Há 100 anos, 25% das crianças morriam antes de um ano de vida

2023 com mínimos históricos na taxa de mortalidade infantil em meninas

person holding baby feet

por Elisabete Tavares e Pedro Almeida Vieira // Maio 17, 2024


Categoria: Exame

minuto/s restantes

A taxa de mortalidade infantil em Portugal tem-se mantido em níveis muito baixos nas últimas décadas, mas continuam a bater-se recordes. No ano passado, de acordo com dados revelados ontem pelo Instituto Nacional de Estatística, a taxa para o sexo feminino foi o mais baixo de sempre, aproximando-se da fasquia dos dois óbitos por mil nascimentos. Há cinco décadas, esta taxa era 40 vezes superior e há um século chegava a ser mais de 100 vezes superior. Apesar do bom ‘desempenho’ das meninas, a taxa de mortalidade infantil global em 2023 foi ligeiramente superior à registada em 2021, em plena pandemia. Por regiões, há diferenças: a Península de Setúbal registou a maior taxa, sendo que o Algarve mostrou os melhores números.


Há um século, um em cada quatro bebés não chegava em Portugal ao final de um ano de vida; a esmagadora maioria finava-se em menos de dois meses. Uma época não assim tão longínqua em que o natural era os pais enterrarem os filhos. Há pouco mais meio século, o Estado Novo deixava uma situação um pouco melhor, mas ainda na cauda da Europa, com cinco em cada 100 recém-nascidos a falecerem antes dos 12 meses. A partir daí, as evoluções tecnológicas, as artes da Medicina e o desenvolvimento económico têm alcançado sucessos dignos, neste caso, de Primeiro Mundo. Ainda mais quando a margem de melhoria é agora bastante estreita face aos valores já muitíssimo baixos.

Mas 2023 ainda trouxe motivos de festejo. De acordo com dados revelados ontem pelo Instituto Nacional de Estatística, no ano passado conseguiu-se que a mortalidade infantil no sexo feminino – que sempre foi mais baixo do que a registada em meninos – descesse o valor mais baixo de sempre: apenas 2,07 por cada mil crianças nascidas. Este dado representa uma descida ligeira face aos 2,43 em cada mil registados em 2022.

No caso das crianças do sexo masculino, a taxa de mortalidade infantil situou-se no ano passado em 2,81, um ligeiro agravamento face aos 2,80 registados no ano anterior. O valor mais baixo de mortalidade infantil masculina observou-se em 2020 com 2,49 óbitos em cada mil.

baby crawling on bed
(Foto: D.R.)

Apesar da situação favorável nas meninas, a taxa de mortalidade infantil global fixou-se em 2,45, ligeiramente acima do mínimo histórico de 2,43 observado em 2021. Essa sitaução deve também,em parte, ao facto de nascerem mais rapazes do que raparigas, geralmente numa proporção de 55/45. Ao longo de 2023 registaram-se, em termos absolutos, 215 óbitos de menores de um ano em Portugal. A maioria morreu nos primeiros 28 dias de vida – ou seja, mortalidade neonatal -, sendo que destes, 88 não sobreviveram para lá dos 7 dias após o nascimento. Em geral, são casos de malfoirmaçõs congénitas graves não detectadas durante a gestãção ou já numa fase em que se se mostra legalmente impossível a interrupção da gravidez.

Por regiões, foi na Península de Setúbal que se registou a maior taxa de de óbitos de recém-nascidos, com 3,3 óbitos por mil nascimentos. Seguiu-se a região do Alentejo, com uma taxa de 2,8, e a região Centro e a Madeira, com 2,3. Onde morreram menos recém-nascidos foi na região do Algarve, com uma taxa de 1,1, e do Norte, com 1,5.

Evolução da taxa de mortalidade infantil em Portugal entre 1970 e 2023 para o sexo masculino (H) e feminino (M) e total (HM) /. Fonte: Instituto Nacional de Estatística (INE)

Para o pediatra Jorge Amil Dias, que é também o presidente do Colégio de Pediatria da Ordem dos Médicos, estes dados estatísticos entre anos devem sempre ser analisados sempre com cautela. “Nesta fase, são variações muito pequenas, não se podem tirar conclusões sérias”, afirmou em declarações ao PÁGINA UM.

O pediatra destaca, por isso, que como em Portugal já se registam habitualmente valores muito baixos de mortalidade infantil, “ se houver qualquer variação” quer para cima quer para baixo, deve-se ser “prudente e não tirar conclusões de imediato” sem fazer uma análise dos casos.

De acordo com os dados do INE, a taxas de mortalidade infantil e neonatal tem vindo a descer ao longo das décadas de forma sistemática, evidenciando a inexistência de crises sanitárias graves comoas existentes sobretudo até aos anos 50 do século passado, onde as diarreias e as gastroenterites causavam morticínios sobretudo nos meses de Verão e Outono, muito por via também da péssima qualidade de e fata de tratamento de esgotos e lixos. Os programas de vacinação também controlaram surtos de diversas doenças transmissíveis que causavam por anos algumas centenas de mortes até aos anos 70. Para haver um termo de comparação, em 1975, a taxa de mortalidade infantil global foi de cerca de 39 em cada mil, ou seja, quase 4%. No caso das meninas recém-nascidas foi de um pouco menos de 35 e no dos meninos de quase 43.

Jorge Amil Dias, presidente do Colégio da Especialidade de Pediatria da Ordem dos Médicos.

O acesso a melhores cuidados de saúde materno-infantil, as melhorias registadas ao nível do saneamento básico no país, cuidados de higiene e alimentação ajudam a explicar a forte redução da mortalidade infantil ao longo das últimas décadas, embora também a possibilidade de interrupção voluntária de gravidez por via de malformações letais contribuam para os valores bastante baixos.

Em todo o caso, é quase impossível melhorara mais neste importante indicador de Saúde Pública. Nos últimos 10 anos, a taxa global de mortalidade neonatal apenas subiu acima dos 3 em cada mil em dois anos. Em 2016, atingiu os 3,24, o que compara com 2,92 no ano anterior. Depois, em 2018, aumentou para 3,3 de 2,66 um ano antes.


PÁGINA UM – O jornalismo independente (só) depende dos leitores.

Nascemos em Dezembro de 2021. Acreditamos que a qualidade e independência são valores reconhecidos pelos leitores. Fazemos jornalismo sem medos nem concessões. Não dependemos de grupos económicos nem do Estado. Não temos publicidade. Não temos dívidas. Não fazemos fretes. Fazemos jornalismo para os leitores, mas só sobreviveremos com o seu apoio financeiro. Apoie AQUI, de forma regular ou pontual.

O jornalismo independente DEPENDE dos leitores

Gostou do artigo? 

Leia mais artigos em baixo.