Desde Agosto, o PÁGINA UM tem revelado as dívidas ao Estado, os ‘esquecimentos’ nas declarações no Portal da Transparência e as movimentações societárias ainda pouco claras dos accionistas da Global Media, a dona do secular Diário de Notícias – que já só vende 1.160 exemplares por dia – e accionista da Lusa, com quem o Governo negoceia compra das quotas. Tudo com base em demonstrações financeiras e registos societários da própria empresa e suas accionistas. Entretanto, Marco Galinha, o ainda CEO da Global Media, gastou 4,35 euros em serviços de correio registado com aviso de recepção para informar que as notícias “veiculadas através da plataforma noticiosa digital (…) denominada ‘Página Um’ (…) não têm adesão à realidade”. E aproveitou sobretudo para ameaçar com um processo judicial para a defesa do seu “bom nome”.
O empresário Marco Galinha – presidente do Grupo Bel que, entre outros interesses comerciais, é actualmente o quarto accionista da Global Media – declara repudiar as notícias do PÁGINA UM sobre a situação financeira e económico do grupo de media que controla, entre outros, os periódicos Diário de Notícias e Jornal de Notícias, bem como a rádio TSF. E promete, sem se saber se cumprirá, que “serão acionados os mecanismos legais e judiciais para a defesa do [s]eu bom nome”.
Na curta missiva enviada ao PÁGINA UM, Marco Galinha trata o PÁGINA UM por “plataforma noticiosa digital”, referindo que as notícias que têm sido publicadas sobre a Global Media e seus accionistas “apresentam uma visão distorcida da realidade, na medida em que insinuam práticas e condutas perpetradas pela administração da Global Notícias Media Group, SA, da qual faço parte, e que não têm adesão à realidade”.
Marco Galinha lista, em particular, cinco notícias do PÁGINA UM, algumas das quais levaram já a Entidade Reguladora para a Comunicação Social a intervir. A primeira destas notícias, publicada em Agosto passado, revelava que em 2022 a dívida da Global Media subira para os 10 milhões de euros, valor não revelado no Portal da Transparência dos Media. E com uma agravante peculiar: o aumento no calote público apenas nesse ano, da ordem dos 7,1 milhões de euros, deveu-se ao facto de a administração da Global Media Group ter optado por devolver esse montante aos sócios, para lhes reembolsar empréstimos remunerados. A notícia do PÁGINA UM baseava-se nas demonstrações financeiras da própria Global Media, nunca desmentidas.
A segunda notícia, publicada a 23 de Agosto, revelava, por sua vez, que a Global Media corrigiria, por pressão da ERC, alguns dos indicadores financeiros do Portal da Transparência dos Media, mas mantendo escondida a dívida ao Estado de 10 milhões de euros. Saliente-se que essa dívida é factual, constando explicitamente identificado no balanço da empresa de media. Acresce que o Ministério das Finanças nunca quis esclarecer os motivos para, conhecendo as dívidas ao Estado tanto da Global Media como da Trust in News (dona da Visão, entre outros títulos), não intervir.
As outras três notícias referidas por Marco Galinha foram todas publicadas este mês pelo PÁGINA UM, versando, entre outros aspectos, a possibilidade do Governo vir a comprar a quota da Global Media na Agência Lusa, apesar do calote ao Estado; as recentes movimentações da estrutura societária deste grupo de media com a propalada entrada de um fundo das Bahamas; e um perfil financeiro e económico da Páginas Civilizadas, a empresa criada pelo empresário em 2020 quando entrou no negócio dos media.
Neste último caso, a informação financeira nem sequer consta no Portal da Transparência, porque a Páginas Civilizadas não é detentora directa de qualquer órgão de comunicação social, mas apenas accionista de empresas detentoras. Em todo o caso, o PÁGINA UM expôs as demonstrações financeiras desde a sua fundação, ou seja os três anos de exercício (2020, 2021 e 2022). O PÁGINA Um também revelou, como sempre faz quando se baseia em documentos, as contas da Global Media, designadamente as demonstrações financeiras do ano passado, onde se observa a dívida ao Estado no exacto valor de 10.038.481 euros no dia 31 de Dezembro de 2022.
Apesar de todas as notícias estarem profusamente documentadas, recorrendo-se às demonstrações financeiras e registos societários – e pedindo, em alguns casos, esclarecimentos aos visados –, Marco Galinha refere, na carta enviada ao PÁGINA UM a título pessoal, que “a falta de fundamento e de rigor jornalístico da informação publicada são lesivas do meu bom nome e comportam danos reputacionais de valor (ainda) incalculável, porquanto colocam em causa a credibilidade e prestígio do meu nome, bem como a minha honorabilidade, tanto pessoal como profissional”.
N.D. Quase seria escusado dizer que o PÁGINA UM não muda uma vírgula àquilo que tem escrito sobre a Global Media, apenas fazendo esta nota para reforçar o fraco papel regulatório da Entidade Reguladora para a Comunicação Social, que apesar de ter conhecimento das demonstrações financeiras deste grupo de media, continua sem a obrigar a revelar as dívidas ao Estado no Portal da Transparência dos Media. De igual modo, se aproveita para destacar o silêncio comprometedor do ministro das Finanças sobre as dívidas dos grupos de media ao Estado. Assinale-se também que, apesar de ser bem conhecida a estratégia de pressão (SLAPP) sobre órgãos de comunicação social independentes, através de recurso aos tribunais ou a tentativas de descredibilização (e mostra-se cada vez mais evidente uma espécie de conluio entre a CCPJ, a ERC e o Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas), o PÁGINA UM não muda o seu caminho. Obviamente, temos consciência que tempos difíceis virão, à medida que mais incómodo causamos, mantemos a esperança que os nossos leitores não nos abandonarão, apoiando-nos nas nossas acções judiciais (no FUNDO JURÍDICO) ou ainda reforçando o apoio financeiro a um jornal sem publicidade e sem parcerias comerciais – ou seja, sem controlo, o que para alguns se mostra ‘assustador’.