Não sou pessoa de ter ídolos, mas se me pedissem para indicar as três pessoas que mais respeitei, ao longo da minha vida, em todo o mundo, não hesitaria em indicar, de imediato, duas: o Papa Francisco e Nelson Mandela.
Não sendo católico praticante não me custa dizer do meu respeito pelo actual Papa.
Idoso, mas tentando acompanhar os tempos, modernizando uma Igreja que estava, há muito, parada no tempo e dando exemplos, por vezes com atitudes polémicas como a “Cerimónia de Lavar os Pés”, nas Quintas Feiras Santas, que era habitualmente feita pelos Papas “aos discípulos”, sendo que Francisco substituiu estes por reclusos e reclusas, de diversas idades, de diversas cores, de diversas religiões.
Melhor exemplo de humildade e de crença na reabilitação não conheço.
Por sua vez, Nelson Mandela é o Homem que todos os democratas têm como referência.
Jovem advogado em Joanesburgo foi, como todos os seus, vítima do mais hediondo dos crimes, o “apartheid”, o racismo no seu expoente máximo, passando 27 anos na prisão, condenado num julgamento ignóbil, por “traição”, por não aceitar trair os seus valores.
Libertado, numa altura de pré-guerra civil, saiu da cadeia com o estatuto, pela sua luta conquistado, de político com mais influência na África do Sul.
Quando se pensava que chegara a hora da “vingança”, Mandela assumiu o poder, num país completamente dividido, e conseguiu a unificação, em que poucos acreditavam, graças ao seu humanismo, à capacidade de perdoar em nome de bens maiores, desde logo a Paz e a Democracia, sem aceitar que houvesse qualquer discriminação entre os seus conterrâneos.
Ficou justamente reconhecido, universalmente, como a grande Figura do Século XX.
Mais tarde, explicou como o conseguiu:
“Quando eu saí em direção ao portão que me levaria à liberdade, eu sabia que, se eu não deixasse minha amargura e meu ódio para trás, eu ainda estaria na prisão”.
Mandela é uma inspiração.
Pelas razões acima, o nome escolhido pela ParPública para um Prémio “a atribuir anualmente a um advogado ou jurista, nacional ou internacional, que se tenha destacado na promoção ou representação do bem comum e da cidadania” não podia ser melhor que “Prémio Mandela”.
Restava saber o nome da personalidade que o iria receber.
Em 2024 a escolha não podia ser melhor: António Garcia Pereira.
Voltando ao início desta crónica, não sou pessoa de ter ídolos, mas se me pedissem para indicar as três pessoas que mais respeitei, ao longo da minha vida, em Portugal, não hesitaria em indicar, de imediato, duas: António Ramalho Eanes e António Garcia Pereira.
O primeiro pelo papel importante no glorioso 25 de Abril de 1974 e, mais tarde, como o Presidente da República que, até hoje, a imensa maioria dos portugueses, onde obviamente me incluo, considera como aquele que mais dignificou o cargo.
De uma verticalidade, honestidade e coragem sem paralelo, deixou saudades e, ainda hoje, é lembrado com saudade , principalmente quando se chega ao momento das comparações.
Quanto a António Garcia Pereira, são tantas as razões que tornam justíssima a distinção que só se pode pecar por defeito por muitos qualificativos elogiosos que utilizemos.
Lutador incansável pelos principais objectivos exigidos a uma pessoa de bem: pela democracia, pela igualdade, pela fraternidade, pela Lei igual para todos.
Homem de Bem, sempre ao lado dos desprotegidos, dos que não têm voz, dos injustamente perseguidos.
Advogado de Causas que dá a cara e enfrenta quem quer que seja que não siga os valores que devem reger um País livre e democrático.
Também partilha outra das convicções de Mandela: “Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem, ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar” e, por isso, luta diariamente contra o racismo e a xenofobia.
Luta, há décadas, contra os malefícios de um Sistema Prisional que se limita a punir, e da maneira mais abjecta (com os reclusos a passar fome, sem cuidados médicos, sem a possibilidade de estudar ou trabalhar, muitas vezes vítimas de agressões, constantemente alvos de todo o tipo de abusos) e não de reabilitar, como a nossa Lei obriga.
Daí que seja um dos fundadores da APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso e seu Presidente Honorário.
No dia de aniversário de Nelson Mandela, António Garcia Pereira recebeu o Prémio com o seu nome numa Cerimónia memorável que contou com a participação de outro dos meus “heróis”, António Ramalho Eanes que fez questão de afirmar (com a sua coragem e verticalidade habituais) que considerava uma Honra estar naquela cerimónia apesar das diferenças “filosóficas” com o premiado.
Dois Homens superiores.
De uma coisa estou certo: Nelson Mandela ficaria muito feliz com a escolha do premiado.
Vítor Ilharco é assessor
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