Pela Europa fora, fala-se na “ascensão do populismo” e do “aumento de votos na direita” e na “extrema-direita”. As perspectivas apontam para que, nestas eleições europeias, se incline para a direita a balança dos deputados eleitos.
Da Avenida da Liberdade, no dia 25 de Abril, passando pela comunicação social, pela opinião de comentadores/influencers pagos e publicações nas redes sociais, somam-se os apelos ao “combate ao populismo e à extrema-direita”. Em resumo, “aos fascistas”.
Esta visão simplista, infantil e a preto e branco só não espanta porque todos temos observado a enorme bolha em que confortavelmente têm vivido os que apontam o dedo ao “perigo” do “fascismo” como a grande batalha dos nossos tempos, na Europa.
Jornalistas, comentadores, influencers diversos (incluindo antigos políticos a lucrar com grandes empresas e lobbies), acotovelam-se a ver quem grita mais alto “fora os fascistas!” depois de anos a apoiar políticas anti-democráticas e perigosas, que promoveram a opacidade e a censura e criaram crises em várias frentes.
Claro que não lhes dá jeito nenhum contar a verdade e defender soluções para os problemas que levam a um certo sentido de voto. Dá-lhes muito jeito apontar o dedo a um novo “inimigo” contra o qual “todos se têm de unir”. Faz lembrar algo?
Este estratagema antigo e conhecido pode resultar com alguma franja da população (normalmente, sem acesso a informação além das TVs e dos mass media). Mas falha em conseguir já convencer a grande maioria dos cidadãos.
Os problemas que afectam hoje muitas famílias e empresas na Europa são sérios. As crises que se acumulam são sérias. O futuro não parece auspicioso e faltam soluções credíveis. Da subida do custo de vida, à habitação, passando pela insegurança, os rendimentos, segurança, impostos e emprego, têm faltado respostas convincentes aos mais vulneráveis e aos jovens.
Todas estas crises alimentam-se de medidas e políticas que foram tomadas sucessivamente ao longo dos anos por governos que não tiveram como absoluta prioridade o bem-estar das populações e a saúde da economia.
Uma chatice. Não se pode culpar os “populistas” e a “extrema-direita”, os “fascistas”, pelas medidas lamentavelmente adoptadas na última década, incluindo o abandono a que foram votados muitos imigrantes, que vivem sem condições e vulneráveis a redes de criminosos.
Mas existe uma solução. Em cinco passos, é possível combater os partidos “populistas” e a “extrema-direita”. Apenas é necessário que todos os partidos que têm governado, nomeadamente com o apoio da suposta esquerda e de centristas, adoptem as seguintes bandeiras:
- 1 – Pacifismo e “não à guerra”. Ninguém quer ver os maridos, filhos e netos em risco de ir para a guerra. NINGUÉM. Além disso, as guerras criam deslocados e podem abalar os alicerces das economias, atirar milhões para o desemprego e fazer, em simultâneo, disparar o custo de alguns bens. Assim, para atrair votos, é crucial que os partidos de esquerda e centro defendam a diplomação, a negociação e a … PAZ.
- 2 – Defesa dos direitos humanos, das mulheres, das crianças e da soberania sobre o próprio corpo. Este ponto é fundamental. Para retirar votos aos partidos “populistas” e de “extrema-direita” é crucial que os restantes partidos políticos defendam os direitos humanos. Isto implica mudar algumas das linhas dos seus programas eleitorais que defendem políticas internacionais limitativas aos direitos humanos e civis, nomeadamente na área da Saúde. Defender os direitos humanos é também defender os imigrantes, promover a inclusão e a diversidade. É combater a insegurança e as redes de tráfego humano que assolam a Europa. É também combater o ódio, nomeadamente contra as mulheres, que enfrentam hoje também a discriminação no desporto e outras competições por via da concorrência desleal e injusta por parte de atletas nascidos homem.
- 3 – Defesa da liberdade de imprensa e da liberdade de expressão. Não confundir com a defesa dos mass media, ou media mainstream, que estão muito alinhados com partidos que têm governado na Europa e que têm apoiado políticas que limitam a liberdade de imprensa e de expressão. Para conquistar votos ao “populismo” e à extrema-direita” é importante defender o verdadeiro Jornalismo – o oposto da propaganda – a liberdade de imprensa e o acesso a informação. Isto implica, por exemplo, condenar e rejeitar algumas leis e políticas adoptadas na União Europeia e países do Ocidente, incluindo especificamente a Irlanda e o Canadá. E é crucial exigir a liberdade de Julian Assange, jornalista detido vergonhosamente no Reino Unido e em risco de ser extraditado para os Estados Unidos. O seu “crime” inclui ter publicado provas de crimes de guerra por parte de Estados, incluindo o assassinato de jornalistas. Do mesmo modo, por exemplo, deve acentuar-se a pressão sobre a Rússia para libertar o jornalista norte-americano Evan Gershkovich ou o russo Roman Ivanov. Ou apurar as verdadeiras causa da morte do jornalista Gonzalo Lira numa prisão da Ucrânia. É também crucial compreender que tem vindo a ser criada uma indústria de censura que elimina informação verdadeira e persegue jornalistas, académicos, cientistas, políticos, activistas, médicos que divulguem factos verdadeiros “não autorizados”. Esta indústria é vasta. Envolve governos, universidades, organizações não governamentais financiadas para o efeito, empresas de comunicação social e sites de suposta “verificação de factos”. Há documentos que apontam ainda o envolvimento de agências de informação governamentais em práticas de censura de informação verdadeira e na realização de campanhas de desinformação. É importante defender o debate, o contraditório e a reflexão crítica.
- 4 – Defesa do ambiente e de uma sociedade verdadeiramente sustentável. Este é outro ponto fundamental. Para roubar votos ao “populismo” é preciso voltar a apostar em políticas de defesa do ambiente e da saúde e bem-estar das populações, com foco na protecção de paisagens naturais e combate aos grandes poluidores. Defender o ambiente é, também, apontar baterias a grandes indústrias poluidoras, fiscalizar e adoptar novas políticas que penalizam essas indústrias. É também desincentivar a sociedade de consumo desenfreado e a produção de bens de curto tempo de vida. É combater o abate de árvores e destruição de habitats. É defender as melhores práticas na agricultura, o bem-estar animal, eliminar de vez a autorização do uso de produtos como o glifosato, proteger bancos de sementes dos interesses de multinacionais e afastar o uso de organismos geneticamente modificados.
- 5 – Defesa da Democracia. Este é um dos pontos mais relevantes. O nível de democracia tem vindo a cair nos países ocidentais, incluindo Portugal. Há planos para mutilar a Constituição da República Portuguesa. Há um histórico recente preocupante de políticas a serem implementadas sem serem seguidos os devidos procedimentos legais, não só em Portugal mas em outros países. Falta transparência em negócios com dinheiros públicos. Falta combate verdadeiro a corrupção e conflitos de interesses. Na União Europeia, há problemas com opacidade e o envolvimento de lobbies e influência de indústrias. O crescente poder e influência sobre políticas públicas por parte de organizações internacionais não eleitas é uma séria ameaça às democracias ocidentais.
A receita para eliminar o “populismo” parece simples, mas não é. Muitos dos partidos de esquerda e centro apoiaram as políticas que têm diminuído o nível de democracia em países como Portugal e que têm ameaçado o respeito pelos direitos humanos, liberdade de expressão e liberdades fundamentais. Apoiaram políticas que afectaram gravemente a economia, o emprego e os rendimentos disponíveis no final do mês e geraram insegurança e instabilidade.
Recuperar a confiança do eleitorado vai exigir mais do que novos programas eleitorais e frases bonitas.
Porque, ao contrário do que acusam alguns partidos de esquerda e do centro, não são os partidos “populistas”, de “direita” e de “extrema-direita” que se apropriaram de temas como a defesa dos direitos humanos. Foram os partidos antigos, que têm governado, os partidos de esquerda e de centro que abandonaram temas cruciais como a defesa da Paz, dos Direitos Humanos, da Democracia, da Liberdade e do Jornalismo.
A crise dos valores europeus é real. Apontar o dedo, criar um inimigo a abater, não é a solução. Criar novas guerras, novas crises, novas emergências não é a solução. A solução é mudar e restaurar a confiança perdida. Mesmo que isso implique reconhecer que se causou dano e que se errou. Reconhecer o erro pode ser o início da reconciliação e o princípio de uma nova era na Europa, em que partidos procurarão defender os interesses e bem-estar dos europeus e os seus valores universais de democracia, paz e respeito pelos direitos humanos e individuais.
Temo que partidos à esquerda e centristas não compreendam que o que têm defendido nos útimos anos tem sido, muitas vezes, políticas fascistas, totalitárias. Censura. Cultura de cancelamento e de difamação e perseguição de jornalistas, académicos, cientistas e políticos. Protecção da especulação e das grandes multinacionais. Protecção da opacidade e da corrupção. Em Portugal e na União Europeia.
Apontar o dedo a um inimigo pode ser fácil. Mas, para muitos europeus, já não vai funcionar. O problema não está nos europeus nem no seu sentido de voto. Está, antes, naqueles que os traíram e desiludiram.
Por isso, quando vir alguém que aprovou as políticas nos últimos anos a gritar “fora com o fascista!”, recomende-lhe que tenha vergonha na cara. E que arranje um espelho.
Elisabete Tavares é jornalista
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