Sobre o infame comunicado da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista
O PÁGINA UM repudia com veemência as afirmações proferidas pela Comissão da Carteira Profissional de Jornalistas (CCPJ), e particularmente do seu Secretariado, presidida por Licínia Girão, que esta tarde, ao tentar justificar um claro abuso de poder e de liberdade de imprensa no caso da (não) renovação do título da jornalista Elisabete Tavares, recorreu a um comunicado recheado de sofismas, omissões e distorções legais, que claramente demonstram má-fé, dolo e ignorância dos procedimentos administrativos de uma entidade pública. Quis, mais uma vez a CCPJ, atirar lama contra o PÁGINA UM através de mais um expediente, que por não ser o primeiro nem o segundo se desconfia não ser o último, sendo enquadráveis numa atitude de falta de transparência e de idoneidade desta entidade.
- FALÁCIAS LEGAIS E INTERPRETAÇÕES ENVIESADAS
A CCPJ afirma que a revalidação de uma carteira profissional deve seguir o Estatuto do Jornalista e os regulamentos internos, como se, para o caso da jornalista Elisabete Tavares, estivesse a cumprir a lei e as normas. Não está.
No entanto, ao longo dos anos, a renovação de carteiras profissionais de jornalistas com mais de 10 anos de experiência tem sido um procedimento rotineiro e estritamente administrativo que demora poucos dias. Na verdade, administrativamente, menos tempo que a escrita de um comunicado de 29 pontos. O bloqueio arbitrário no caso de Elisabete Tavares, e a sua retirada da base de dados dos jornalistas, demonstra um desvio à prática comum, que apenas pode ser entendido como uma retaliação contra o PÁGINA UM.
Ademais, o prazo de 60 dias alegado pela CCPJ é do envio da carteira (física) profissional, para poder ser ostentada presencialmente pelo jornalista nas condições em que tal se mostra necessário; não se refere ao prazo obrigatório para a CCPJ proceder à renovação, ainda mais no regime simplificado para profissionais com mais de 10 anos de actividade. Nestes casos, sendo feito o requerimento, basta verificar que o jornalista cumpre esse requisito para uma renovação. Houve intencionalidade da CCPJ para deixar caducar a carteira profissional da jornalista Elisabete Tavares e, com esse expediente, eliminá-la da base de dados dos jornalistas.
- INCOMPATIBILIDADES FABRICADAS PARA JUSTIFICAR PERSEGUIÇÃO
Alega a CCPJ que a eventual incompatibilidade de um jornalista deveria ser considerada no momento da renovação, contrariando a lei e aquilo que sempre tem sido prática. é completamente falso, e apenas justificável numa CCPJ presidida por uma falsa ‘jurista de mérito’, que haja possibilidade de “não renovação do título enquanto subsistir a incompatibilidade e durante os prazos de impedimento”. Primeiro, porque são procedimentos autónomos – a emissão e renovação está prevista na secção I do Decreto-Lei nº 70/2008 – e a suspensão e cassação na secção II. A cassação e a suspensão são processos administrativos distintos, que devem ser instaurados com os formalismos legais, algo que jamais foi feito.
Qualquer incompatibilidade que suscite dúvidas deve ser tratada em processo autónomo e separado do processo de renovação, com possibilidades de defesa até trânsito, podendo chegar ao Tribunal Administrativo. Essa análise de incompatibilidades jamais pode determinar uma suspensão da renovação da carteira e muito menos a eliminação do nome do jornalista da base de dados, que sendo pública constitui a forma de qualquer pessoa conferir se determinada pessoa é jornalista.
Além disso, a alegada e espúria incompatibilidade da jornalista Elisabete Tavares desencantada agora pela CCPJ diz respeito à moderação de um debate num congresso realizado em Março de 2022, ou seja, entre essa data e a actualidade, a CCPJ já concedeu uma renovação. O requerimento para essa renovação foi então feita em 29 de Dezembro de 2022 pela jornalista Elisabete Tavares e concedida pela CCPJ, sem qualquer pergunta, em 14 de Janeiro de 2023. Existem dúvidas sobre a má-fé da actual CCPJ?
- DISPARIDADE DE TRATAMENTO E O DUALIDADE DE CRITÉRIOS
A CCPJ, ao tentar justificar a sua decisão, esquece também convenientemente que outras duas jornalistas participaram no mesmo evento que agora pretende usar contra Elisabete Tavares. Nem Teresa Silveira (do jornal Público) nem Isabel Martins (da revista Mundo Rural) tiveram, entretanto, qualquer problema com a renovação das suas carteiras. Além disso, esquece convenientemente, que em anteriores mandatos, houve jornalistas que solicitaram esclarecimentos sobre se a moderação de congressos caía nas incompatibilidades do Estatuto do Jornalismo, mesmo sendo claro que não. E a resposta da CCPJ foi que não existiam incompatibilidades? O que justifica esta dualidade de critérios? Será necessário fazer a lista das centenas de jornalistas que moderaram debates em congressos? Ou estamos apenas perante uma descarada acção para só atingir o PÁGINA UM e os seus jornalistas.
- MENTIRAS SOBRE O ESTATUTO DOS JORNALISTAS EM SITUAÇÃO DE RENOVAÇÃO
A CCPJ tenta desvalorizar a gravidade do impedimento administrativo de Elisabete Tavares, com base em fundamentos ilegais, afirmando que o facto de o seu nome desaparecer da base de dados é um mero efeito técnico. No entanto, sabe-se que a ausência de nome na base de dados pode ser utilizada para criar entraves legais e administrativos ao exercício da profissão, ou mesmo fazer acusações na praça pública, algo que o PÁGINA UM não pode permitir. No ponto 28 do seu comunicado, a CCPJ tem o descaramento de confessar que este ‘desaparecimento’ causa “constrangimentos”, mas pouco se importa que tal situação suceda única e exclusivamente por sua responsabilidade. E ainda se faz de ingénua quando afirma que pode emitir “um documento comprovativo de que o pedido foi efectuado dentro do prazo e está em análise”. Então, e qual a razão para não ser feito por regra? Não há dinheiro para isso, mas há 6.000 euros para pagamento de serviços jurídicos para processar o director do PÁGINA UM?
- PERSEGUIÇÃO RECORRENTE E O USO DE DINHEIRO PÚBLICO PARA FINALIDADES QUESTIONÁVEIS
Não é a primeira vez que a CCPJ, sob a liderança de Licínia Girão, adopta expedientes administrativos duvidosos para atacar o PÁGINA UM, abrindo-me até processos disciplinares sobre investigações jornalísticas em curso e fazendo mesmo queixa no Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas com recurso a expedientes pidescos. Vale lembrar sempre que Licínia Girão, que preside a uma entidade que constitui o ponto focal da lei anti-SLAPP, decidiu gastar 6.000 euros em serviços jurídicos para processar-me pessoalmente, numa acção que acabou por ser abandonada devido à pressão de vários membros. Além disso, Licínia Girão até esconde a acta do Plenário da CCPJ onde tal questão foi debatida, o que me obrigou a uma intimação, em curso, no Tribunal Administrativo de Lisboa. O uso de dinheiro público para perseguição política e pessoal é inaceitável e tem de ser devidamente investigado.
- RESISTÊNCIA E TRANSPARÊNCIA
O PÁGINA UM não cederá a tácticas intimidatórias e de vitimização da CCPJ, que usa de poderes públicos e administrativos para atacar um projecto jornalístico independente, que tem incomodado os poderes e, em grande parte, também as promiscuidades na imprensa e no jornalismo. Com este caso da renovação do título da jornalista Elisabete Tavares, com um passado e um presente irrepreensíveis do ponto de vista ético e deontológico, e uma vasta e reconhecida experiência profissional, a CCPJ deseja tão-só arrastar o PÁGINA UM para o chavascal que se tem tornado o jornalismo português, para que assim não possamos manter publicamente a imagem imaculada.
Posto isto, a CCPJ pode continuar a recorrer a expedientes mesquinhos, a comunicados inqualificáveis, mas não conseguirá abalar a nossa determinação na defesa da liberdade de imprensa. E mais: agiremos judicialmente se a renovação não for diligenciada num prazo curto ou se não for enviado comprovativo para o exercício da profissão com a imediata recolação do nome da Elisabete Tavares na base de dados dos jornalistas.
De resto, houve em tempos alguém que defendeu que, aprestando-se o fim do exercício de um cargo, se deveria permitir que o incumbente terminasse o mandato com dignidade. No caso de Licínia Girão, a haver dignidade, então recorro ao nosso ‘cronista’ Brás Cubas: deveriam aplicar, de forma metafórica, a esta senhora um estímulo locomotor à maneira espartana.
Uma nota final: apesar da CCPJ afirmar que nenhuma sanção se aplica a um jornal por admitir ou manter ao seu serviço um jornalista que esteja a aguardar decisão para renovação, o PÁGINA UM não publicará qualquer artigo noticioso da jornalista Elisabete Tavares enquanto a CCPJ mantiver abusiva e ilegalmente a decisão de não revalidar o seu título profissional. Aceitar que a CCPJ prolongue uma decisão é estar a aceitar um acto de abuso de poder e ‘legitimar’ atentados à liberdade de imprensa. Os membros da CCPJ – que, aliás, são jornalistas de profissão – não são os donos dos jornalistas nem estes lhes têm de prestar vassalagem.