BOLETIM P1 DA CONTRATAÇÃO PÚBLICA: 29 DE SETEMBRO A 1 DE OUTUBRO DE 2023

A serralharia de Guimarães escolhida para montar blocos operatórios no hospital de Faro ganha segundo ajuste directo para… terraplanagens

yellow and black heavy equipment on snow covered ground during daytime

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Se sói dizer-se que não há duas sem três, subentendido está então que, antes disso, havendo um contrato por ajuste directo, sempre poderá vir um segundo contrato do género, por mais inusitado que seja a prestação de serviços em si face ao objecto social da empresa beneficiária.

Há sensivelmente um mês, o PÁGINA UM relatou a contratação pelo Centro Hospitalar Universitário do Algarve, e por ajuste directo, de uma empresa de serralharia de Guimarães, a Custódio de Castro Lobo & Filhos, para a montagem de duas salas cirúrgicas de um novo bloco operatório, “em estrutura aligeirada amovível em regime de aluguer pelo prazo presumível de 12 semanas”, em sistema chave na mão “com transferência da titularidade da propriedade para a entidade adjudicante findo o aluguer e respectivas ações de manutenção preventiva e correctiva”.

Pelo preço de 800.000 euros, a administração do CHUA decidiu contratar uma empresa a 600 quilómetros de distância, mesmo sem sequer fundamentada, nos procedimento do convite, a razão da escolha daquela empresa de Guimarães, que, na verdade, nem sequer tem experiência similar em hospitais públicos. Aliás, esta montagem das salas cirúrgicas foi apenas o segundo contrato público da Custódio de Castro Lobo & Filhos, sendo que o primeiro consistiu num trabalho de restauro e recuperação de peças para exposição do Centro Interpretativo D`Olival ao Azeite de D`Ouro, uma encomenda da autarquia de Alijó em Junho passado, no valor de 23.070 euros. E aí até foi após consulta prévia.

Mas entretanto na sexta-feira passada surgiu no Portal Base o segundo contrato do CHUA à mesma empresa de Guimarães, desta vez para uma tarefa ainda mais fora do âmbito dos seus habituais serviços. Com efeito, de acordo com os produtos e serviços que expõe no seu site, a Custódio de Castro Lobo & Filhos apresenta-se como uma serralharia capaz de fazer candeeiros e candelabros, chaminés e extractores de fumos, condutas para ventilação e aspiração, corrimões e gradeamentos, decoração de lojas, esculturas e troféus, estruturas e móveis metálicos e ainda placas e sinalética.

Daí até blocos operatórios no Hospital de Faro, ainda mais a serem executados a 600 quilómetros de distância, já causava uma certa estranheza, mas este segundo contrato, que foi assinado em 19 de Setembro passado, ainda se mostra mais fora da caixa: é uma empreitada de obras públicas, mais concretamente “trabalhos de terraplanagem, modelação do terreno e preparação de acessibilidades” para os tais blocos operatórios. O custo do contrato deste contrato: 199.249,60 euros, o que significa que, em duas semanas, a Custódio de Castro Lobo & Filhos fechou dois contratos públicos a 600 quilómetros de distância que lhe valerão mais de 1,2 milhões de euros, se incluirmos IVA dedutível.

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Sem explicar o motivo de ter escolhido em concreto esta empresa de serralharia civil de Guimarães, a administração do CHUA a opção pelo ajuste directo para as duas salas cirúrgicas do Hospital de Faro se deveu ao facto de dois concursos públicos lançados este ano terem ficado “desertos” e ser necessário encerrar temporariamente o bloco operatório central “da Unidade de Faro “para a realização de obras de requalificação, obras essas que só podiam desenvolver-se em simultâneo com a disponibilização dos novos blocos operatórios”.

A administração do centro hospitalar algarvio não explica, contudo, uma situação estranha: se nem a Custódio de Castro Lobo & Filhos se mostrou interessado em concorrer aos concursos que propunham um preço-base de 949.000 e depois 895.000 euros, então qual foi a razão para depois esta empresa de Gumarães ter aceitado um ajuste directo de apenas 800.000 euros, bastante inferior? E quem a convidou ou quem se lembrou de a convidar, ademais sabendo que nunca antes fora sequer fornecedora de qualquer serviço ou bem?

Quanto ao contrato de terraplanagem, que acabou por estar associado ao outro contrato, a administração do CHUA diz que se entendeu “ser urgente a preparação do terreno/espaço e das acessibilidades ao edifício atual, onde iria ser executado o contrato do procedimento concursal supra identificado, uma vez que a escavação se mostrou necessária para se poder implantar a estrutura modular que irá funcionar como bloco operatório, cumprindo todas as condições de segurança e licenciamento, enquanto o bloco central se encontrar em obras”.

Em suma, o primeiro contrato por ajuste directo puxou o segundo, até porque, segundo o centro hospitalar em declarações ao PÁGINA UM [aqui apresentadas], “só com estes trabalhos de escavação [considerados urgentes e fundamentais] é que o edifício ficaria à mesma cota que a estrada existente e bastante próximo da unidade de Cuidados Intensivos Polivalente.”

doctor and nurses inside operating room

O administração do CHUA também não explica como escolheu a Custódio de Castro Lobo & Filhos se esta empresa nem sequer detém alvará de empreiteiro de obras públicas, conforme o PÁGINA UM confirmou em consulta à base de dados do Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção. A empresa de Guimarães não respondeu ao pedido de esclarecimentos do PÁGINA UM, não dizendo assim se subcontratará alguma empresa para as obras de terraplanagem e remodelação de terreno.

A presidente do CHUA – que integra os hospitais de Faro, Portimão e Lagos – é actualmente presidida pela médica Ana Varges Gomes, que de acordo com informações veiculadas na imprensa será substituída em breve pela Direcção Executiva do Serviço Nacional de Saúde.

Este contrato dos trabalhos de terraplanagem, modelação do terreno e preparação de acessibilidades no hospital de Faro é um dos destaques do primeiro Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos do mês de Outubro. Desde Setembro, o PÁGINA UM apresenta uma análise diária aos contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura) no Portal Base. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo.

PAV


Nos últimos três dias, de sexta-feira passada até ontem, no Portal Base foram divulgados 717 contratos públicos, com preços entre os 32,97 euros – para aquisição de medicamentos, pelo Hospital Dr. Francisco Zagalo, através de consulta prévia – e os 3.849.405,48 euros – para aquisição de apólices de seguro, pela EMEL – Empresa Municipal de Mobilidade e Estacionamento de Lisboa, através de concurso público.

Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 10 contratos, dos quais sete por concurso público, dois por ajuste directo e um ao abrigo de acordo-quadro. Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 14 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: Serviços Municipalizados de Água e Saneamento de Almada (com a Endesa Energia, no valor de 3.764.154,67 euros); Autoridade Tributária e Aduaneira (com a Samsic Portugal, no valor de 1.826.207,88 euros); Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte (com a Sanofi, no valor de 426.426,00 euros); dois do Centro Hospitalar de Leiria (um com a Alcon Portugal, no valor de 213.750,00 euros, e outro com a B. Brown Medical, no valor de 109.839,00 euros); Centro Hospitalar Universitário do Algarve (com a Custódio de Castro Lobo & Filhos, no valor de 199.249,60 euros); Universidade do Algarve (com a Digitalis, Lda., no valor de 181.242,42 euros); Escola Secundária Jerónimo Emiliano de Andrade (com a EVT – Empresa de Viação Terceirense, no valor de 160.614,22 euros); dois do Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil (um com a Bristol-Myers Squibb, no valor de 153.294,68 euros, e outro com a Janssen Cilag, no valor de 102.758,88 euros); dois do Município da Nazaré (com a Su Electricidade, ambos no valor de 149.500,00 euros); Instituto Superior de Engenharia de Lisboa (com a Rolear.ON – Soluções de Engenharia, no valor de 127.113,00 euros); e a EDA – Electricidade dos Açores (com a Cgiti Portugal, no valor de 112.995,00 euros).


TOP 5 dos contratos públicos divulgados no período de 29 de Setembro a 1 de Outubro

(todos os procedimentos)

1 Aquisição de apólices de seguros

Adjudicante: EMEL – Empresa Municipal de Mobilidade e Estacionamento de Lisboa

Adjudicatário: Generali Seguros

Preço contratual: 3.849.405,48 euros

Tipo de procedimento: Concurso público


2Aquisição de energia elétrica em MT, BTE e BTN

Adjudicante: Serviços Municipalizados de Água e Saneamento de Almada         

Adjudicatário: Endesa Energia

Preço contratual: 3.764.154,67 euros

Tipo de procedimento: Ajuste directo


3Construção de edifício destinado a ERPI e CACI         

Adjudicante: Associação para o Desenvolvimento Integral da Sobreira    

Adjudicatário: Teisil – Empresa de Construções     

Preço contratual: 3.542.000,00 euros

Tipo de procedimento: Concurso público


4 Construção de equipamento destinado a Lar de Idosos, Centro de Dia e Serviço de Apoio Domiciliário

Adjudicante: Associação Aquém Renasce

Adjudicatário: Nível 20 – Estudos, Projectos e Obras

Preço contratual: 2.494.200,00 euros

Tipo de procedimento: Concurso público


5Aquisição de serviços de segurança e de vigilância humana

Adjudicante: Município de Lisboa    

Adjudicatário: Comansegur & Powershield A.C.E. 

Preço contratual: 2.292.195,60 euros

Tipo de procedimento: Ao abrigo de acordo-quadro (artº 258º)


TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no período de 29 de Setembro a 1 de Outubro

1 Aquisição de energia elétrica em MT, BTE e BTN

Adjudicante: Serviços Municipalizados de Água e Saneamento de Almada

Adjudicatário: Endesa Energia

Preço contratual: 3.764.154,67 euros


2Aquisição de serviços de limpeza – 2º e 3º trimestres de 2023     

Adjudicante: Autoridade Tributária e Aduaneira      

Adjudicatário: Samsic Portugal

Preço contratual: 1.826.207,88 euros


3Aquisição de medicamentos

Adjudicante: Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte

Adjudicatário: Sanofi 

Preço contratual: 426.426,00 euros


4Aquisição de lentes intraoculares          

Adjudicante: Centro Hospitalar de Leiria

Adjudicatário: Alcon Portugal

Preço contratual: 213.750,00 euros


5Trabalhos de terraplanagem, modelação do terreno e preparação de acessibilidades

Adjudicante: Centro Hospitalar Universitário do Algarve

Adjudicatário: Custódio de Castro Lobo & Filhos    

Preço contratual: 199.249,60 euros

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