Recensão: Viagem a pé

Uma caminhada pela alma catalã

por Pedro Almeida Vieira // Novembro 28, 2024


Categoria: Cultura

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Título

Viagem a pé

Autor

JOSEP PLA (tradução: Helena Pita)

Editora

Tinta da China (Agosto de 2024)

Cotação

16/20

Recensão

A recente edição portuguesa de ‘Viagem a Pé’, pela Tinta da China, é uma oportunidade de ouro para revisitar um dos nomes maiores da literatura catalã, Josep Pla (1897-1981), escritor prolífico e cronista perspicaz, conhecido pela sua capacidade em capturar o quotidiano com uma prosa simples, mas profundamente poética. Por isso mesmo, e pela quantidade assinalável de obras neste género, é considerado um dos mestres europeus da literatura de viagem.

Esta obra em concreto, que inicialmente se diluía no vasto universo de textos deste autor, foi publicada apenas em 1949, e mais do que um relato de itinerância, é um exercício de contemplação.

‘Viagem a Pé’ reporta ao passado do autor, abordando uma caminhada do jovem Pla, ainda estudante de Direito, pelas paisagens da Baixa Empordà, sua terra natal. A Catalunha rural dos anos 1910, com as suas quintas, aldeias e gentes simples, é o pano de fundo da sua narrativa, num período de tensões políticas em Espanha, mas também de relativa estagnação económica em regiões rurais. Contudo, na viagem de Pla, não há espaço para discursos épicos sobre nações ou progresso; há apenas a terra, o céu, o vento e conversa

No contexto da literatura de viagem, ‘Viagem a Pé’ não segue os moldes do aventureirismo em busca de espectáculo ou surpresas. Não há destinos exóticos nem episódios grandiosos. É, antes, um registo íntimo e descontraído, onde o acto de caminhar é uma forma de introspecção e de ligação à terra. Aliás, Pla tenta recuperar uma tradição literária que remonta ao filósofo Jean-Jacques Rousseau ou ao escritor Robert Louis Stevenson, para quem a caminhada não seria apenas um meio de locomoção, mas um exercício filosófico.

Nesta breve narrativa, Josep Pla oferece-nos assim uma janela para a paisagem catalã e, sobretudo, para os seus habitantes. O leitor caminha ao lado do narrador, sente o cheiro das pastagens, ouve o silêncio das estradas poeirentas e percebe a dureza (e beleza) de uma vida simples. As descrições são feitas num estilo curto mas preciso, através de uma prosa despretensiosa que, por vezes, se assemelha a um diário. A obra destaca-se sobretudo pela capacidade de transformar o vulgar em arte, e por oferecer uma experiência literária onde o ritmo da leitura se confunde com o compasso da caminhada.

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