Salários de Dezembro pagos de imediato se accionistas minoritários aceitarem negócio.

Fundo das Bahamas propõe desmembrar Global Media e ficar com DN e TSF

por Pedro Almeida Vieira // Janeiro 21, 2024


Categoria: Imprensa

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Não é tanto um ‘dividir para reinar’, mas mais um ‘dividir para sobreviver’. O World Opportunity Fund abriu o jogo entre os accionistas directos e indirectos da Global Media: quer sair deste grupo e criar sozinho um novo, levando consigo o Diário de Notícias, a TSF, o Açoriano Oriental e outros títulos icónicos, que pretende ‘revitalizar’, entre os quais a Grande Reportagem. Para Marco Galinha e os accionistas minoritários da Global Media ficarão o Jornal de Notícias e O Jogo, e ainda as participações na Lusa e no Diário de Notícias da Madeira. O PÁGINA UM teve acesso a documentos internos, onde se garante que se as negociações chegarem a bom termo, o fundo das Bahamas paga de imediato os salários em atraso de Dezembro, no valor de cerca de um milhão de euros. Depois, tudo dividido, será ‘cada um por si’.


Dividir para sobreviver. O World Opportunity Fund (WOF) quer desfazer-se do controlo da Global Media, através da cedência da sua posição na Páginas Civilizadas, tendo proposto, como contrapartida, ficar com o Diário de Notícias, a TSF e o Açoriano Oriental, bem como alguns títulos como o Motor24, o Tal & Qual e ainda o 24 Horas e a Grande Reportagem, já extintos.

A proposta, segundo apurou o PÁGINA UM, terá sido já apresentada na semana passada em reunião de accionistas da Global Media, onde estiveram representantes do fundo das Bahamas e os empresários Marco Galinha, José Pedro Soeiro e Kevin Ho. De acordo com o documento da proposta, o WOF manifesta a “disponibilidade (…) na cedência imediata da sua participação nas Páginas Civilizadas), adquirida em Setembro do ano passado, que incluirá não apenas o valor das quotas como também os suprimentos já concedidos à Global Media.

Considerando as informações veiculadas este mês pelo seu representante e actual CEO da Global Media, José Paulo Fafe, o WOF terá investido 10,2 milhões de euros desde Setembro, significa assim que o fundo das Bahamas abre mão daquela verba e pretende uma divisão dos activos (e passivos) deste grupo de media.

Em termos mais concretos, o PÁGINA UM sabe que a estratégia do WOF passa por criar um novo grupo de media, separando-se assim da Páginas Civilizadas e, portanto, da Global Media, que ficaria com o Jornal de Notícias e jornal desportivo O Jogo, bem como com as participações na Lusa e no Diário de Notícias da Madeira (11%). E sem haver, aparentemente, contrapartidas financeiras directas, já que o WOF assume que, além do valor da quota de 51% na Páginas Civilizadas (1,02 milhoes de euros), terá ainda feito suprimentos e assumido outras despesas que totalizam os 10,2 mihões de euros.

Na prática, caso avance esta proposta, será a concretização do desmembramento de um dos maiores grupos de media do país, embora em profunda crise financeira nos últimos meses, designadamente salários em atraso e um programa de rescisão em curso de até 200 trabalhadores. Com a entrada do WOF em Setembro do ano passado, as revistas Evasões e Volta ao Mundo já tinham formalmente saído da esfera da Global Media, passando para a empresa Palavras de Prestígio, detidas apenas por Marco Galinha.

Se avançar esta proposta do fundo das Bahamas – que nunca revelou o valor do seu portefólio, nem quem são os investidores principais de um instrumento financeiro apenas disponível a ricos –, o novo grupo garantirá a sobrevivência da empresa que detém a TSF – a Rádio Notícias – Produções e Publicidade – e as suas cinco subsidiárias (Difusão de Ideias, Notícias 2000 FM, Pense Positivo, Rádio Comercial dos Açores, TSF – Cooperativa Rádio Jornal do Algarve, e TSF – Rádio Jornal Lisboa), assumindo as dívidas e o cumprimento do Regime Excepcional de Regularização Tributária, que atingem compromissos de cerca de 1,75 milhões de euros.

No caso do Diário de Notícias, além de assumir a tentativa de recuperar um periódico que já só vende cerca de 1.500 exemplares, o WHO quer garantir para si a posse do Arquivo Histórico e do seu acervo. Recorde-se que em finais de Julho de 2022, o Governo classificou como “tesouro nacional” o arquivo administrativo e o arquivo da redacção entre 1864 e 2003, bem como o Espólio de Alfredo da Cunha, custodiado pela Global Notícias.

A Açormedia também estará em cima da mesa numa reunião dos accionistas que deverá ser discutida numa assembleia-geral da Global Media, também desejada pelos seus accionistas minoritários. Apesar de ser uma pequena empresa açoriana, com um volume de negócio inferior a 1,4 milhões de euros, e uma redacção de sete jornalistas, controla o mais antigo jornal português, o Açoriano Oriental, fundado em 1835.

Por fim, o WOF que ficar também com o jornal digital Motor24, bem como três títulos icónicos da imprensa portuguesa registados em nome da Global Media no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI): 24 Horas (1998-2010), Grande Reportagem (1984-2005, com interrupções) e Tal & Qual, semanário publicado entre 1980 e 2007, mas que foi “ressuscitado” pelo próprio actual CEO da Global Media em 2021 por cedência de Marco Galinha. Em todo o caso, este título é publicado e gerido pela Parem as Máquinas, que não tem ligação à Global Media e deixou de ter Fafe como sócio.

A proposta encaminhada para os sócios minoritários da Global Media – José Pedro (20,4%) e KNJ Global, de Kevin Ho (29,35%) – pelo WOF coloca a pressão sobre a questão salarial que atinge grande parte dos trabalhadores deste grupo de media. Em caso de concordância no negócio, o fundo das Bahamas diz que “assumiria o pagamento dos salários em dívida referentes ao mês de Dezembro, sendo que os relativos a Janeiro seriam pagos já consoante a divisão proposta”. Ou seja, desligando-se do Jornal de Notícias e de O Jogo, a WOF deixaria não só de pagar salários a partir deste ano como passaria a ‘batata quente’ do avanço ou recuo do programa de rescisões para Marco Galinha e os outros accionistas da Global Media, ou eventuais novos investidores que desejassem ficar com a quota do fundo das Bahamas na Páginas Civilizadas.

O PÁGINA UM sabe que a operação necessitará de uma maioria qualificada dos accionistas da Global Media, que, saliente-se, não tem directamente capital do empresário Marco Galinha, mas como envolverá a participação da Páginas Civilizadas (onde Marco Galinha detém uma participação relevante, mas minoritária) somente deverá avançar se houver um consenso.

Saliente-se, aliás, apesar de controlar actualmente este grupo de media por via de um acordo parassocial que lhe deu o direito de nomear dois dos três gerentes da Páginas Civilizadas, o WOF tem, na verdade, apenas uma participação efectiva de 25,63% da Global Media. Directamente, a empresa KNJ Group, de Kevin Ho, tem 29,35% e José Pedro Reis Soeiro 20,4%. De forma indirecta, através de uma empresa sócia da Páginas Civilizadas, a Norma Erudita, o empresário António Mendes Ferreira detém 7%, restando a Marco Galinha e ao seu Grupo Bel (e sempre de forma indirecta) menos de 18%.

Créditos das fotografias: Fotos 1, 2 e 3 (©somosjn) e 4 (©dnemluta)


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