Os dois arguidos da empresa acusada de traficar influências no Governo para a aprovação ilícita de um data center foram a correr renunciar à administração para evitar a prisão preventiva. O juiz de instrução relevou essa decisão. Mas ninguém se terá apercebido que, afinal, Afonso Salema e Rui Oliveira Neves eram também, desde Janeiro passado, gerentes de uma subsidiária que estaria a preparar projectos de energia em Sines. Assim, os dois arguidos podem continuar a conviver alegremente na holding Start Campus, uma vez que compartilha a sede com a sua subsidiária, a Start Campus Energy, numa sala da Torre 1 das Amoreiras, em Lisboa.
Os arguidos Afonso Salema e Rui Oliveira Neves, peças-chave da Operação Influencer, continuam afinal a manter ligações à denominada Start Campus, apesar de terem apresentado renúncia das funções de administração daquela empresa para reduzirem a probabilidade de prisão preventiva após a detenção na passada terça-feira passada.
De acordo com uma investigação do PÁGINA UM, os dois responsáveis pelo projecto do polémico data center em Sines, mantêm os cargos de gerentes numa subsidiária integralmente detida pela Start Campus, coincidindo na sede, numa das torres das Amoreiras, em Lisboa.
Ontem, o juiz de instrução Nuno Dias Costa, apesar de ter aplicado uma caução de 600 mil euros à Start – Sines Transatlantic Renewable & Technology Campus – a denominação formal da sociedade anónima que promove a construção do data center no litoral alentejano –, relevou o facto de Afonso Salema e Rui Oliveira Neves, “fortemente indiciados” pela prática de crimes de tráfico de influência e oferta indevida de vantagem, terem renunciado à administração da sociedade anónima, uma vez que retiraria “qualquer perigo que no caso pudesse existir, nomeadamente o de continuação da actividade criminosa”.
E concluía o juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal que, tendo estes arguidos “ficado impossibilitados, por sua iniciativa, de participar na actividade social daquela empresa, encontra-se vedada a possibilidade de lhes ser imposta qualquer medida de coacção diversa do termo de identidade e residência, que já prestaram”.
Sendo certo que já foram publicadas as renúncias tanto de Rui Oliveira Neves como de Afonso Salema à administração da Start – Sines Transatlantic Renewable & Technology Campus, pedidas respectivamente nos dias 10 e 13, certo é que estes gestores mantêm-se como gerentes da Start Campus Energy, uma subsidiária da holding detida por dois fundos, a irlandesa Foxford Capital L5 Designated Activity Company e a britânica Pioneer Sines Holdings Limited.
Com efeito, já este ano, em 30 de Janeiro, a holding conhecida abreviadamente por Start Campus criou uma sociedade por quota unipessoal, com apenas um euro de capital social – o mínimo exigido por lei –, dando-lhe a denominação de Start Campus Energy, Lda. O reduzido valor do capital social dessa empresa é simbólico, até porque, mesmo no caso da holding, a opção estratégica de gestão tem passado sobretudo, não pela captação de accionistas (ou sócios), mas sim por atrair fundos de investimento por via do mercado de empréstimos obrigacionistas.
O objecto social desta novel empresa indicia que a holding estaria a equacionar projectos também nas energias renováveis na região de Sines, em redor da área do data center, em área também protegida, uma vez que se apresenta como uma empresa de “comercialização, operação, prestação e gestão de qualquer tipo de produtos energéticos”, incluindo também a comercialização de direitos de emissão de dióxido de carbono e a criação de “instalações, infraestruturas, obras e quaisquer outras actividades relacionadas e conexas”.
Por estranho que parece, apesar dessas informações serem públicas, tanto o Ministério Público como o juiz de instrução criminal não suscitaram esta relação de Rui Oliveira Neves e de Afonso Salema com a holding Start Campus. Nem a colocaram em causa. Depreende-se assim que, nada tendo ficado explicitado no despacho do juiz, tanto Rui Oliveira Neves como Afonso Salema pode subir ao 12º andar da Torre 1 das Amoreiras, e tratarem na sala 1 os assuntos da Start Campus Energy, nas mesmíssimas instalações da holding Start Campus.
Recorde-se que Rui Oliveira Neves é sócio da conhecida sociedade de advogados Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados, que decidiu suspender este causídico e também o advogado João Tiago Silveira, ex-secretário de Estado da Justiça, também arguido na Operação Influencer.
O PÁGINA UM tentou obter esclarecimentos sobre estas e outras matérias junto da própria holding e do seu advogado, Paulo Farinha Alves, mas não obteve resposta.