JOSÉ PAULO FAFE NÃO APRECIA LEI DA TRANSPARÊNCIA DOS MEDIA

CEO da Global Media deixou Tal&Qual em falência técnica e com processo de 250 mil euros às costas

por Pedro Almeida Vieira // Dezembro 20, 2023


Categoria: Imprensa

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José Paulo Fafe ‘refundou’ o semanário Tal & Qual em 2021, mas bastaram-lhe dois anos para deixar a empresa gestora em falência técnica e um passivo de 334 mil euros. Mas também não quis mostrar à Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) as contas da empresa Parem as Máquinas, que criou para gerir o semanário, nem elaborou o obrigatório relatório do governo societário. O regulador ainda andou meses a tentar ‘ajudar’ a Parem as Máquinas, mas perante o “manifesto desinteresse no cumprimento das obrigações legais”, a paciência esgotou-se. A ERC deliberou assim abrir um processo de contra-ordenação que, pela elevada gravidade, pode atingir um máximo de 250 mil euros. A comunicação da ERC para a Parem as Máquinas seguiu para o mesmo endereço da Páginas Civilizadas, o accionista maioritário da Global Media, liderada por José Paulo Fafe. Fica tudo em casa.


O actual CEO da Global Media, José Paulo Fafe, não foi homem para deixar apenas a empresa Parem as Máquinas, detentora do semanário Tal & Qual – das quais foi gerente até Maio passado e director, respectivamente –, com dívidas de mais de 334 mil euros e em falência técnica ao fim de dois anos de existência. Deixou-lhe também um ‘legado’: um processo de contra-ordenação por violação reiterada das regras da Lei da Transparência dos Media. A coima a aplicar pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social pode chegar aos 250 mil euros, sendo que a sanção mínima é de 50 mil.

A deliberação do regulador foi hoje divulgada, tendo sido aprovada no passado dia 6, e relata as pacientes diligências na tentativa de levar José Paulo Fafe, então gerente, a enviar os elementos financeiros da empresa do Tal & Qual, ‘refundado’ em 2021, bem como os relatórios do governo societário.

José Paulo Fafe, ex-jornalista, ex-gerente da Parem as Máquinas e actual CEO da Global Media, que anunciou rescisões de até 200 colaboradores.

De acordo com a deliberação, a Unidade de Transparência dos Media (UTM) da ERC começou por contactar a Parem as Máquinas no início de Abril deste ano quando foi detectada ausência completa de informação financeira relevante e o relatório do governo societário desde a sua inscrição. E adianta-se, em seguida, que após uma troca de mensagens electrónicas, “a Regulada [ou seja, José Paulo Fafe, que era então o seu representante legal] entrou em contacto com a ERC, por via telefónica”, acrescentando-se que “demonstrou falta de conhecimento e manifesto desinteresse no cumprimento das obrigações legais da transparência dos media”.

Mesmo assim a UTM da ERC prestou-se a colaborar com José Paulo Fafe, enviando-lhe em 23 de Maio “uma minuta de Relatório de Governo Societário para auxílio da entidade [Parem as Máquinas] na respetiva elaboração”. Mas os meses foram passando, e nada.

“À presente data, os serviços da UTM verificaram que a Regulada não tomou qualquer ação para sanar as faltas, de forma completa, nem apresentou qualquer fundamento para essas faltas, mantendo-se em incumprimento relativamente ao reporte dos elementos obrigatórios”, salienta-se na deliberação da ERC, concretizando que se verifica “a falta do reporte legalmente obrigatório dos indicadores financeiros de 2021 e de 2022, nos termos do artigo 5º da Lei da Transparência e do artigo 3º do Regulamento, e encontram-se em falta os elementos indicados no quadro 6 dos Relatórios de Governo Societário relativos aos anos de 2021 e 2022, nos termos do artigo 16º da Lei da Transparência, e, por remissão do nº 2, do artigo 5º, nº 1 a 7, do Regulamento.” E diz ainda que “falta igualmente identificar o Responsável pela Orientação Editorial da Publicação Periódica Tal&Qual e atualizar a estrutura do capital social em conformidade com o Registo Comercial”.

Tal & Qual, ‘refundado’ em 2021 quis mostrar irreverência, enquanto, em simultâneo, nunca quis mostrar as contas exigidas pela Lei da Transparência dos Media.

De facto, grande parte da parca informação que actualmente consta no Portal da Transparência dos Media encontra-se errada ou desactualizada, constando no registo sócios que já saíram da empresa há meses, e mesmo José Paulo Fafe surge ainda como gerente da Parem as Máquinas, apesar de já ter renunciado e deixado mesmo de ser sócio desde Outubro. Aliás, neste momento, nos registos da ERC nem sequer aparece qualquer responsável editorial do Tal & Qual, apesar de na ficha técnica deste semanário surgir o nome de Jorge Lemos Peixoto.  

Nessa medida, não restou outra alternativa à ERC, agora liderada por Helena Sousa, do que instaurar um processo de contra-ordenação, que será agora conduzido pela Unidade de Contraordenações para a fixação da coima por uma mais que evidente violação da Lei da Transparência dos Media. Como a falta, ainda mais reiterada, e nem sequer por negligência, é considerada “muito grave”, a coima mínima prevista é de 50 mil euros, podem ir até aos 250 mil euros. A fixação da sanção dependerá também do preenchimento ou não dos elementos em falta, que são de preenchimento fácil se a Parem as Máquinas estiver para aí virada.

Saliente-se que, apesar da formalização da sua saída da empresa Parem as Máquinas (e do Tal&Qual) em finais de Maio, e a sua subsequente entrada em Junho na gerência da Páginas Civilizadas (dominada pelo fundo das Bahamas), José Paulo Fafe nunca se desligou da realidade do Tal & Qual. Na verdade, apesar de ser gerida pela Parem as Máquinas, o título deste semanário está registado no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) como pertencente à Global Media. E além disso, actualmente a Páginas Civilizadas compartilha a mesma sede, no Tagus Park, da Parem as Máquinas e do semanário Tal&Qual. Ou seja, ‘tudo em casa’.

O francês Clement Ducasse é o beneficiário efectivo do World Opportunity Fund que controla agora a Global Media. A ERC quer que o grupo de media identifique os investidores ‘dentro’ do fundo, mas José Paulo Fafe já veio dizer que é “uma coisa de doidos”.

Recorde-se que José Paulo Fafe deixou o semanário Tal & Qual e a Parem as Máquinas para assumir recentemente o cargo de presidente executivo da Global Media por indicação de um fundo sedeado nas Bahamas (World Opportunity Fund), que possui indirectamente a maioria do capital social do grupo que detém, entre outros, o Diário do Notícias, o Jornal de Notícias, O Jogo, o Dinheiro Vivo e a TSF, além de uma participação relevante na Lusa.

Embora se conheça já o beneficiário efectivo do fundo bahamiano – o especulador financeiro globetrotter francês Clement Ducasse –, revelado em primeira mão pelo PÁGINA UM, a ERC tem estado a exigir à Global Media a identificação de pessoas ou entidades que tenham suficientes participações no World Opportunity Fund que impliquem direitos superiores a 5% naquele grupo de media. Na semana passada, José Paulo Fafe considerou, em entrevista ao Eco, ser “uma coisa de doidos”, a ERC exigir à Global Media “a identificação dos detentores de unidades de participação” do World Opportunity Fund, admitindo que nem ele sabe quantos depositantes tem. O azar de Fafe é que, apreciando ou não a transparência nos investimentos nos media, a lei lhe exige saber e indicar quem tem mais de 5% dos direitos de voto.

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