde, Visão Biografia e A Nossa Prima, conforme consta da sua página no LinkedIn.

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