Título
A geração ansiosa
Autor
JONATHAN HAIDT (tradução: Diogo Freitas da Costa)
Editora
Dom Quixote (Julho de 2024)
Cotação
19/20
Recensão
Jonathan Haidt é um psicólogo social americano e professor de Liderança Ética na Stern School of Business da Universidade de Nova Iorque. Nascido em 1963, Haidt é conhecido pelo seu trabalho em psicologia moral e política, e a sua investigação centra-se no modo de as pessoas formarem os seus julgamentos morais. Doutorou-se em Psicologia Social pela Universidade da Pensilvânia, em 1992, tendo leccionado na Universidade da Virgínia durante 16 anos.
Haidt ganhou notoriedade com o seu livro The Righteous Mind: Why Good People Are Divided by Politics and Religion (2012), no qual explora as raízes psicológicas das divisões políticas e religiosas. Juntamente com Greg Lukianoff, publicou outra obra relevante, The Coddling of the American Mind (2018), dedicada às mudanças culturais e educacionais que, segundo os autores, estão a fragilizar a geração mais jovem.
Com este A Geração Ansiosa (Publicações Dom Quixote), Haidt vai além das alterações culturais, demonstrando como as redes sociais, mais do que transformarem a cultura, estão a transfigurar a humanidade, desde 2010. Esta obra apresenta uma análise profunda e crítica sobre o colapso da saúde mental entre os jovens da chamada “Geração Z” (Gen Z), os que nasceram depois de 1995.
Esta é uma leitura obrigatória para todos os pais, educadores e responsáveis políticos pela educação e saúde na infância, adolescência e juventude. Deste modo, todos serão confrontados com o seu papel no aumento dos distúrbios mentais (mas não apenas) dos jovens nascidos depois de 1995 e, sobretudo, dos que, desde 2010, têm acesso às redes sociais.
A hipótese do autor é a de que, desde a década de 1980, temos vindo a assistir à reconfiguração da infância por duas ordens de razões: a super-protecção do mundo real por parte dos pais, devido ao que o autor designa de ‘safetism’; e a sub-protecção no mundo virtual.
Esta grande reconfiguração da infância, transformou esta fase da vida, primordial sob o ponto de vista da socialização – enquanto processo de aquisição, aprendizagem e interiorização das normas, valores, comportamentos e atitudes da sociedade (enquanto processo de integração nos grupos sociais de que fazemos parte) –, a partir da combinação daquelas duas grandes tendências: o medo de deixar as crianças brincarem sem vigilância parental (dito de outro modo: parentalidade excessivamente protectora) e a permissão para navegarem no mundo virtual sem qualquer limitação e protecção. Desde então, passou-se de uma infância centrada na brincadeira para uma infância centrada no telemóvel (smartphone).
O declínio da infância baseada na brincadeira tem provocado quatro danos fundamentais nas crianças e jovens: privação social, privação do sono, atenção fragmentada e dependência. Não é estranho, por isso, que a Gen Z, a primeira a crescer inteiramente na era digital, se tenha tornado, segundo Haidt, uma “geração ansiosa”, marcada por altos índices de ansiedade, depressão, auto-mutilação e suicídio.
O autor descreve a génese e fundamenta todos aqueles danos, demonstrando, também, como as redes sociais prejudicam mais as meninas e raparigas do que os rapazes. O livro está pejado de estudos que comprovam tudo e mais alguma coisa, sendo certo que só quem não quer é que não verá o que está à frente dos nossos olhos, tão-só porque os adultos da geração de 1970 e 1980 não querem reconhecer os pais helicópteros em que se converteram. Se é de provas que precisam, basta folhear a 150 páginas de notas e referências bibliográficas, onde se encontram todos os estudos, dados e afins sobre o estado mental, as suas causas e consequências.
A “onda gigante de sofrimento” da ‘geração ansiosa’ tem causas e estão estudadas e documentadas. Apesar do cenário preocupante, Haidt é generoso e sugere um plano de acção para reverter o marasmo em que vivemos, propondo quatro medidas fundamentais: adiar o uso de smartphones até o ensino secundário, proibir o acesso às redes sociais antes dos 16 anos, criar escolas livres de dispositivos móveis e incentivar as brincadeiras não supervisionadas durante a infância. Haidt defende que estas acções são essenciais para restaurar uma infância mais saudável e equilibrada na era digital.
Para isso, é primordial que a acção seja colectiva. Importa que pais, educadores e responsáveis políticos se unam e coloquem em prática aquelas e outras medidas. Caso contrário, de uma infância centrada no telemóvel passaremos a ter adultos extra-terrestres, cuja ‘vida’ virtual será, provavelmente, a única que saberão ‘viver’.
Um curto excerto (p. 187):
“Assim que os adolescentes passaram dos telefones básicos para os smartphones, tanto a quantidade como a qualidade do seu sono diminuíram em todos os países desenvolvidos. Os estudos longitudinais demonstram que o uso do smartphone antecedeu a privação de sono (…) os seus efeitos são vastos. Incluem depressão, ansiedade, irritabilidade, défices cognitivos, problemas de aprendizagem, pobre desempenho académico, mais acidentes, mais mortes por acidente”.