Vários partidos pretendem comemorar o aniversário do golpe de 25 Novembro de 1975 debaixo de enorme contestação de outros.
Há quem diga que os ideais do 25 de Abril só foram atingidos com o 25 de Novembro e quem garanta que festejar essa data tem como único objectivo menorizar o papel histórico do Dia da Liberdade.
Ramalho Eanes, uma das principais figuras do golpe que, a 25 de Novembro de 1975, pôs fim ao PREC (Processo Revolucionário em Curso), como ficou conhecido o período que se seguiu ao 25 de Abril de 1974, que acabou com a ditadura do Estado Novo, que durou meio século, garante que esta polémica não passa de uma “trica sem interesse”.
E acrescenta, segundo o “Público”: “O 25 de Novembro foi um momento fracturante e eu entendo que os momentos fracturantes não se comemoram, recordam-se e recordam-se apenas para reflectir sobre eles. No caso do 25 de Novembro, devíamos reflectir por que é que nós portugueses, com séculos e séculos de história, com uma unidade nacional feita de uma cultura distintiva profunda, por que é que chegámos àquela situação, por que é que chegámos à beira da guerra civil”.
Recordemos então:
Depois do 25 de Abril de 1974 houve uma deserção generalizada dos políticos do Regime.
Às primeiras eleições livres concorreram vários partidos sendo que nem um se apresentava como sendo “de direita”.
Aparecia o CDS com a definição de centrista, algo que já exigia alguma coragem, reconheça-se, mas todos os outros, PPD incluído, defendiam o “socialismo”.
Obviamente que aqueles que se sentiam prejudicados com a perda de bens materiais (autênticas fortunas, em muitos casos) e influência política, não ficaram parados e as manifestações de desagrado, pelo caminho político que se seguia, começaram a ganhar alguma força até que, a partir de Julho de 1975, principalmente no norte e centro do país, a situação se agravou com bombas a destruírem as sedes do Partido Comunista.
A esquerda não ficou parada e preparou-se para se defender e retaliar.
Muitos dos seus militantes receberam milhares de armas do exército, criando autênticas milícias.
O País vivia à beira de uma guerra civil.
Era o “Verão Quente”.
Os golpes sucediam-se e as Forças Armadas dividiram-se com alguns militares a apoiar a extrema-esquerda.
A 20 de Novembro o Governo, na altura chefiado pelo Almirante Pinheiro de Azevedo, depois de ter sido “sequestrado” por trabalhadores da construção civil, na Assembleia da República, entra em greve.
A 25 de Novembro os paraquedistas ocupam as bases de Tancos, Monte Real, Montijo e o Comando da Região Aérea, no Monsanto, em Lisboa.
Esta revolta serviu para justificar o avanço do grupo militar dos “moderados” que, há meses, preparava um plano militar, com o total apoio do Partido Socialista que foi, sem dúvida, o grande vencedor nesse dia, para responder a um eventual golpe da esquerda radical.
O que fez com sucesso.
É verdade que a democracia ficou mais forte depois desse dia, mas tentar diabolizar a esquerda, mesmo a extrema-esquerda, esquecendo os ataques bombistas, os assassinatos, o terror espalhado pelos energúmenos da extrema-direita, ou por esbirros à ordem destes, é um ultraje.
Igualmente estranho é ver, hoje, a extrema-direita a tentar chamar, para si, os louros dessa vitória sob o silêncio, envergonhado do Partido Socialista.
Mesmo políticos pequeninos, como Carlos Moedas (espero que seja bom bailarino para não cair no desagrado dos portugueses adeptos de provérbios), colocam-se em bicos de pés em busca de protagonismo e tentando ajudar um líder antecipadamente condenado ao fracasso.
A escolha da data foi infeliz e com intenções diferentes das anunciadas.
Na verdade, durante 49 anos ninguém notou a falta de tal comemoração.
Sim, graças aos acontecimentos desse dia evitou-se, provavelmente, uma tragédia.
Só que, quem a pretende comemorar não estava, na altura, do lado de quem o conseguiu, mas bem ao contrário de quem levou ao país à beira de um confronto sangrento.
O 25 de Novembro é uma data a recordar, sem dúvida.
Mais com alívio do que com alegria.
Já o 25 de Abril é diferente.
É uma data que só os grandes podem explicar.
Como, por exemplo, Sophia de Mello Breyner,
“Esta é a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo”
25 de Abril, SEMPRE!
Vítor Ilharco é assessor
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