A candidata
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Leonilde nasceu em pleno Estado Novo. Veio da planície, do Alentejo profundo, para a capital. Os pais empregaram-se numa mercearia. Ela terminou a 4.ª classe e foi para aprendiz de cabeleireira.
Farta de lavar cabeças num bairro da periferia, Leonilde decidiu voltar a estudar. Não ia ficar naquele salão para o resto da vida. Um único entrave: o pai. Era ele que mandava lá em casa e nem queria ouvir falar em escola. A cachopa ainda se perdia. Devia agradecer a sorte de ter um emprego e um ordenadinho. Além do mais, estava na altura de pensar em casar. Qualquer dia começavam a dar à língua.
A Leonilde casou. O Rogério trabalhava na construção naval. Era bom rapaz e tinha prometido deixá-la voltar a estudar. Mas veio uma gravidez. Depois outra. E uma terceira. Queriam um filho varão e só nasciam meninas.
Após a revolução, desiludido com as condições de vida dos trabalhadores, Rogério juntou-se ao sindicato. Incutiu em Leonilde, que, entretanto, voltara a estudar, os valores do socialismo. Não faltavam a uma reunião do partido, a uma manifestação, a um comício.
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Terminada a licenciatura, Leonilde, de foice e martelo ao peito, sentia-se mais preparada do que nunca para ajudar. Queria combater o capitalismo. Ser a voz dos desfavorecidos e dos explorados.
Passei há dias por uma das filhas e perguntei pela família. Contou-me que o pai, aposentado, regressou sozinho ao Alentejo. A mãe é candidata a presidente de uma junta de freguesia:
– Faz sentido. – respondi – Sempre esteve muito ligada à política.
– Fazia. – disse ela – Se não fosse ser a candidata da extrema-direita.
Perante a minha perplexidade, explicou-me a razão invocada por Leonilde quando ela própria a questionou:
– Só eles é que me convidaram!
Sílvia Quinteiro é professora da Universidade do Algarve