Não caminho para novo e, mesmo com sete vidas, já por aqui ando há tempo suficiente para 17 passagens de ano. E, se muitas absurdas coisas no mundo dos humanos já eu vi, mais ainda costumo ver nas páginas do Correio da Manhã, em particular em cada 1 de Janeiro. Pois bem, em 2024, como de costume, andou-se pelos hospitais, à caça de recém-nascidos. Ou melhor, dos primeiros recém-nascidos.
Fossem os humanos como os gatos e, a cada paridela, seriam sempre mais do que as mães. No meu caso, nasci só eu e um pequeno irmão, no longínquo ano de 2008, mas não me recordo se teremos saído no mesmo minuto. Em todo o caso, presumo que outras gatas tenham parido, em Portugal, à mesma hora e ao mesmo minuto que a minha saudosa mãe. Não vos sei dizer, porque não sei quantos gatos nascem por ano em Portugal. Mas, no caso dos humanos, sei quantos nascem em Portugal e, em particular, em Janeiro.
E, portanto, quatro bebés a nascerem no mesmo minuto, às 00h00, conforme anunciou o Correio da Manhã? A sério? Vamos lá com calma, com contas um bocadinho mais complicadas do que somar as latas de comida que despacho numa semana, e que implicam cálculos de probabilidade e a utilização de modelos de distribuição estatística.
Ora, consultando as proezas aritméticas humanas e os nascimentos em anos anteriores no mês de Janeiro (cerca de 7.100), descobri que a probabilidade de quatro bebés nascerem no exacto minuto em que não sei quantos milhões de lusitanos e quejandos trincavam as passas, ao som de fogo-de-artifício, é de 0,00228%. Traduzindo para linguagem felina: seria mais provável eu aprender (ainda) a tocar piano do que essa coincidência absurda suceder em Portugal, porque, basicamente, a hipótese de ocorrer é de uma vez em cada 43.860 anos.
Mas, claro, é sempre brindemos e deliremos, não com um, não com dois, não com três, mas logo com quatro “primeiros bebés do ano”. Eu até entendo o fascínio. Os humanos adoram competições ridículas. Mas, por amor a um prato de sardinhas – eu prefiro fiambre –, será que ninguém se questionou na redacção do Correio da Manhã sobre o rigor desta coisa? Ou melhor, sobre o ridículo de quatro bebés nascerem no mesmo minuto: na Guarda, em Castelo Branco, em Coimbra e em Vila Franca de Xira?
Em vez de se preocuparem com a saúde dos miúdos ou com o apoio às famílias, o Correio da Manhã andou a cronometrar partos como se fosse a final dos 100 metros nos Jogos Olímpicos. A única diferença é que, em vez do Usain Bolt, temos o Guilherme, o Gonçalo, a Adelina e o Théo. Só fiquei com uma dúvida: será que, nesta corrida ao minuto, o photo finish deu a vitória ao Guilherme, da Guarda? É que só este teve direito a ser revelado como filho da Cláudia e do Luís…
Muito gostaria eu de saber quem certifica estes nascimentos. Será o relógio da maternidade, ajustado com precisão suíça e calibrado com uns copos de tinto pelo obstetra de serviço? Ou será o tio distraído, a olhar para o telemóvel enquanto come as passas e grita: “Já nasceu! Às 00h00, de certeza!”?
Portanto, ou assistimos ao maior alinhamento cósmico da História dos nascimentos, a rivalizar com o Big Bang, ou andou alguém a ‘ajeitar’ os minutos para caber tudo no espectáculo de jornalismo…
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