EDITORIAL - OPINIÃO DE PEDRO ALMEIDA VIEIRA

Sou jornalista, não fiz greve e não tenho a cara de pau do Luís Delgado

people having rally in the middle of road

por Pedro Almeida Vieira // Março 14, 2024


Categoria: Opinião

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Sou sincero. Não fiz greve nem ponderei fazer. Enquanto em simultâneo – como sócio maioritário e gestor de um pequeno órgão de comunicação social, com um mísero capital social de 10.000 euros, mas sem dívidas – escrevia mais um caso de contratações públicas de duvidosa legalidade e de questionável ética, congeminava argumentos para escrever um editorial sobre a razão para não participar na greve, mesmo sendo sindicalizado.

Tinha uns quatro ou cinco motivos para explanar, mas eis que me enviam um texto de um outro gestor de uma empresa de comunicação social também com um capital social de 10.000 euros que escreveu este texto na revista Visão:

Hoje estou em greve! Sou jornalista, não no ativo, mas acompanho todos os que vão parar neste dia. E incentivo essa manifestação de vontade, fortemente.

Não é só o SNS, a Educação ou a Habitação que estão na Constituição. Também está a Comunicação Social. E para essa Carta Fundamental e fundacional ter existido, foi necessário ter uma Imprensa livre, respeitada e segura.

people having rally in the middle of road

Esta nova AR [Assembleia da República] e Governo têm o dever e a obrigação de prestar a mais básica atenção a toda a Comunicação Social.

Era o que faltava preocuparem-se apenas com a RTP, RDP e Lusa. Merecem, sem dúvida, mas são a ínfima parte da Imprensa em Portugal.

Com a Imprensa em greve, está suspenso um dos pilares fundamentais e independentes da Democracia. Assim não pode ser!

Este texto é – como já exposto no título deste meu editorial – da autoria de Luís Delgado – um ex-jornalista, que é muitíssimo diferente de se ser “um jornalista, não no ativo” –, o detentor único da Trust in News, a empresa de media com um capital social de 10.000 euros (como a empresa do PÁGINA UM) que almejou comprar 17 títulos à Impresa no início de 2018, num nebuloso contrato que incluiu dinheiros do Novo Banco, a ser então intervencionado por um mecanismo de capitalização com fundos estatais.

Ora, o “jornalista, não no ativo” Luís Delgado, que hoje fez greve, é um dos algozes da imprensa (e personifica todos), que transformaram a nobre função de watchdog do Jornalismo num servil vassalo do poder e dos interesses económicos e financeiros por força de sucessivos endividamentos e falta de ética e vergonha na cara.

Photograph of a Vintage Typewriter on Table

Em Economia há duas máximas: sem um produto de qualidade não há procura; e a falta de ética conduz a práticas de concorrência desleal, que a todos afectará.

Ora, foi o “jornalista, não no ativo” Luís Delgado, que hoje fez greve por um jornalismo credível e independente, que, com os seus ‘produtos’, agora enxameados de parcerias comerciais promíscuas, foi permitindo, com a conivência do Governo socialista (a ‘festa’ começou desde o início de 2018), uma gestão ruinosa que acumulou sem parança dívidas astronómicas ao Estado, que foi escondendo publicamente, porque nem a Entidade Reguladora para a Comunicação Social as queria conhecer (o regulador está mais preocupado com outras minudências).

Senão vejamos. A Trust in News devia no final de 2018 cerca de 942 mil euros ao Estado. Um ano depois subia para quase 1,6 milhões; em 2020 pulou para 5,1 milhões de euros; a seguir para 8,2 milhões e em 2022 estava já em 11,4 milhões de euros. O PÁGINA UM foi o primeiro e único jornal a falar deste vergonhoso estado de uma empresa de media, em Julho do ano passado.  

Nada aconteceu. E o “jornalista, não no ativo” Luís Delgado surge agora a fazer greve e a armar-se em arauto do jornalismo credível e independente. Faltou explicar como gere a independência e a credibilidade da informação em 17 títulos da imprensa portuguesa quando a empresa gestora tem um capital social de 10.000 euros e um passivo total de 27,2 milhões de euros.

PÁGINA UM revelou em Julho de 2023 que a Trust in News tinha um passivo de 27,2 milhões de euros e dívidas ao Estado de 11,4 milhões de euros, Ministério das Finanças sabia e nunca se pronunciou.

Quem manda – ou quais são os custos para a Imprensa de qualidade – numa empresa onde o tal “jornalista, não no ativo”, único dono de fachada, controla, afinal, menos de 0,04% dos activos?

Estamos a brincar?  

Querem que eu faça greve para satisfazer a pedinchice do tal “jornalista, não no ativo”, Luís Delgado, e contribuir assim para que a “nova AR e Governo” concretizem “o dever e a obrigação de prestar a mais básica atenção a toda a Comunicação Social”? E assim, por tabela, ajudar a falida e vendida Trust in News? Ou a Global Media? Ou grande parte dos ‘mastodontes’ que nunca aceitarão que, em tempos difíceis, auxiliar os maus projectos só prejudicará os bons, porque são eles os maus?

Saibam que a Lei de Gresham aplica-se também à Imprensa. Por isso, querer salvar empregos a todo o custo na Imprensa será o fim do Jornalismo. A greve dos jornalistas faria todo o sentido, mas apenas se fosse por motivos fundamentais, a começar por expulsar do mercado os lobos que se vestem de cordeiros.


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