E o metro ali tão perto...

Web Summit: AICEP ‘estoira’ 421.675 euros em alugueres de minivans

por Pedro Almeida Vieira // Novembro 23, 2023


Categoria: Exame

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Anteontem, o presidente da Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP) reuniu com a Embaixada da China sobre o ambiente de investimento em território nacional, com foco na fileira produtiva da mobilidade elétrica. Mas no início deste mês, decidiu alugar 50 minivans convencionais para transportar ignotos convidados para a Web Summit. Não foi a primeira vez: já no ano passado, a agência que procura investimento externo decidiu gastar uma boa maquia a levar gentes para uma zona bem servida de transportes públicos. A factura disto tudo já supera os 420 mil euros. Despesismo ou investimento? Da parte da AICEP ‘veio’ o silêncio.


Na filosofia política que fez germinar, florescer e amadurecer a Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP), consolidada ao longo de décadas de um mix de marketing diplomático com arte da sedução, certamente não há despesas – há apenas investimento, porque a despesa, se improdutiva, ganha o sufixo ‘ismo’, tornando-se despesismo, enquanto os investimentos subentendem benefícios públicos futuros, mesmo se à primeira vista esse tal investimento surja aos olhos dos incréus como um gasto supérfluo que, enfim, se confunde com despesismo.

Por esse motivo, por compreender que nem todos os gastos – aparentemente supérfluos – sejam mesmo uns despesismos incompreensíveis, o PÁGINA UM quis saber junto da AICEP o motivo pelo qual decidiu celebrar duas aquisições de serviços para transporte de passageiros para as últimas edições da Web Summit. Não houve resposta.

Filipe Santos Costa, primeiro à direita, é o presidente da AICEP desde o Verão passado.

Sabe-se assim apenas que, apesar da localização da Web Summit ser próxima da estação de metro do Oriente, o primeiro contrato de aluguer de minivans, assinado em Outubro do ano passado entre a AIECP e a Choice Car, custou 206.425 euros (IVA incluído). Para a edição deste ano – que decorreu entre 11 e 14 deste mês –, já por concurso público (em que apenas concorreu outra empresa), a Choice Car sacou mais 215.250 euros (IVA incluído).

Em conjunto, deste modo, apenas em passeios de minivans, transportando não se sabe quantas pessoas, a AICEP pagou, para estas duas edições da ‘feira tecnológica’, um total de 421.675 euros para serviços de cerca de uma dúzia de dias. No caderno de encargos do último contrato apenas se refere que os “serviços serão prestados na área metropolitana de Lisboa e/ou regiões adjacentes à mesma, prevendo-se o transporte de passageiros entre o Aeroporto de Lisboa, as instalações da Feira Internacional de Lisboa, os diversos hotéis onde se encontram hospedados os participantes e outros locais e eventos organizados pela Web Summit”.

Os montantes dispendidos pela AICEP para estas deslocações dariam para adquirir 63.890 bilhetes diários de metro, ou, se a opção fosse táxi, para pagar 28.783 viagens da redacção do PÁGINA UM até ao Centro de Congressos no Parque das Nações. Noutra perspectiva, daria mais de quatro mil passeios turísticos de tuk-tuk até ao Parque das Nações, ainda com direito a passagem por Marvila para desfrutar de street art e visitar a Fábrica de Unicórnios.

António Costa Silva (ministro da Economia), Katherine Maher (CEO da Web Summit) e Carlos Moedas (presidente da Câmara Municipal de Lisboa) na abertura de oitava edição da ‘feira tecnológica’.

Diga-se ainda que, apesar deste avultado ‘investimento’ de mais de 420 mil euros no comércio interno – uma vez que a Choice Car tem capital inteiramente lusitano, apesar da denominação em língua anglo-saxónica –, a presença da AICEP pela Web Summit tem sido sempre bastante discreta.

Na última edição, o ponto alto atingiu-se no encontro do actual presidente da agência, Filipe Santos Costa, com uma comitiva de empresas luxemburguesas presidida pelo grão-duque herdeiro daquele país. O PÁGINA UM não conseguiu confirmar se Filipe Santos Costa se dirigiu até à Web Summit usando uma das minivans alugadas, que terão transportado um número indeterminado de pessoas a partir de incógnitos sítios para o Parque das Nações, e respectivo regresso.

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