As queixas de lisboetas relativas a problemas com cães, incluindo devido a dejectos na rua e também ao ruído, levaram o jornalista Rui Araújo a fazer uma reportagem sobre o tema, a qual foi publicada n’ O Jornal Ilustrado em 1989.
Mas o que fica gravado na mente do leitor não são as queixas dos munícipes, mas o olhar de cães abandonados vistos pela lente de Inácio Ludgero, que generosamente disponibilizou as fotos originais para a republicação desta reportagem no PÁGINA UM.
«O cão está a mijar-me na jante, mas se mando vir sou logo tratado de mafioso ou de facho… tá bem tá, isto é uma indecência, pá!»
O rapaz até é capaz de ter razão. E não é o único revoltado. Há cada vez mais lisboetas a queixarem-se da chatice dos cães. Aos vizinhos e amigos. À PSP, à GNR e à Câmara. Cartas e mais cartas. Um rol de críticas e insultos.
O problema canino é, hoje em dia, uma das principais causas de protesto epistolar ao município. As mesmas críticas, os mesmos apelos… e as mesmas respostas à reportagem traduzem uma revolta generalizada. Há mesmo gente em situação desesperada. Muitas das missivas enviadas ao Departamento de Higiene Urbana e Resíduos Sólidos da Câmara Municipal de Lisboa já não denunciam apenas o chichi, o cocó, as doenças, o ruído ou o medo: «… no 2 dt.º habita uma senhora chamada Odete e um filho de 11 ou 12 anos em que têm desde há 4 anos um casal de cães, e agora desde uns meses para cá mais 2 cães filhos do casal que já tinha, portanto desde há 4 anos que habita esta casa, nunca levou qualquer dos animais a rua, fazendo estes todas as necessidades em casa, o que ocasiona além do ladrar e uivar a toda a hora, um cheiro horrível, o que torna impossível viver ali nessa situação. A Polícia já veio aqui pela 3.ª vez a meu pedido, julgando eu que a senhora resolveria as coisas sem grande problema, mas em vão, pois ela nem sequer abre a porta a ninguém. Numa altura em que as doenças desconhecidas como a CIDA (sic) e outras aparecem e desenvolvem—se em ritmo acelerado como as combater? Com uma higiene assim não se pode esperar outra coisa. (1) Termino pedindo…» Ou fazendo sugestões.
Porque também há quem as faça. Algumas são até bem imaginativas. «Porque não rebocar também os animais e as pessoas acompanhantes; quando andam pela Avenida de Roma e Rua Frei Amador Arrais a fazer aquelas porcarias? Montes de fezes de cães — ou cadelas, claro está — em plenos passeios, que quase não nos deixam espaço para pôr os pés. As crianças, então, espezinham tudo, que é nojento! Como se pode tolerar tais cenas…?»
É verdade. Apesar de 10% das queixas recebidas na Câmara — na opinião de Manuel Boavida, responsável do Departamento de Higiene Urbana e Resíduos Sólidos da CML — não terem qualquer fundamento.
Os cães devem estar a aumentar. À medida da cruzada anti canina. E ninguém sabe ao certo quantos rafeiros — do Alentejo ou não —, perdigueiros, caniches e demais bicharada canina existem por essa Lisboa fora. Um elemento do Instituto Nacional de Estatística (INE) confessa exasperado que contar os cães (era só o que faltava). A contagem do gado já dá um «trabalhão». Sondagens e estimativas, é coisa que não existe. A Câmara Municipal de Lisboa anuncia apenas 5 mil licenças em 1988. Os cães não licenciados e/ou não vacinados tanto podem ser 20 mil como 200 mil. É como as taxas da RTP… Mas pouco importa, agora. Não haverá assim tantos cachorros como isso. A única certeza é que o número de cães está directamente associado ao nível de vida. Daí que os países da Europa com mais cães sejam a França, a Grã—Bretanha e a Alemanha.
Ai solidão!
E as razões conscientes — ou não — para terem bicho? Os citadinos europeus têm cão por necessidade de companhia, snobismo, segurança ou aventura. É o que afirmam os psicólogos. É o que dizia McLuhan: as pessoas têm cão para relembrarem que também vivem… Pelo menos, nas cidades: num prédio de 15 andares é mesmo uma necessidade vital. Seja como for, por cá as razões serão as mesmas.
«O desejo de adquirir um cão pode estar ligado ao consumismo: o cão torna—se então um objecto exibitório. A sua raça é importante», resume um psiquiatra do Hospital Militar de Lisboa. Mas há ainda outras motivações. «O cão funciona como algo que aumenta a segurança» e é conveniente não esquecer que para muita gente a presença do animal «anuIa a sensação de impotência social». É uma explicação. Não será porventura a única. Há também quem tenha cão por razões de tradição ou mais prosaicamente de eficácia. É o caso dos cães de guarda no campo. Joaquim Manuel Pedro, proprietário de meia dúzia de terras de cultivo dispersas lá para as bandas de Pernigem (Sintra) desde sempre teve cães de guarda. Cães de raça e agora rafeiros. Labuta fora. Os animais guardam casa e terreno. «A minha Paquita e o meu Pantufas são dos rafeiros mas para me guardar a casa serão até bem melhores do que muitos cães de raça», afirma sorridente, sem complexos, enquanto os animais saltitam à sua volta. Contentes. Com o repórter do outro lado do muro.
Mas os cachorros podem significar mais do que simples elementos do modo de vida: uma imagem de marca. Carolina de Mónaco possui o Onyx, um pastor e a Tiffany, um Yorkshire, que as colunas sociais apadrinharam. A pacatez lisboeta não vai, contudo, tão longe. Aníbal Cavaco Silva não tem, oficialmente, cão. Mário Soares idem. Torres Couto tem um cocker de um mês (ainda sem nome) que parece não ter. Só Carlos Carvalhas reconhece ter um animal.
O cão é o companheiro dos tais laços profundos de dedicação. «E o cão pode ainda funcionar como o elemento anti—solidão, o filho, o companheiro tanto dos solitários como dos marginais, crianças e velhos, gente com genuína disponibilidade afectiva», acrescenta o psiquiatra. Um cão é algo estimulante, vivo, próximo. Os publicitários utilizam de resto extremamente bem essa imagem para nos convencer a comprar latas de comida, jornais ou tão simplesmente votar num general com cão emprestado para o efeito. Mas afinal onde termina a moda e começa a necessidade? O desenvolvimento dos cães na cidade poderia traduzir uma recusa da forma de sociedade — a da urbe. Mas se a tal existência harmoniosa é para muitos citadinos um mito não é menos certo que a cidade não está nada preparada para a presença de tantos animais domésticos: cães, gatos, pássaros, etc. E ninguém faz praticamente nada…
A ineficácia das leis
O Governo está, aparentemente, pouco preocupado com o fenómeno da proliferação dos cães nas cidades. E mais concretamente em Lisboa. A Lei Base do Ambiente (11/87 de 7 de Abril) é um extenso documento de 52 artigos. Ignora pura e simplesmente a questão da poluição canina. A legislação complementar (Artigo 51) necessária à regulamentação (eventualmente dos resíduos sólidos) será «obrigatoriamente» publicada no prazo de «um ano» a partir da data de entrada em vigor do diploma: 1987. Já lá vão mais de 2 anos e nada…
Resta o Decreto—Lei 317/85 (2 de Agosto) (2), ou, por outras palavras, um insólito documento sobre Raiva, Abandono, Crueldade e Sevícias. Em teoria, as câmaras municipais «sempre que razões de salubridade ou tranquilidade da vizinhança o imponham, poderão determinar a remoção de quaisquer cães ou outros animais de companhia». É o artigo 10.º. É o mais problemático. Até hoje — e já lá vão mais de 3 anos — nenhuma ordem da Câmara foi cumprida… E ainda não há qualquer penalização por não acatamento da decisão da Câmara. Os homens da Câmara não podem entrar em casa dos donos ou detentores dos animais. Os recursos — possíveis — nem sequer chegam a ser elaborados. «Uma solução talvez possa ser o crime de desobediência», adianta Manuel Boavida sem grande convicção. É que o problema — esquecido até 1988 — não é de fácil resolução. Desde o princípio do ano a Câmara já instaurou uns 80 processos. A Polícia Municipal também terá alguns… Sem resultados concretos. Pelo menos até agora…
O número de cães em Lisboa não será, apesar de tudo, preocupante. A gravidade da situação resulta sobretudo da inexistência de condições. A capital dispõe de 1.600 quilómetros de passeios cuja largura média ronda os 2,25 metros. O orçamento da Câmara Municipal para a limpeza urbana — resíduos sólidos— tem vindo progressivamente a aumentar no último triénio: 2.179.845 contos em 1985, 2.689.254 contos em 1986 e 3.932.723 contos em 1987 — últimos dados disponíveis (3). Estes valores reflectem as imputações de Despesas com Pessoal, Despesas Correntes e Despesas de Capital. Limpeza, limpeza… o dinheiro nem é assim tanto como isso.
«A questão dos animais esteve adormecida durante largos anos e as verbas que nos são agora destinadas estão de acordo com aquilo que se fazia: muito pouco», comenta Manuel Boavida para quem o problema não é político mas técnico. E está decidido a pedir mais meios. Para limpar mais e melhor. E sensibilizar a população — à semelhança do que foi feito com os caixotes do lixo cor de laranja. Uma operação com algum sucesso.
Pernas de carteiro, um petisco
É um cálculo curioso. E impossível. Ninguém sabe quantas toneladas de resíduos sólidos e líquidos (de cães) são depositadas diariamente na via pública. Mas qualquer pessoa dirá quais os inconvenientes da negligência. Os mais infelizes poderão mesmo apresentar a factura da clínica ou do hospital onde foram tratados por terem sido mordidos ou vergonhosamente escorregado no cócó de cão. As companhias e o Instituto de Seguros ignoram a dimensão do drama. Até porque em Portugal «o fenómeno da responsabilidade civil ainda é um mito», como costuma dizer Vasco Pardal, um especialista de seguros. A esperança — também neste domínio — é 1992. Até agora não foi formulado um único pedido de indemnização. «Mas estamos a encarar a hipótese de ir mais longe através da criação de um seguro de vida para cães.» A sua instauração depende da prontidão com que o Instituto de Seguros de Portugal despache o pedido.
As raras estatísticas existentes referem apenas as inesperadas aventuras dos carteiros dos CTT. Trinta e cinco carteiros acidentados por causa dos cães em 1988 — contra 45 no ano anterior. Consequências: 19 carteiros incapacitados ou 394 jornadas de trabalho perdidas. Os homens do giro apeado são injustamente as principais vítimas dos cães: 26. Os carteiros motorizados são muito menos maltratados: 5. A maioria dos acidentes teve lugar na via pública, Os cães preferem — visivelmente—os membros inferiores (25 agressões) e pouca apetência parecem ter pelo tronco…
Os CTT criaram mesmo instruções para evitar problemas aos carteiros provinciais. «Os CTT podem determinar a suspensão da distribuição postal domiciliária em locais situados dentro de recintos vedados e protegidos por cães à solta que possam ameaçar a segurança dos carteiros». Esta medida tem sido pouco aplicada. Toda a gente sabe que os homens que não gostam dos cães parecem feitos de uma matéria seca e duvidosa…
Direito à vida
E animais maltratados há muitos. Embora António Nunes, encarregado do canil municipal afirme que os animais sejam mais vítimas do desleixo do que dos maus tratos o facto é que as poucas posturas e leis são letra morta para muitos donos.
Os portugueses seriam mesmo — na opinião de um veterinário da Linha — um dos povos que «pior» trata os cães. «Muitos nem sequer sabem educar e tratar dos filhos, quanto mais dos pobres dos animais…», conclui. Cães abandonados em autoestradas, atropelados e voluntariamente estropiados perto da Docapesca (Pedrouços), enforcados na linha de Sintra, envenenados ou abatidos a tiro.. uma triste banalidade.
«Há os amigos dos animais e o amigo do animal», conta Francisco António da Silva, presidente da Sociedade Protectora dos Animais. O amigo do animal «quando lhe aparece um rafeiro pela frente prega-lhe um valente pontapé, dá-lhe uma chicotada, tira-lhe uma perna!».
Alguns dos exageros da Sociedade Protectora dos Animais são confirmados nomeadamente pelas cartas recebidas na Câmara. «A inquilina do 1.º andar direito tem 5 corpulentos cães, sem quaisquer condições sanitárias tanto de higiene como de vacinação que não existe, provocando cheiro nauseabundo muito difícil de suportar dado que fazem todas as necessidades dentro da habitação. Alguns dos cães encontram-se bastante doentes» e a dona nada faz.
A Sociedade tenta ajudar como pode. Mas os 3.000 sócios, os parcos meios também não dão para muito: um canil de 20 lugares na Barão de Sabrosa, alguma assistência jurídica e um centro de saúde onde uma consulta — de psiquiatria, ainda não as há em Portugal (4)— custa 300 escudos, uma extracção de dentes 140 escudos, uma amputação de dedos entre 70 e 170 escudos, um parto entre 300 escudos e 420 escudos. Para sócios. Os outros pagam um pouco mais caro. Mas será sempre mais barato do que nos raros canis privados existentes e logicamente sempre cheios — de Lisboa e arredores.
O Canil Municipal (Hipódromo do Campo Grande) apesar de decadente — a sua transferência já está prevista há mais de 10 anos — (5 ) também oferece alguns serviços clínicos como a vacinação anti-rábica ou a esterilização das cadelas. (6 ) Ou ainda a morte. Por injecção ou electrocução. Teoricamente, três dias depois de serem apanhados sem identificação. Ou 8 dias depois, para aqueles que trazem uma coleira. 28 cães para abater aguardam num pátio de cimento dividido em terreiros cúbicos com um metro. Há de tudo. Cães de raça e rafeiros. Animais velhos saudáveis e doentes. Animais novos. E Eduardo Figueiredo, tratador/apanhador.
— O senhor trabalha aqui no canil…
— Os prazos aplicados pela gente não são bem esses. O costume é só abatê-los 5 dobros (sic) depois da data prevista. Eu estou nos bichos há 20 anos. Sou até a favor que os bichos andem em liberdade…
— Mas…
— Eles têm o direito a viver como qualquer pessoa.
— Mas quem os mata é o senhor?
— Pois sou! Mas não gosto disto! Não gosto mesmo nada disto…
Os cães são apanhados sempre durante a noite. E são apanhados cada vez mais. Exactamente 1.273 em 1987 e no ano seguinte 1.379. Uma pequena percentagem é restituída aos donos: 197 em 1987 contra 253 em 1988. Os outros são abatidos. (7 ) Sempre às seis da madrugada. Através de choque eléctrico ou de duas injecções: uma para anestesiar e outra para provocar uma paragem cardíaca. Se não houver atraso ou ninguém os recuperar. . Momentos antes.
Melhores que as pessoas
Maria Manuela, 59 anos, reformada, benfeitora da União Zoófila já recuperou muitos porque «matar os nossos melhores amigos é o crime mais horrível que se possa imaginar». Também não se conforma com o facto de os animais do canil apenas receberem uma refeição por dia.
Apareceu mais uma vez no canil da CML para «salvar» um pastor alemão «velhinho e abandonado». Em casa tem um cão. Confessa que na sua rua apoia mais cinco ou seis animais «desprotegidos». Aproveita para lançar uma mensagem aos «homens de boa vontade»: «os portugueses precisam de alguma ajuda educacional para tratar bem dos animais. Gostam deles quando são pequenos. Depois, abandonam-nos. São atrasadíssimos… Devem tratar bem os cães!» Ouso perguntar se também ajuda pessoas.
— Ajudar pessoas? Ora essa! As pessoas são ingratas. Um animal nunca nos abandona… São verdadeiros. Profundos. Amigos. Até têm uma alma se bem que diferente da nossa— segundo a teoria de S. Francisco de Assis.
«Louvado sejas, ó meu Senhor, com todas as tuas criaturas». Cântico do Irmão Sol. S. Francisco de Assis. A lápide é peremptória. E no Cemitério dos Cães do Jardim Zoológico raras são as campas sem lápides a louvar a docilidade — a amizade — dos cães ou o Senhor. Lorde, Lady, Cracky, Paju, Pantufinhas, Palhaço, Faruk, Kimba, Boby «grande amigo jamais te esqueceremos», Lorde «amigo dócil e fiel, como tu não há, a nossa saudosa homenagem», Carocha «minha querida, a saudade não tem fim nos nossos corações, a casa está vazia, tudo nos fala de ti», Pushak (Born Saigon, Vietnam 10-1969. Died Lisbon, Portugal 1-1983».
Há algumas campas em que o número do anonimato é quebrado por um cravo ou um malmequer de plástico. E se os cães tivessem alma? Mesmo sem ser no sentido teológico…
Acertar o passo
Entretanto os cães lá se vão propagando apesar da acção do Munícipio. E da legislação inadaptada — Código Penal (o animal é uma “coisa”), Código Civil (propriedade) e Decreto—Lei 3 17/85. A esterilização não tem sucesso. A sujidade aumenta. Ao contrário do que sucede por essa Europa fora.
Exemplos: campanhas de contracepção na Holanda e Noruega. Taxas específicas na Áustria, Bélgica e Suíça. Multas por poluição nos EUA (100 contos de multa por deixar o cão fazer cocó nos passeios de Nova Iorque) e, na Suíça… (Os «azulejos» para cães instalados nos passeios das Avenidas Novas em Lisboa tiveram um êxito relativo). A Islândia optou por uma solução deveras radical: baniu completamente os cães da capital. «A deportação maciça provocou ulteriormente a morte de muitos animais porque os exilados devastavam o gado». Outras políticas dissuasoras: a URSS adoptou uma severa taxa especialmente para cães — porventura por razões de penúria. Derradeira solução: em muitos países asiáticos como a China, Tailândia, Filipinas, Vietname (para não citar o caso de Macau) os cães são abatidos por uma questão puramente gastronómica.
Cócó de cão, rasteira traiçoeira…
Soluções? Até agora em nome do interesse geral (ou talvez mais prosaicamente dos votos) ninguém teve vontade e coragem para contrariar os proprietários. Agir. O responsável do Departamento de Higiene Urbana e Resíduos Sólidos da CML afirma que não tem de se «limitar a apanhar cães». É preciso fazer mais. Dispor de uma legislação coerente. Sensibilizar rapidamente a população e técnicos — através de uma operação conjunta da Associação dos Municípios, Direcção-Geral da Pecuária e da Liga Portuguesa dos Direitos dos Animais. Apelar para a responsabilidade das pessoas. Para que não sejam uma vez mais os animais a pagar o preço da nossa inconsciência cultural. Como dizia um «chien» francês: «Lâchez-nous les pattes!» (Deixem-nos em paz…).
CUIDADOS…
Os animais são nossos companheiros, devemos tratá-los bem e respeitá-l0s. Não abandone o seu cão ou gato, eles são seres vivos que sofrem. Mesmo quando for de férias, se não os puder levar consigo, peça a um amigo que cuide deles ou instale-o num hotel para animais. e deveres
E DEVERES
Registe os seus cães e tire a licença na Câmara Municipal da sua residência. Coloque a chapa metálica na coleira. Caso o seu cão se perder e os serviços da câmara municipal o apanharem, o proprietário será rapidamente contactado. Desparasite e vacine os seus animais. Dê—lhes condições de higiene e de habitação. Mais vale ter um animal bem tratado de que vários mal estimados.
ILEGALIDADES
«Amarrar aos cães (…) objectos que os mortifiquem e façam correr (…), e bem assim lançar fogo a animais, untando—os com petróleo ou verter sobre eles substâncias corrosivas, água quente, etc…». DL 5864.
«Para evitar o bárbaro processo de envenenamento empregado frequentemente na extinção dos cães vadios, e para incutir no sentimento público o respeito pela vida de todos os seres: manda o Governo (…) recomendar às autoridades competentes que, quando seja necessário a extinção de cães vadios, se usem meios rápidos e suaves, em recintos apropriados e ocultos» . DL 3512.
«É proibido ao pessoal empregado na apanha de animais de raça canina usar para com eles de maus tratos, e a sua apreensão será feita, sempre que seja possível pelos membros menos sensíveis, de forma a proporcionar-lhes o menor sofrimento» . CPM.
«Considera-se como maus tratos aos animais (…) obrigar cães a acompanhar veículos em marcha». SPA.
«O abandono de cães e de gatos por parte dos seus proprietários ou detentores, para além das sanções previstas neste diploma, constitui contra-ordenação contra a saúde pública e animal e de desprezo censurável pelos animais e como tal punível com coima de 1.000$ [escudos] a 200.000$ [escudos] a aplicar pela Direcção—Geral da Pecuária». DL 317/85.
NOTAS:
(1) Os cães podem transmitir ao homem doenças parasitárias — as mais frequentes — como a equinococose (quisto hidático) ou a ascanidiose (lombrigas) e doenças infecciosas como o tétano (mordedura ou arranhão) ou a raiva (irradicada em Portugal).
(2) Rectificado no «Diário da República», 1.ª Série, n.º 251, de 31/10/85, 3.º sup.
(3) Orçamento global da CML: 12.561.952 contos em 1985, 15.393.593 contos em 1986, 18.915.846 contos em 1987.
(4) Os cães e gatos já dispõem, contudo, de cabeleireiro e manicure em Lisboa. Psiquiatra para cães, só nos EUA. Professor de yoga para gatos, só no Japão. Restaurantes macrobióticos ou vegetarianos para cães, só nos EUA.
(5) Há 3 anos foi lançado o processo visando a empreitada de recuperação. Já se pensava nessa altura na construção de um novo canil adaptado às realidades caninas. A opção foi feita: Monsanto, onde foram efectuadas as terraplanagens. A Comissão de apreciação das propostas está neste momento a apreciar o projecto que prevê um canil — hotel para cães e gatos, incinerador, pavilhão de quarentenas, laboratório e centro médico—veterinário. Ao todo, uns 80 lugares contra os 50 do actual canil. Tudo depende agora da burocracia. De qualquer modo os prazos adiantados pela Câmara para a sua concretização parecem altamente utópicos.
(6) As cadelas não esterilizadas sofrem um agravamento (20%) da taxa camarária.
(7) Foram ainda apanhados mortos 1 101 cães em 1987 e 1287 em 1988.
Reportagem originalmente publicada n’ O Jornal Ilustrado n.º 749 – 30 de Junho a 6 de Julho de 1989, da autoria de Rui Araújo com fotografias de Inácio Ludgero, a quem o PÁGINA UM agradece a autorização de republicação.
NOTA POSTERIOR DE RUI ARAÚJO: Inácio Ludgero teve a a amabilidade de me facultar os originais das fotos de ilustração. O meu bem-haja a um grande Senhor da Fotografia com quem tive o prazer de trabalhar.
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