Primeiro projecto de execução em 2012 'caducou' por obra não avançar

10,4 milhões: Santiago Calatrava ‘saca’ segundo ajuste directo para ampliação da Gare do Oriente

por Pedro Almeida Vieira // Fevereiro 12, 2024


Categoria: Exame

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São mais 10,4 milhões de euros a cair no bolso de Santiago Calatrava, o arquitecto valenciano que concebeu a Gare do Oriente, uma belíssima ‘peça de arte’ concebida para a Expo 98 mas de funcionalidade questionável, por ser inóspita para os passageiros ferroviários. Por razões de direitos de autor, e por um projecto de execução concluído tem 2012 ter expirado, a Infraestruturas de Portugal viu-se agora obrigada a pagar um segundo contrato para se avançar para a ampliação de oito para 11 linhas desta estação do Parque das Nações no âmbito do projecto da Alta Velocidade. O contrato foi assinado na sexta-feira e divulgado hoje no Portal Base.


A Infraestruturas de Portugal celebrou na sexta-feira passada um contrato por ajuste directo com o arquitecto espanhol Santiago Calatrava com vista à execução da ampliação da Gare do Oriente e do viaduto ferroviário que será inserido no projecto da Linha de Alta Velocidade.

O contrato está avaliado em 10,4 milhões de euros, com IVA incluído, e foi entregue ao arquitecto espanhol, residente na Suíça, por estar em causa a alteração de uma obra com direitos autorais, protegida por lei, embora seja questionável se o projecto de execução do túnel ferroviário não pudesse ser alvo de concurso público. Além disso, será a segunda vez que Calatrava era planear, nas duas últimas décadas, a ampliação desta estação no Parque das Nações, em Lisboa.

aerial photograph of railroad

Recorde-se que a Gare do Oriente – construída praticamente no mesmo local da demolida Estação dos Olivais e com custos da ordem dos 30 milhões de euros – foi inaugurada em 18 de Maio de 1999, no âmbito da Expo 98, surgindo mais como ‘peça de arte’, uma espécie de ícone da renovação urbanística então em curso, mas que foi ganhando estatuto no contexto rodoferroviário de Lisboa.

Porém, sempre apresentou gravíssimas deficiências funcionais, sobretudo por ser um espaço demasiado amplo e aberto, quase inóspito no Inverno e em dias de chuva. Do ponto de vista arquitectónico foi considerada obra arrojada, tendo mesmo sido distinguida na categoria Arquitectura dos Brunel Awards em 1998.

Em todo o caso, como o local será uma peça importante no contexto da Alta Velocidade, Calatrava teve assim direito a um ‘brinde’ para executar o novo projecto num prazo de 465 dias, pois nenhum outro arquitecto, de acordo com o Código de Direitos de Autor e Direitos Conexos, que inclui obras de arquitectura, pode ‘mexer’ em obra de arquitecto vivo, sob risco de pagamento de indemnizações.

Santiago Calatrava nasceu em Valência em 1951. Tinha 47 anos quando foi inaugurada a Gare do Oriente.

Actualmente, a Estação do Oriente dispõe de oito linhas para o serviço convencional, pelo que, de acordo com estudos da extinta Rede Ferroviária de Alta Velocidade (RAVE), serão necessárias mais três linhas para o serviço de Alta Velocidade desde o Porto e desde Madrid. Essa ampliação vai implicar que a actual estação imjplica o alargamento para poente, posicionando-a sobre a estação do metropolitano. E é porque “a sua viabilidade impõe o necessário respeito pela solução da estrutura atual, replicando-a sob as novas plataformas”, que teve de ser contratado o valenciano Santiago Calatrava.

Excepto o preço do contrato, este desfecho não é necessariamente uma surpresa agora que o Governo quis garantir o avanço da LAV para aproveitar fundos comunitários. Porém, de acordo com documentos da Infraestruturas de Portugal, Santiago Calatrava vai fazer sensivelmente o mesmo que fez quando foi contratado em 2008 pela RAVE para a “prestação de serviços de arquitectura e engenharia relativos à ampliação da Estação do Oriente e sua adaptação à Alta Velocidade”.

O PÁGINA UM não consegui ainda apurar qual o valor pago pela RAVE ao arquitecto espanhol, mas sabe que, apesar do projecto de execução ter sido entregue em 2011, já não pode ser agora usado, porque, “como não chegou à fase de obra (…), o respectivo contrato que lhe deu origem [foi] extinto”.

Ou seja, basicamente, com o contrato de 10,4 milhões de euros, a Infraestruturas de Portugal confessa que “pretende, agora, que o projeto desenvolvido pela ex-RAVE em 2011 seja revisto e atualizadoi, de acordo com o normativo legal em vigor e com os novos requisitos técnicos e funcionais do projecto AV [Alta Velocidade] e, complementarmente à ampliação, que seja desenvolvido o projecto de reabilitação da estação atual”.

No registo do Portal Base deste contrato, publicado hoje, refere-se que a avaliação custo-benefício deixou de ser aplicável aos procedimentos de formação de contratos que se destinem à execução de projetos financiados ou cofinanciados por fundos europeus. Ou seja, é gastar sem saber se vale o investimento.


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