A Impresa, o grupo de media fundado por Pinto Balsemão recomprou, discretamente, no final de 2022, o seu edifício-sede, em Oeiras, que vendera ao Novo Banco, há seis anos, por 24,2 milhões de euros. A opção, que implicava o posterior arrendamento á instituição bancária, justificava-se então por problemas graves de liquidez da Impresa. A situação financeira da Impresa não se modificou, e por isso a recompra somente foi possível porque o Novo Banco, como vendedor, financiou a aquisição do edifício pela Impresa, aparentemente com uma menos-valia, porque a hipoteca registada é de apenas 19 milhões de euros, conforme o PÁGINA UM apurou. A CMVM entende não haver necessidade de os investidores e a concorrência terem sido informados desta estranha operação em que a Impresa terá obtido, de mão-beijada, cerca de 4,6 milhões de euros de um banco intervencionado pelo Estado.
Quando, em 2018, a Impresa vendeu o edifício-sede do grupo, situado em Paço de Arcos, ao Novo Banco, o negócio foi anunciado ao mercado através de um comunicado, e foi notícia na maioria dos órgãos de comunicação social. A venda, através de uma operação ‘sale e leaseback’ garantiu à dona do jornal Expresso e da SIC um encaixe de 24,2 milhões de euros, com a Impresa a ficar com o direito de arrendar o imóvel por 10 anos.
Contudo, no final de 2022, a Imprensa comprou o mesmo edifício ao Novo Banco, através de um negócio executado de forma discreta, sem comunicação ao mercado e sem qualquer comunicado de imprensa. A discrição em torno do negócio compreende-se. Afinal, a Impresa comprou o edifício ao Novo Banco, mas como não tinha recursos financeiros próprios suficientes foi o banco que financiou o negócio. Para aumentar a estranheza, o Novo Banco não só emprestou o dinheiro para lhe ser comprado um activo, como ainda por cima terá perdido dinheiro pela transacção do imóvel. E não foi pouco.
O PÁGINA UM consultou a Certidão Permanente da matriz do edifício-sede da Impresa, tendo constatado que a venda do imóvel pelo Novo Banco à Impresa Office & Service Share – Gestão de Imóveis e Serviços se efectuou em 23 de Dezembro de 2022. Simultaneamente, foi registada uma hipoteca sobre o edifício em nome do Novo Banco.
Os detalhes do negócio não foram divulgados publicamente, mas o valor da hipoteca foi de 19.607.540,03 euros de capital – ou seja, bem abaixo dos 24,2 milhões de euros da transacção de 2018. No registo surge ainda que o Novo Banco garantiu um financiamento máximo de até 27.450.556,04 euros, o que pode indiciar que houve outros compromissos assumidos entre as duas partes. Sabe-se, aliás, que a Impresa, apesar de ter ‘recuperado’ a posse efectiva da sede, não vai ter a vida fácil, porque a taxa de juro anual aplicada ao empréstimo será de 9%, a que acresce 3% de juros de mora em caso de atraso no pagamento de mensalidades.
O PÁGINA UM questionou a Impresa e o Novo Banco sobre este estranho negócio, mas o grupo de media remeteu todos os esclarecimentos para os seus relatórios e contas, que nada explicam sobre esta matéria, enquanto o banco se escusou a responder. Já o Fundo de Resolução, que é acionista minoritário do Novo Banco e foi o veículo para as injecções de capital no banco, indicou ao PÁGINA UM que “não foi, nem tinha que ser, nos termos dos contratos, consultado” sobre a compra do edifício à Impresa em 2018, nem dispõe de informação sobre a operação agora ocorrida.
Recorde-se que no momento em que o edifício da Impresa foi vendido ao Novo Banco, o grupo dono da SIC e do Expresso passava enormes dificuldades e precisava de liquidez financeira. Foi, aliás, no mesmo ano, em 2018, que o grupo de Pinto Balsemão vendeu os seus ‘activos tóxicos’ da imprensa escrita – nomeadamente as revistas Visão e Exame – à empresa unipessoal de Luís Delgado, a Trust in News, que está actualmente com um Processo Especial de Revitalização (PER) a aguardar conclusão. (Recorde-se que a compra das revistas à Impresa também foi financiada pelo Novo Banco, que arrisca agora ‘ficar a ver navios’ em relação ao dinheiro emprestado, reclamando um valor de créditos no PER da Trust in News de 3.557.280,58 euros).
A solução de venda do edifício em 2018 foi a escapatória depois de a Impresa ter falhado, no ano anterior, uma emissão de obrigações. Com BPI, o banco com ligação histórica ao grupo de Balsemão, a preferir ficar ‘ao largo’ de novos financiamentos, e com a Caixa Geral de Depósitos a receber ajudas estatais, a dona do Expresso encontrou ‘refúgio’ num ‘novo amigo’ (Novo Banco), que estava então a receber injecções de capital dos contribuintes, depois do colapso do BES.
A compra do edifício-sede da Impresa pelo Novo Banco foi feita quando a instituição era liderada por António Ramalho, que não respondeu às questões do PÁGINA UM. Já a venda do imóvel à Impresa e o financiamento da tomada do edifício por parte do grupo de media, ocorreram meses depois de Ramalho ter saído da presidência.
Saliente-se que, ao contrário do anúncio de venda do imóvel ao Novo Banco, em 2018, o qual foi divulgado como ‘Informação Privilegiada’ aos investidores, a compra do edifício pela Impresa, em 2022, não mereceu qualquer comunicado ao mercado.
Apesar de ser uma empresa cotada em Bolsa, a Impresa não informou os investidores, através de um comunicado formal, sobre a alteração da propriedade do seu edifício-sede nem sobre o novo empréstimo de longo prazo contratado com o Novo Banco.
Sobre esta omissão da Impresa, enquanto emitente no mercado de capitais português, e a diferença de actuação face às duas transacções em questão, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) considerou não ser necessário actuar, não impondo a obrigatoriedade de divulgação de ‘Informação Privilegiada’ ao mercado através de um comunicado formal similar ao que foi publicado no site do polícia da Bolsa nacional em 2018 pelo grupo liderado por Balsemão. Um privilégio que nem todos recebem.
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