A democracia é o pior dos regimes políticos
À excepção de todos os outros.
Winston Churchill
Já ninguém sabe onde foi que a borboleta bateu as asas e onde é que foi que esse movimento desencadeou o terramoto, mas esta nova versão do Caos que já tem crises na Ucrânia, na América, na Europa, no Médio Oriente… será que sabemos que as crises eram mesmo essas? Não vamos antes acordar amanhã e descobrir o quê, que de repente a República Centro-Africana tem todas as armas e todos os homens de que precisava para massacrar toda a gente de todos os países à sua volta porque andou secretamente a ser muitíssimo bem paga para dar guarida e espaço ao partido de extrema-direita que toda a gente achava que ia ganhar as eleições na Argentina[1]? Faz lembrar um certo permanentemente ébrio Edgar Albert Ponting que vem ajudar Lawrence Durrell como segundo-secretário para a Secção de Imprensa de Belgrado nas cenas da vida de diplomática coligidas em 1957 em STIFF UPPER LIP, e depois não dura mais do que um mês no posto por indecente e má figura. “Há anos li que ele tinha sido transferido para o Ministério das Colónias, e a partir desse dia, acreditem ou não, mal abria um jornal descobria que tinha rebentado uma crise na colónia onde Ponting se encontrava colocado nesse momento. É possível que se deva à influência de Ponting a rapidez com que o império britânico se desintegrou. Nada me surpreenderia.”
Não olhem para mim. Não estou a brincar. Sempre disse a quem aguentou ouvir-me que a globalização era uma péssima ideia, mas estar hoje a assistir à demonstração exacta disso mesmo não me faz especialmente feliz.
Num mundo horrível em que tudo é possível, a única coisa que esta nova demonstração de que o diabo existe sugere, aqui à superfície e em termos académicos, é um estudo mais aprofundado da forma como a situação americana controla o movimento de rotação da Terra em torno do seu eixo. Claro que é uma sugestão muito chata[2]. O pior é que é verdadeira, portanto temos que aprender depressa a viver com ela. A nuvem negra que paira hoje sobre a qualidade e a decência do mundo não precisou sequer da invenção dos verdadeiros Anjos Caídos. É triste, é como se até o movimento de translação da Terra em torno do Sol estivesse em risco[3], mas a verdadeira sombra que paira sobre todos nós, independentemente de quem dê a cara por ela[4], vem mesmo da Terra das Oportunidades e não vai sair de cena tão cedo. Essa sombra, de costa a costa, é projectada pelo espantalho de Donald Trump e pelas leituras que o mundo faz desse espantalho. Do seu, e do número crescente dos seus imitadores[5].
Em 2017 eu fiquei calada e composta no meu lugar enquanto, mesmo na minha cara, um comentador político por quem tenho o maior respeito dizia em directo para os americanos, e em diferido para uma parte impressionante do mundo, que a melhor forma de evitar a crise do petróleo e a escalada do aquecimento global era o investimento maciço no nuclear. Respeitei o meu papel[6], fechei os olhos, respirei fundo, e retrocedi no tempo por forma a ter outra vez 27 anos e estar a ouvir o Prof. Veiga Simão a dizer-me na cara que não tinha conseguido implementar o seu programa das centrais nucleares portuguesas por causa da série de seis reportagens que eu e o Henrique Monteiro publicámos em parceria no semanário O JORNAL[7].
Ah, isso sim.
Isso foi muito bom.
Mas qualquer um de nós, se vive em democracia e tenciona dizer o que pensa, antes de mais nada respeita o que dizem os seus parceiros e aceita o lugar que lhe é atribuído – ou, se não respeita nem aceita, avisa antecipadamente que não poderá comparecer.
Já agora, quem os tiver no sítio que esclareça que não pode comparecer por uma questão de princípios.
Eu uma vez pedi desculpa ao produtor, fiz questão de acrescentar que a recusa não tinha nada a ver com ele, e a seguir disse isso mesmo: não posso ir ao seu debate por uma questão de princípios. Recuso-me a contribuir para dar qualquer espécie de visibilidade acrescida a pessoas por quem não tenho respeito moral ou intelectual ou ambos, e nem vou dizer nomes.
Mais tarde apareceu-me no correio uma multa da BT fundamentada numa flagra de radar. Ia a guiar a a falar ao telemóvel ao mesmo tempo. E de maneira que lá passei mais uma noite a ouvir o Dick xingar-me a paciência com a questão de nós, portugueses, sermos todos uns condutores suicidas, coisa que eu, agora que era Mãe, deveria levar muitíssimo mais a sério.
“Nem sequer te orgulhas das minhas questões de princípios?”
“Não me orgulho nada do dia em que ninguém, no teu país, te contratar seja para o que for – e depois como é que vais pagar todas estas despesas?”
“Pois foi, por uma fracção de segundo até me esqueci que todos os Founding Fathers tinham escravos para o seu próprio bem e nenhum deles queria pagar impostos para o bem comum.”
O Dick também tem princípios. Também recusa embarcar em imensas minudências por uma questão de princípios. Tínhamos os dois tantos princípios, baseados em tanta cultura, que às vezes, à noite, com os putos adormecidos que nem uns anjinhos, ele me abraçava e dizia,
“Ai Clarinha por favor, vamos parar com isto, parecemos dois boxers muito velhos e muito bons que já partiram a cara toda um ao outro mas nunca mais saem do ringue,”
e adormecíamos logo que nem uns anjinhos, nós também.
Como nos casámos em Las Vegas, ainda considerámos ir divorciar-nos a Reno. Eu ainda andei para ali a cantar aquele clássico imorredoiro do Johnny Cash, I SHOT A MAN IN RENO JUST TO WATCH HIM DIE. Mas não dá. Um casamento é uma aventura e um divórcio é a treva, e não há nada a fazer a esse respeito.
A seguir fomos tomar café e eu disse,
“Dickinho, se conseguirmos ter menos princípios talvez daqui a uns anos…”
“Não,” disse ele, muito baixo, muito firme, muito gajo. “Clarinha, tu já viste bem a grande porcaria em que o mundo inteiro tem vindo a transformar-se? Se não forem as pessoas como nós a ter princípios, quem é que vai tê-los? Desculpa, a Hillary Clinton, com todas as suas ligações a Wall Street e à Alta Finança? Achas? Mesmo? Que essa gente, que controla a América, que por seu turno faz tudo o que pode para dominar o mundo, tem princípios? Clarinha?”
O Dick sempre teve, e continua a ter, este traço de personalidade irritante de ver claramente o passado, sumarizar o presente numa frase, e ter umas ideias sobre o futuro que nunca são desinteressantes. Antes de aparecer o Obama, andava excitadíssimo com a rapidez com que os latinos e os chicanos se reproduziam. Aquela gente estava a transformar-se na nova maioria populacional, ia toda votar, era toda católica, portanto, finalmente – tiro no porta-aviões. A Compaixão ia entrar nas prioridades do País Mais Poderoso do Mundo.
Depois apareceu o Obama e estivemos três horas aos berros de grandes visões no Skype. Ele convenceu-me que era possível quando ainda ninguém sabia dizer Barak.
Depois vivemos durante oito anos com um governo que agora, visto daqui, parece um franchising das Nações Unidas.
Mas, exactamente durante esse Intervalo do Bem, fomos obrigados a aprender as lições mais amargas de todas. O Presidente do País Mais Poderoso do Mundo pode ser bonito, um grande dançarino, um grande cantor, um grande stand-up comedian, um gajo que arrepia toda a gente quando se atira mesmo à jugular, um político que detesta o Putin ainda mais explicitamente do que a Princesa Diana detestava o Príncipe Carlos, o grande herói que consegue, por fim, pôr a funcionar um Sistema Nacional de Saúde tão bem montado que Donald Trump teve quatro anos para espernear mas não conseguiu desmontá-lo[8], o ser humano que chama sonhadores[9] às pessoas que dantes eram conhecidas como imigrantes ilegais e dá mesmo tudo por tudo para regularizar as suas vidas[10].
Os seus discursos podem ser bestiais, a sua mulher pode ser linda, podem estar os dois indiscutivelmente apaixonados e dedicar todo o tempo que tiverem às filhas, e mais. Michelle pode abraçar a solo causas dificílimas para os americanos, como por exemplo correr as escolas dos cinquenta estados para estimular alunos e professores no sentido de comerem menos[11] e se mexerem mais. Pode não ter medo de dançar ela própria na televisão, para mostrar que fácil e que curtido que é dedicar quinze minutos de intervalo a uma cena de aeróbica. Pode fazer coros para o Bruce Springsteen com um à-vontade total, e agarrar na pandeireta para marcar o ritmo do GLORY DAYS como se nunca fizesse mais nada na vida. Pode fazer discursos de improviso. E – no total oposto do desastre pessoal de Hillary – toda a gente concorda: “she’s a sweetheart.”.
Quando aqueles dois se retiraram era só apresentador de late night show atrás de apresentador de late night show, na rádio e na televisão, a implorar-lhe que se candidatasse ela a seguir.
Ela ria-se, mas ria-se mesmo, e começou a dar uma resposta que acabou por transformar-se num refrão extremamente apetecível,
“Watch out, DC, here I come![12]”
E era um sonho tão lindo que foi preciso aqueles dois desaparecerem mesmo de cena para…
… que horror, foi só nessa altura que saltaram das névoas marginais todas aquelas sombras que estavam escondidas por trás da luz.
Essas sombras continuam a nunca se ver bem, mas desde que agarraram nas rédeas nunca mais as largaram, e é exactamente como na história do Ricardo Salgado, nós não podemos provar absolutamente nada mas sabemos que são elas que mandam em nós.
Pessoal, vocês estão bem a ver o xadrez do inferno que agora se joga a toda a nossa volta? Estão a ver bem que trémula que já se tornou a noção da democracia, quando num total de 27 países há quatro que votam contra a continuação do apoio da União Europeia à Ucrânia e toda a gente faz disso uma grande desgraça, como se fosse obrigatório votar em bloco, ao melhor estilo ditatorial? Num mundo destes, as questões de princípios não poderiam ser mais importantes. O respeito tem que começar a ser ensinado nas escolas. Anteontem, no fim de uma explicação, disse a um miúdo de catorze anos que teve a lata de me fazer perguntas muito ordinárias sobre a minha vida amorosa[13] que, antes de mais nada, ele nunca deveria ter podido fazê-las estritamente por uma questão de respeito, e ele recuou um passo, abriu muito os olhos, respirou fundo, e acabou por perguntar,
“O que é uma questão de respeito?”
Ainda por cima, não esqueçamos que o mundo sempre foi assim desde que temos registos da actividade humana. Os jardins de Shangri-La sempre estiveram à mercê de vandalismos sacralizados no intervalo entre duas batalhas sanguinolentas travadas no âmbito de uma guerra interminável com uma tendência raivosa para rebentar em nome de um deus qualquer, ou mesmo, pura e simplesmente, em nome de formas diferentes de venerar o mesmo deus – é ver como isso abunda desde que os gregos cilindraram os troianos, desde que os vikingues invadiram a Mongólia, desde que os hunos desceram até França, desde que Hypatea de Alexandria foi lapidada por uma turbamulta de cristãos em puro estado de histeria porque preferia a Filosofia à Religião, desde que Henrique VIII mandou decapitar o seu grande amigo Thomas More apenas porque ele se recusou a tornar-se anglicano e a sua filha Maria Tudor mandou cinco mil súbditos para a fogueira apenas porque eles se mantinham protestantes em vez de se converterem ao catolicismo, enfim – é rememorar todos estes lugares-comuns, mais todas as actividades diabólicas dos condutores de seitas como a dos seiscentos americanos que o reverendo Jones levou consigo para a Guiana em pleno século XX para lhes ordenar que se suicidassem em massa depois de envenenarem em massa, ordem que a seita acatou com tanta limpeza como a das meninas apaixonadas por Charlie Mason que esfaquearam a Sharon Tate, é eu contar-vos que aos dezanove anos, ao fim de três semanas, o meu filho mais velho fugiu aterrorizado da sua primeira experiência de vida independente com mais outros três rapazes num apartamento para os lados das Amoreiras porque eles passavam a noite inteira a meter linhas de coca enquanto viam na TV-Cabo programas sobre os Illuminati e sobre as seitas Satânicas, é deixar o puto dormir uma noite na cama da Mãe para conseguir dormir mesmo, é voltar a embalá-lo como dantes, engolir em seco, e recordar, uma vez mais, que a humanidade tem uma face lunar que quanto menos a gente tiver que ver melhor.
O pior é que, em tempos como este, temos que vê-la todos os dias.
E o condutor de seita diabólica mais diabólico de todos é, sem dúvida, o Donald Trump.
Se me disserem que Putin é um ditador bastante mais aflitivo do que Trump, e que, muito provavelmente, a sua longa escola no KGB lhe permite ter hoje em dia uma boa metade do mundo na mão, eu concordo incondicionalmente. Qualquer psicanalista que proponha a tese de Putin ter passado a infância a sonhar que havia de ser um novo czar de uma nova Grande Mãe Rússia está certamente cheio de razão, e qualquer geoestratega que acrescente que ainda por cima o cabrão conseguiu mesmo alçar-se exactamente a essa posição ainda completa melhor a composição. E por aí fora, devido a várias outras palavras acabadas em mente, tais como folha, automóvel, e paraquedista. Putin é o veneno russo personificado, é possível que daqui a uns anos seja o dono de nós todos e também da TAP, e tudo isto se vê bem e se entende muitíssimo bem.
O que torna Trump incomparavelmente mais diabólico que Putin é que ele já é o dono de nós todos e também da EDP, mas, como as suas manobras foram congeminadas nas sombras que se escondiam por trás da luz dos dois mandatos Obama, e ainda por cima o gajo é bruto que nem uma porta e um consumado bandido que se orgulha da sua esperteza que lhe permitiu não pagar um cêntimo de impostos durante vários anos seguidos e ao ser desmascarado pelos democratas transforma essa esperteza num slogan de campanha[14], nada do que lhe diz respeito se vê bem ou se entende bem.
A única coisa que se vê muito bem é que há cada vez mais dirigentes espirituais no mundo inteiro que vêem em Trump o modelo perfeito de indecência e brutalidade a seguir por forma a capturar o entusiasmo de todo o lixo dos seus países – e levem a taça que isto até Jesus sabia, qualquer país é uma lixeira infecta à espera de ter condições para cobrir todo o terreno livre à sua volta. Depois abrirá as portas às hienas e às gaivotas, esta nova fauna mantém o lixo controlado com muito prazer, e nós umas vezes somos necessários para limpar o chão de um novo arranha-céus na Malásia e outras vezes somos absolutamente descartáveis. O que já não somos, quando chegar a hora, é donos do nosso destino. E ainda bem. Quem é que quer ter que pensar no seu destino?
Que neura.
O nosso destino, para falar bem e depressa e inequivocamente, é sempre muita mau.
Ainda por cima – e este desastre inacreditável Trump já conseguiu semear como sizânia pelas sete partidas do mundo – já nenhum povo acredita na fiabilidade do sistema eleitoral do seu próprio país. Com este horrível presente envenenado já a extrema-direita americana conseguiu minar o chão que a humanidade ainda vai tentando pisar para sair da lixeira. Não adianta. As notícias são todas falsas e os votos foram todos manipulados, portanto a democracia nem sequer existe a não ser nos tais supracitados e muito louvados romances russos onde se aprendem todos os segredos do funcionamento do Mal.
E nós, os discípulos, já nos tornámos melhores do que os mestres.
Até convivemos fraternalmente com as hienas.
Somos o futuro.
Deixem-nos passar.
Clara Pinto Correia é bióloga, professora universitária e escritora
[1] Isto agora é mesmo assim, havendo um partido de extrema-direita que concorra a qualquer eleição já nem se faz trabalho de casa: é evidente que essa eleição será falsificada, e que, consequentemente, esse partido vai ganhar.
[2] A ter que escolher uma única explicação para o controlo do movimento de rotação da Terra, eu por mim prefiro a de Isaac Newton, que atribuiu esse controlo ao trabalho árduo, constante, e seriamente matemático dos anjos. Este controlo explicava imensas passagens estranhas das Escrituras através de diversas operações de cálculo baseadas em geometrias que devem ter feito do Pitágoras o morto mais feliz do mundo.
[3] Sobre este, Newton preferiu nem se pronunciar. Cerca de setenta anos antes, o luterano Johannes Kepler, que estava em Praga a fazer os horóscopos diários do Imperador católico Rudolfo da Baviera, já tinha estragado a festa a toda a gente quando percebeu que as posições irregulares dos planetas enquanto giravam em torno do sol se devia ao facto de as suas órbitas não serem esféricas, como sempre se pensara, mas antes elípticas. O próprio Kepler odiou este resultado, e foi muito claro a esse respeito quando o publicou “por respeito para com Filosofia”. A esfera é o símbolo da perfeição. A elipse é o símbolo de tudo quanto é caótico e ficou para sempre inacabado.
[4] Ou queira parecer que dá, um apetite que já não serve nem para vender jornais, mas serve sempre para aumentar ainda mais a confusão.
[5] Nem que mais não seja, porque é bastante mais fácil berrar do que reflectir. Mas isto é só a base antiquíssima por onde começa a história de todas as tragédias humanas, incluindo aquelas que nos são relatadas minuciosamente por Diogo do Couto, João Baptista Lavanha, e Francisco Vaz d’Almada, nas HISTÓRIAS TRÁGICO-MARÍTIMAS. Muito berra toda aquela gente. Às vezes, como no caso da Grande Nau Santo Alberto, berra e morre afogada com a terra ali mesmo à vista. Mas como chegar a terra, por muito bem que ela se visse? Lá está – haveria que reflectir. Já agora, também haveria que ter reflectido antes de desobedecer sistematicamente às ordens da Coroa e não fazer qualquer espécie de manutenção nas Grandes Naus da Carreira das Índias durante todo o tempo em que elas estavam aportadas em Goa. Enfim. Banalidades.
[6] Estava ali para falar dos benefícios e malefícios da Reprodução Medicamente Assistida, por causa do livro escrito em co-autoria com o Scott Gilbert FEAR, WONDER, AND SCIENCE, que ia ser publicado em breve pela Columbia University Press. Por acaso estudei criteriosamente a energia nuclear durante o meu curso de Biologia, sei por razões muito sérias que é a pior solução possível para toda e qualquer crise e das energéticas quanto menos se falar melhor, e claro que me apeteceu vituperar tudo isto – mas não competia a nenhum dos convidados interromper brutalmente o moderador.
[7] Talvez o Henrique ainda tenha essa série, ou saiba onde ela está. O tema é intemporal. Lembro-me de termos começado o primeiro artigo incitando o leitor a ler mesmo, com a seguinte promessa: “Pode ler tudo até ao fim descansado. Verá que não falaremos de passarinhos nem uma única vez.” E, se bem prometemos, melhor cumprimos.
[8] Não sei se isto, à época, ficou suficientemente claro em Portugal, mas nunca tinha existido qualquer espécie de SNS na América. Quarenta milhões de americanos sem dinheiro para comprarem o seu próprio Seguro de Saúde bem podiam esticar o pernil diante das Urgências dos Hospitais, que todos aqueles médicos, com todos os seus Juramentos Hipocráticos, nem sequer olhavam para a porta: sem Seguro de Saúde, ninguém podia entrar num hospital americano. Antes do Obamacare entrar em efeito no Massachusetts, precisei de fazer um exame mesmo chato, uma punção espinal, e nem queria acreditar: despacharam-me sem anestesia logo ali na Urgência, para eu poder voltar para casa pelo meu pé assim que os analgésicos começassem a fazer efeito. O Seguro que a Universidade proporcionava aos Professores Estrangeiros não pagava cá mordomias tais como refeições e internamentos.
[9] Durante oito anos, antes de Trump começar a construir a vergonha do Muro e a separar as suas famílias, aquelas pessoas foram os dreamers. Os estudantes universitários que falavam inglês conseguiram chegar ao ambicionado Cartão Verde. A prazo, há de permitir-lhes naturalizarem-se, e, a seguir, chamar pais e filhos. Desde que a Duck Dynasty fique onde está a matar patos.
[10] Conseguiu regularizar tantas, de forma tão hábil, que ainda hoje não há percentagens. Percentagens sérias implicariam que seria fácil desencadear progroms sérios. Há coisas que os negros americanos sabem melhor do que ninguém.
[11] E melhor. A maioria dos americanos desconhece o sabor da fruta e dos legumes. E nunca bebeu água na vida.
[12] “Cuidado, Casa Branca, aqui vou eu!”
[13] Amorosa é como quem diz. Eu com 68 anos e o menino a fazer-me perguntas sobre a minha vida sexual. A parte mais desastrosa é que o Josué não estava, com toda a evidência, minimamente consciente da sua própria ordinarice e das razões óbvias que tornavam aquelas perguntas inaceitáveis.
[14] “Yes, America! Can you hear me! I didn’t pay taxes! THAT PROVES THAT I’M SMART!” A audiência levanta-se a aplaude-o de pé. Milhões de pessoas orgulham-se da esperteza do seu dirigente espiritual. A gente nunca viu nada assim e sente a cabeça a andar à roda.