HORA POLÍTICA COM PEDRO NORTON DE MATOS, GESTOR E FUNDADOR DO GREENFEST

‘As autarquias podem ser o motor para acelerar a mudança na sustentabilidade’

por Elisabete Tavares // Setembro 19, 2024


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Pedro Norton de Matos é um dos principais rostos da sustentabilidade em Portugal e um gestor à frente do seu tempo. Há 17 anos, fundou o Greenfest, o maior evento de sustentabilidade do país. Nesta entrevista ao PÁGINA UM, Norton de Matos defende que, mais do que governos ou do que Bruxelas, as autarquias podem ter um papel crucial para acelerar a mudança em termos de uma sociedade mais sustentável. Também falou sobre a crise nos media e sobre a tendência de polarização e divisão da opinião pública, que tem o efeito perverso de criar cidadãos apáticos e passivos. O gestor deixou ainda críticas às três grandes indústrias: a da guerra; a farmacêutica; e a petrolífera. Numa era em que se instalam no Ocidente ideais autocráticos que visam, nomeadamente, condicionar ou eliminar a liberdade de expressão, Norton de Matos defende que democracia e sustentabilidade são compatíveis. Para o gestor e consultor, mudar comportamentos na área ambiental passar por se premiar as boas práticas, acreditando que são as novas gerações que vão fazer a diferença, mas apelando a um compromisso intergeracional.



Pedro Norton de Matos criou o Greenfest, o maior evento de sustentabilidade em Portugal, há 17 anos. Na altura, o conceito ESG (siga de ‘Environmental, Social and Governance’) ainda não era um fenómeno no mundo empresarial, nem uma prioridade para muitas empresas. Hoje, sustentabilidade é um critério em muitos negócios e está reflectido em políticas e em práticas.

Mas ainda há um longo caminho a percorrer em matéria de defesa do ambiente e na criação de uma sociedade sustentável. Pedro Norton de Matos não tem dúvidas de que as novas gerações são determinantes para a mudança mas, no imediato, em Portugal, é o poder local que pode trazer uma maior transformação para um país mais ‘amigo’ do ambiente. “As autarquias são e poderão vir a ser cada vez mais os grandes motores de acelerar a mudança”, disse o mentor do Greenfest numa entrevista ao PÁGINA UM.

Norton de Matos defendeu que, não só os autarcas estão, muitas vezes, mais tempo no poder do que um primeiro-ministro, como as autarquias têm uma visão mais holística na gestão dos recursos e na resolução de problemas. “Mais do que as coisas acontecerem em Bruxelas ou no Terreiro do Paço, acho que é claramente nas comunidades onde a mudança pode acontecer de uma forma mais eficaz, mais consistente e mais rápida”, frisou.

Pedro Norton de Matos. (Foto: D.R.)

Um gestor reputado de topo, (foi presidente-executivo da Unisys Portugal, Espanha e Itália e da operadora ONI), Norton de Matos, decidiu mudar as suas prioridades quando sofreu um enfarte aos 50 anos. Hoje, aos 69 anos, reside em Ponte de Lima e, ao longo dos anos, não só criou o Greenfest como promoveu outros projectos a pensar na sustentabilidade, nomeadamente o Bluefest Portugal, mas também na consultoria e formação, através da Academia G.

Mas é o Greenfest o ‘empreendimento’ mais conhecido, contando já com 24 edições realizadas em diversos municípios. O evento nasceu em parceria com a Câmara Municipal de Cascais, mas acabou por se alargar a outras partes do país e a outras autarquias, nomeadamente aos municípios de Braga, Porto, Torres Vedras e Valongo. A próximo edição do Greenfest está agendada para os dias 27, 28 e 29 de Setembro, em Braga.

Nesta entrevista realizada na plataforma Zoom, o gestor e consultor falou sobre como ” as três maiores indústrias do mundo” − a da guerra, a petrolífera, a farmacêutica − moldam e influenciam as políticas e as tendências. “Todos os países europeus vendem armas e, sem hipocrisias de reconhecer isso, há negócio para vender armas”, disse, frisando que “não é difícil instigar [o aparecimento de conflitos armados], seja com ódios religiosos, étnicos ou históricos”, e que “o mais fácil é criar uma guerra”.

(Foto: D.R.)

No caso da indústria farmacêutica, salientou que ” temos de estar agradecidos à Ciência, à tecnologia, por grandes evoluções das décadas, mas vemos também a perversidade de negócios, em que as fronteiras levantam dúvidas”, estranhando “ver tantos especialistas com tantas certezas, a defender posições, quando seria mais honesto, até intelectualmente, mostrar algumas dúvidas, e não certezas cegas”.

Também comentou a crise na comunicação social em Portugal, destacando a importância de se “valorizar muito e elogiar projetos independentes, que lutam quase contra tudo e todos, quando estão a fazer um serviço público de primaríssima utilidade”. Para Norton de Matos, “há uma perversa dependência [de grupos de media] e que leva, portanto, a adulterar completamente” a informação. “Os médicos fugiram do ideal do Hipócrates; os Jogos Olímpicos fugiram do ideal de Pierre Coubertain; e os jornalistas têm fugido (…) do jornalismo rigoroso”, lamentou.

Também criticou o facto de no espaço mediático e público, das redes sociais, haver polarização de temas e observou que “a maioria que não está polarizada, é uma maioria que, em muitos casos, quase que é convidada à inação, porque fica tão dividida”.

Num mundo cada vez mais polarizado e em que temas de relevo como o da defesa do ambiente são politizados, assiste-se ao regresso de políticas e ideologias em prol da censura e da eliminação da liberdade de expressão. Mas, para Norton de Matos, a democracia “é claramente compatível [com a defesa do ambiente] e é o único modelo” em que se revê, afastando a implementação de ideais autocráticos, os quais estão em ascensão no Ocidente.


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