Segui a cerimónia de Benjamin Netanyahu no Congresso dos Estados Unidos e não me surpreendi com o resultado: Congressistas aplaudindo, euforicamente, em pé, Congressistas pateando e garantindo, posteriormente, que tinha sido “o pior discurso de sempre de um líder estrangeiro no Congresso”, Famílias das vítimas do Hamas agradecendo a sua acção, Famílias dos ainda reféns criticando as suas palavras.
Netanyahu sabia que este seria o resultado.
Tentou justificar toda a contestação dizendo que esta tinha como base o ódio.
Afirmou, taxativamente, que “o antissemitismo é o ódio mais antigo do mundo”.
Talvez tenha exagerado, mas não deixa de ter alguma razão.
Para um cidadão normal, ou que se pretende assim qualificar, como é o meu caso, a questão resume-se a tentar saber qual o caminho que deveria ser seguido pelo responsável de um País vítima de mais um ataque ignóbil dos seus ancestrais inimigos.
Recordemos o acto que levou Israel a uma guerra sem tréguas contra o Hamas.
Todos vimos, todos nos arrepiámos, todos nos revoltámos com as imagens de um grupo de bárbaros assassinos a disparar, indiscriminadamente, contra um grupo de homens, mulheres, jovens, crianças, todos desarmados porque se divertiam num Festival de Música.
Para os assassinos eles cometiam o terrível crime de não seguirem as suas práticas religiosas, ou políticas, ou por serem oriundas de países que consideram inimigos.
Deixaram, para trás, 260 mortos, mas não contentes com isso arrastaram centenas de sobreviventes que fizeram reféns em masmorras, onde muitos ainda se encontram desde Outubro de 2023.
A questão que se punha aos políticos de Israel passou a ser a seguinte: Como responder a mais este crime?
A pergunta não tem resposta fácil para ninguém. Muito menos para uma pessoa com as minhas capacidades.
Sei que os familiares das vítimas exigem, no mínimo, que os agressores tenham um fim pelo menos tão violento como o que deram os seus entes queridos.
Em suma, exigem vingança. No meu conceito, legitimamente.
Outros querem, dos responsáveis de um País que se quer democrático e respeitador dos Direitos Humanos, que tentem castigar os agressores, mas sem descer ao nível destes.
Em suma, pedem Justiça. No meu conceito, com razão.
Perante isto o que poderia Benjamin Netanyahu fazer?
Como prender os assassinos que invadiram o seu país, massacraram quase três centenas de pessoas inocentes e raptaram outras centenas, se aqueles regressaram para as suas terras onde têm o apoio de milhares de habitantes dispostos, muitos deles, a defendê-los com armas na mão?
Os familiares das vítimas exigiam que houvesse uma retaliação sem paralelo, não só contra os que tinham cometido “este” crime mas contra todos os que seguem, há anos, a mesma linha, não só porque ou já tinham cometido outros idênticos ou estavam a ser treinados para cometer novos atentados.
A justificação que usam, é simples: se não querem seguir as regras internacionais, não ligando à Justiça, então só restará a Vingança.
Alguns, mais comedidos, chamavam a atenção para o facto destes terroristas (porque é esse o nome que lhes corresponde) não respeitarem, sequer, o seu Povo e o usarem como escudo.
O que levaria a que as forças de Israel acabassem por matar, nos seus ataques, muitos inocentes.
Ou seja, a cometer os mesmos crimes pelos quais pretendiam castigar os seus adversários e, por consequência, poderem passar a ser rotulados, também eles, de terroristas.
Não havia uma terceira hipótese.
A Justiça, como a conhecemos, dificilmente seria conseguida neste caso. Até porque, ainda que se prendessem todos os que entraram em Israel naquele dia fatídico, os grandes responsáveis ficariam livres e a treinar novos atacantes.
Por sua vez, a Vingança criaria, como acabou por criar, novos adversários, novos inimigos, perante a imagem de ataques indiscriminados com milhares de civis de todas as idades, assassinados pelas forças de Israel que vão deixando, atrás de si, cidades arrasadas e criando um caos absoluto.
Sabemos de alguns heróis (Gandhi, Mandela, etc.) que souberam responder a todas as violências com atitudes que ficaram como marcas na História Mundial.
Netanyahu optou por outra via.
Deixo-lhe as sábias palavras do nosso grande Mestre Agostinho da Silva:
“Não te poderás considerar um verdadeiro intelectual se não puseres a tua vida ao serviço da justiça; e sobretudo se te não guardares cuidadosamente do erro em que se cai no vulgo: o de a confundir com vingança.
A justiça há-de ser, para nós, amparo criador, consolação e aproveitamento de forças que andam transviadas; há-de ter por princípio e por fim o desejo de uma Humanidade melhor; há-de ser forte e criadora; no seu grau mais alto não a distinguiremos do Amor.”
Não queria estar no lugar do líder de Israel.
Custa-me que ele mantenha a intenção de prosseguir nesta linha de vingança.
Com alguma dificuldade entendo que ele considere a vingança como única alternativa, principalmente enquanto recordar as imagens de Outubro de 2023.
Todavia, e sabendo que tal não teria, para ele, a mais pequena importância, nunca lhe apertaria a mão.
Vítor Ilharco é assessor
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