O futebol, como se sabe, há muito deixou de ser um desporto-espectáculo para passar a uma das mais lucrativas indústrias a nível global.
Os contratos feitos diariamente, em todo o mundo, só terão paralelo com as áreas onde o dinheiro se conta pelos biliões (armas, petróleo, drogas lícitas e ilícitas).
Pensar que um clube pode oferecer, pela contratação de um jogador, para o período de um ano, mil milhões de euros, sendo trezentos milhões para o seu clube e setecentos milhões para o atleta, é algo que soa a irreal.
![three white-and-black soccer balls on field](https://paginaum.pt/wp-content/uploads/2023/08/jo19k0hddxi-1024x683.jpg)
E esse foi o valor que um clube (um país, na realidade) ofereceu a Kylian Mbappé para, durante um ano, envergar a camisola de uma equipa de futebol.
Para percebermos bem, o atleta receberia cerca de dois milhões de euros… por dia!
Estes exageros escandalosos poderão resultar na morte de uma galinha de ovos de ouro se os responsáveis máximos da FIFA e UEFA não colocarem um travão a estes absurdos.
O problema maior é que a justiça desportiva consegue, por incrível que pareça, ser ainda pior do que a que rege a vida na sociedade civil.
Os negócios das contratações, principalmente, com milhões de euros a serem distribuídos por empresários e dirigentes, sem um controle apertado das autoridades desportivas, são de todos conhecidos, mas ficam, sempre, impunes.
A “justiça desportiva”, e em especial no futebol, é uma treta aceitando sem o mais pequeno sinal de desagrado, as maiores vergonhas que se possam imaginar.
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Desde logo não reage ao aumento constante de uma violência vergonhosa porque assente no facciosismo.
Impedir, por exemplo, que uma criança, por pequena que seja, possa entrar num estádio vestindo a camisola do seu clube, somente porque este é o adversário da equipa “da casa”, é inconcebível.
Mas acontece, todas as semanas, em dezenas de campos, mesmo nos das equipas de topo.
A falta de rigor na vigilância à entrada dos estádios, principalmente em dias de jogos entre equipas de conhecida rivalidade, é outro problema grave porque permite a entrada de objectos e artefactos que a Lei proíbe e que põem em causa a segurança dos espectadores.
O aumento escandaloso dos preços de bilhetes para adeptos do clube rival, muitas vezes enviados para as zonas com pior visibilidade são, também, habituais sem a intervenção de quem de direito.
Mas o pior de todos os males é, sem dúvida, o desdém com que os Conselhos de Disciplina (?) analisam e “punem” futebolistas, treinadores e dirigentes que não cumprem a Lei nem, muitas vezes, as regras mais básicas da educação e do desportivismo.
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Aceitar que se lute pela vitória usando uma “agressividade” que roça a violência, os insultos mais soezes, as ameaças mais criticáveis, é inadmissível.
Tanto mais que se sabe que tudo isso é visto, hoje em dia, por milhões de pessoas em todo o mundo.
Isto para não falar das substâncias ilícitas que algumas equipas dão aos seus atletas com o único intuito de poderem aumentar, no momento, os seus índices físicos ainda que tal possa provocar males irreparáveis à saúde destes num futuro próximo.
A vitória num jogo sobrepõe-se, para alguns, a tudo o mais incluindo a vida dos seus próprios atletas.
O discurso do ódio e as atitudes irracionais dentro dos estádios, por vezes em jogos transmitidos para todo o mundo, são frequentes e, também elas, punidas com pequenas reprimendas ou castigos menores.
Tudo isto pode levar a afastar, dos campos de futebol, milhares de adeptos ou simples apreciadores de futebol.
Ninguém, no seu perfeito juízo, quer correr o risco de levar a família, principalmente crianças, para locais onde, a qualquer momento, pode haver uma luta entre dezenas de energúmenos.
![person in brown long sleeve shirt covering face with hand](https://paginaum.pt/wp-content/uploads/2023/08/nqtphr4pr60-1024x683.jpg)
Tudo isto porque a Justiça Desportiva é branda com os prevaricadores.
Várias vezes escrevi que os clubes deveriam deixar entrar, gratuitamente, em todos os jogos, as crianças, e jovens, até 15 anos.
Encheriam estádios, na maior parte das vezes vazios, valorizando o espectáculo, para além de criarem futuros fiéis espectadores.
De uma coisa estou seguro, enquanto os responsáveis máximos não criarem regras que impeçam, de uma vez, a impunidade de todos quantos incumprem em relação a todas as regras de civismo e desportivismo no futebol, este não deixará de perder adeptos.
Vítor Ilharco é secretário-geral da APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso
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